26 agosto 2006

Teste comparativo: Thurn und Taxis Vrs Ticket to Ride: Marklin

Os jogos não são baratos, quer dizer não são caros, mas com todas as taxas que normalmente lhes caem em cima acabam por ficar um tanto ou quanto dispendiosos, principalmente para os bolsos mais apertados. Esta é uma realidade que todo o apreciador e coleccionador tem de viver a muito custo. No entanto, parece-me, há formas de evitar o gasto exagerado e desnecessário de alguns gamers e urge colocar alguma razão na cabeça daqueles que são mais impulsivos.
É altura de dizer basta e ter um olhar mais crítico deixando a benevolência para trás e ser incisivo nas análises.
Nada de original. Se olharmos para as publicações dedicadas ao ramo automóvel podemos ver testes e comparações entre marcas e modelos de carros que fazem as delícias dos consumidores e servem, muitas vezes, como última palavra para todos aqueles que querem mudar de veículo. Já assisti a muitas discussões no seio de casais por causa desses testes comparativos.
- Ó amor não queres comprar antes o Micra? É tão bonito!
- Pelo mesmo preço compro aqui este Toyota que tem mais meio valor na carroçaria.

Ora, pegando nesse modelo automobilístico, nós aqui neste espaço, vamos tentar fazer o mesmo. Nada melhor que um bom teste comparativo para o debate ser lançado e os ódios virem ao de cima. Com sorte, acompanhando o exemplo do que se passa na Liga Portuguesa de Futebol, em troca de bons resultados nestes testes, ainda temos as distribuidoras a pagar-nos viagens ás canárias e miúdas jeitosas da má vida para nos fazerem companhia em noites de maior solidão.
Os primeiros 2 títulos que proponho são Thurn und Taxis e o Ticket to Ride: Marklin. A razão porque os juntei é por haver francas semelhanças entre a mecânica de jogo de ambos e serem destinados a públicos similares. São dois títulos que viram a luz do dia há relativamente pouco tempo e que vão ser, com toda a certeza, um sucesso de vendas, independentemente do que se escrever a seguir.

A Premissa:
Thurn und Taxis da Hans in Gluck foi desenhado pelo casal Andreas Seyfarth e Karen Seyfarth, sendo o macho o nome que esteve por trás da concepção do jogo mais amado de sempre (Porto Rico).
Thurn und Taxis pretende homenagear a família Thurn Und Taxis que se estabeleceu e ganhou notoriedade a partir do Séc. XV com os seus esforços em estabelecer um serviço postal que servisse condignamente o império, ou pelo menos a ideia que havia dele. A importância e o poder que a família alcançou foi tanto que hoje em dia não há revista cor-de-rosa em que este clã austríaco não tenha um digno representante fotografado.
O jogo que recentemente venceu o Spiel des Jahres dá ao jogador a possibilidade de imitar a empresa dos Thurn Und Taxis e assim estabelecer uma rede de serviços postais pela Alemanha e arredores.
Já Ticket to Ride Marklin homenageia a empresa alemã Marklin que foi uma das pioneiras no fabrico de miniaturas de comboios e que conta com 150 anos de experiência nesse ramo de actividade. São muitos os clientes espalhados por todo o globo que conseguem esgotar muitos dos modelos num abrir e fechar de olhos. O objectivo do jogo passa por construir rotas ferroviárias por toda a Alemanha e fazer com que os seus passageiros tenham uma longa e segura viagem por elas.
Em relação a este ponto existe um empate entre os dois jogos. São temas interessantes e que envolvem os jogadores. Notas, portanto, positivas para ambos.

Componentes:
Este é um aspecto cada vez mais importante, especialmente quando não jogadores também se juntam à mesa. Todos querem tabuleiros bonitos e marcadores pomposos. Afinal um jogo é também um brinquedo e se é para ser brinquedo, ao menos que o seja em condições.
Tanto Thurn und Taxis como Ticket to Ride são excelentes nesse capítulo. Aliás não é de estranhar, uma vez que as produtoras, Hans in Gluck e Days of Wonder sempre deram uma relevância muito grande ao design e à beleza dos seus produtos. É de louvar a atenção que os seus clientes merecem, o que faz com que os mesmos se tornem fiéis consumidores dos catálogos que ano após ano estas dois gigantes dos jogos de tabuleiro lançam para o mercado.
Thurn und Táxis mostra um tabuleiro trabalhado com bonitas ilustrações de edifícios emblemáticos de cada uma das cidades representadas. A qualidade gráfica e a forma como está tudo apresentado faz-nos recuar no tempo e facilmente podemos imaginar o pó das estradas de terra batida da época que o jogo propôs recriar. As cartas de jogo seguem a mesma linha formando um todo coerente e de grande qualidade.
Ticket to Ride apresenta um design também ele imaculado e recorre a uma apresentação mais moderna do mapa. Tem a vantagem de ter mais bonecos. Sejam as carruagens, sejam os novos passageiros. Em cada uma das cartas de jogo estão representados modelos da empresa alemã. Um mimo. É um jogo bastante vistoso e agradável à vista. Seja como for, a caixa do jogo de Alan Moon traz lá dentro um DVD de apresentação de quase uma hora de todos os títulos da Days of Wonder, com explicações e conselhos estratégicos. Ao mesmo tempo também tem um CD Rom da Maklin com os modelos disponíveis no mercado.
Novamente não acho que algum dos títulos em análise leve vantagem neste particular. O material é bom e o aspecto de brinquedo está imaculado. Tudo perfeito portanto.

Mecânica:
Chegamos finalmente ao cerne da questão. Os mecanismos são bastante idênticos mas existem certos pormenores que fazem toda a diferença.
Em Thurn und Taxis o jogador tem 6 cartas de cidade à sua disposição. Cabe-lhe escolher uma em cada acção de forma a estabelecer rotas entre cidades. As cidades que vão ser escolhidas têm de ser vizinhas de forma a poder legitimar a rota que se constrói. Só que o tabuleiro é dividido em várias regiões e o jogador, coitado, quando estabelece a rota só pode colocar os seus marcadores (postos postais) em todas as cidades da mesma região da rota que delineou ou, então, em uma cidade de cada região que a mesma rota passou. É uma decisão tramada. Isso equivale a dizer que o jogador para preencher as cidades vazias vai ter de escolher várias vezes as mesmas cartas de cidade ao longo do jogo, pelo que é aconselhável que se vá controlando as cartas que vão saindo para não ser apanhado desprevenido. Por outro lado, existem vários pontos bónus espalhados pelo mapa. Normalmente o objectivo é ter marcadores em todas as cidades de duas regiões. Tarefa que só poderá ser estabelecida depois de algumas jogadas e uma cuidadosa escolha de cartas. Quanto mais rápido o jogador for a colocar os seus postos postais mais pontos ganha em relação aos mais vagarosos. Também se ganham pontos para as rotas maiores. Tudo dá pontos, simplesmente os que conseguirem fazer as coisas mais rapidamente mais pontos ganham. Uma maravilhosa e dramática luta por objectivos.
Já Ticket to Ride é mais contido. Aqui existem cartas de várias cores que representam rotas desenhadas no mapa. Ora havendo uma rota duma determinada cor desenhada no mapa, o jogador terá de ter várias cartas, consoante o cumprimento dessa rota, dessa mesma cor para a conseguir fazer. Tão simples como isto. Além disso são distribuídos objectivos onde o jogador terá de fazer. Esses objectivos secretos são traduzidos pela obrigação de fazer ligações entre várias cidades. Quanto mais longas forem as rotas mais pontos se ganha. Novidade é a introdução de pequenos bonecos chamados passageiros que andam a circular pelo mapa tal e qual jovens imberbes se passeiam pela Europa através do Inter Rail. Cada cidade consoante a sua importância tem os seus pontos e, por isso, os passageiros nas suas viagens vão recolhendo os pontos dessas mesmas cidades.
De resto o sistema de recolha de cartas é igual ao Thurn und Taxis. Existem cartas visíveis que o jogador pode escolher consoante os seus objectivos.
Para mim o jogo Thurn und Taxis neste aspecto é mais elaborado. Diria mesmo que é uma evolução à mecânica do Ticket. Sem nunca perder a simplicidade consegue introduzir alguma complexidade nas decisões e faz o jogador estar mais pensativo e a projectar duas jogadas a seguir. Isso é de facto bastante motivante e dramático porque não são raras as vezes em que um jogador se vê envolvido pelas suas dúvidas existenciais e fica especado, feito parvo, a olhar o vazio e a bufar de nervos:
- Joga lá isso! Tas há cinco minutos para fazer uma jogada! Os outros também querem jogar!
Em Thurn und Taxis a competição pelos pontos é mais vigorosa e existe mesmo um embate entre jogadores ao longo da hora de jogo. Em Ticket To Ride esse embate é mais soft, endurecendo naquelas 6, 7 jogadas que duram as viagens dos passageiros.
A vantagem vai para Thurn und Taxis. A mecânica é melhor elaborada e acaba por resultar num jogo mais elegante sendo, portanto também, mais motivante para o jogador.

Conclusão:
Apesar de gostar muito dos dois jogos, julgo que a escolha acertada vai para o Thurn und Taxis. No entanto é preciso ter em consideração alguns pontos. Se é uma pessoa que costuma receber muita gente em casa e também pretende que as crianças participem numa sessão de jogos de tabuleiro, então aí, mediante estas condições, mais vale investir no Ticket to Ride. É mais acessível e sempre permite a participação de 5 jogadores. Também é ideal para as pessoas que querem agora começar a jogar, uma vez que não atinge uma complexidade muito grande.
Mas se é uma pessoa que tem alguma dificuldade em arranjar jogadores, Thurn und Taxis, que permite a participação máxima de 4 elementos, parece-me neste contexto, uma melhor opção. Também é ideal para aqueles que já têm alguma experiência.
Seja como for, se é dono de alguma versão anterior do Ticket to Ride, parece-me que não vale a pena adquirir esta nova versão. Pouco adianta, muito embora os passageiros tornem o jogo mais competitivo.
E pronto é o que me oferece opinar sobre o assunto. Espero que fiquem todos esclarecidos nesta primeira abordagem comparativa aqui deste cantinho.

Nota: Só agora reparamos que este blog só permitia comentários a indivíduos que tivessen blog, descartando assim as opiniões de anónimos. Esta situação não foi uma opção nossa, mas antes uma mera distração que já foi devidamente alterada. A partir de agora já podem comentar à vontade. Mas vejam lá o que escrevem.
Pedimos as nossas desculpas pelo possível transtorno.

5 comentários:

Anónimo disse...

Finalmente posso parabenizá-los pelo blog.

Sou do Brasil e costumo acompanhar a opinião, os session-reports e até mesmo as gracinhas de vocês e gosto muito do blog.

Quanto aos jogos, fiquei com muita vontade de jogar o Thurn, mas ainda me faltou oportunidade (mesmo esse podendo ser jogado on-line no BSW), já o Ticket, é um jogo muito bacana, e bom para introduzir os não-gamers nesse mundo viciante.

O preço dos jogos realmente está complicado, bem como o nosso amigo Chirol falou, aqui no Brasil é muito complicado comprar os importados, eu tenho preferido fazer versões "caseiras", que ficam bem bacanas, mas sempre que posso acabo comprando um original.

Bem já escrevi demais (viu o que vocês fazem deixando os não-blogueiros se manifestarem), vou deixar as fotos do evento que rolou neste fim de semana aqui no Brasil, chamado Festa do Peão de Tabuleiro, e que esse ano reuniu mais de 200 pessoas, que ficaram jogando de 15:00 de sábado até 6:00 de domingo.

Grande abraço aos amigos lusitanos.

link: http://www.flickr.com/photos/25706499@N00/sets/72157594254889384/

missbutcher disse...

Bom, assim como o Chirol, não conheço o Thurn und Taxis e amo o Marklin. Por isso, tenho apenas uma ressalva quanto ao teste comparativo: quem tem edições anteriores do Ticket deveria, sim, pensar em comprar o Marklin, que tem dois diferenciais importantes. O primeiro é o passageiro, que "come" uma ação de turno, o que causa mais dúvidas ao jogador (que só pode comprar duas cartas OU fazer uma rota OU andar com o passageiro). Se demorar, os adversários levam mais pontos. Se fizer logo, corre o risco de perder uma rota importante. Dúvidas que incrementam ainda mais o jogo.
O outro diferencial é quanto aos objetivos. Ao contrários das edições anteriores, aqui, ganha mais pontos quem fizer mais objetivos e não quem tiver a linha mais longa. E isso muda bastante a estratégia.
Bom, espero ter ajudado, ou melhor, confundido as cabeças de quem achava que não era tão importante assim comprar mais um ticket.
:-)
No mais, estou curiosa para jogar o Thurn, que ainda não tive o prazer.

zorg disse...

Eu concordo genericamente com o Hugo.

Já joguei os 3 tickets e não tenho dúvidas em considerar esta edição märcklin a melhor. Os passageiros introduzem uma componente táctica interessante e que pode ser determinante no resultado final. Para além disso, a separação dos tickets em longos e curtos, e a atribuição do prémio para o maior número de objectivos cumpridos, por oposição à rota mais longa da edição anterior, também são mudanças que, na minha opinião, fazem todo o sentido (para não falar no abandonar das estações e dos túneis, da edição europe). É a edição vintage e refinada de um jogo de sucesso e é indispensável para qualquer fã do jogo.

O principal problema para mim é o mecanismo básico do jogo, que também é - não me custa reconhecer - a base do seu sucesso. É este mecanismo básico, que o torna numa repetição do ciclo receber objectivos->concretizar objectivos, que faz com que haja um número relativamente reduzido de jogadas com decisões interessantes a tomar (a escolha dos objectivos) e um número substancialmente maior de jogadas mecânicas (quase todas as outras jogadas - salvam-se as oportunidades tácticas para "lixar" outro jogador), onde a decisão a tomar é mais ou menos óbvia. Tudo isto tem a ver, acho eu, com a definição estática dos objectivos no inicio - recebo X pontos se ligar estas duas cidades, independentemente do que se passar em cima do tabuleiro - e é algo que é mitigado pela introdução dos passageiros, mas não é completamente eliminado.

No thurn und taxis tudo é muito mais dinâmico. Não há objectivos pré-definidos estaticamente e cabe a cada jogador decidir quais os que pretende perseguir no curto e no longo prazo. No entanto, a cada jogada é necessário reavaliar e adaptar a ideia inicial em função do que se passa em cima do tabuleiro, porque todos os jogadores concorrem pelos mesmos recursos limitados.

Ou seja, há muito mais decisões díficeis a tomar na maioria das rondas no thurn und taxis do que no ticket to ride e é isso que o torna mais interessante no médio longo prazo para mim.

zorg disse...

Caro Achilles

Eu não acho que jogar ticket - particularmente o Märcklin - seja aborrecido. Não foi isso que eu quis dizer. Acho que o jogo é giro e nunca me importo de o jogar.

O que eu quis dizer foi que devido à própria mecânica do jogo, em 80 ou 90% das jogadas que se tem de fazer, a escolha é óbvia. E porquê? Porque os objectivos de longo prazo são traçados no inicio do ciclo com a escolha dos tickets e depois são imutáveis, independentemente do que se passar em cima do tabuleiro. Isto contrasta com o TuT, onde os objectivos não são pré-atribuídos ao jogador - são antes definidos por ele - nem são estáticos, ou seja, é no melhor interesse do jogador fazer-lhes ajustes consoante a situação que está em cima da mesa.

Ou seja, no ticket as decisões tácticas têm só a ver com a escolha da melhor rota, ou com a decisão pontual de ver se dá para bloquear outro jogador ou não. Independentemente do que os meus adversários fizerem, eu ganho sempre X pontos, se unir a cidade A à cidade B e é para isso que eu vou trabalhar. Por isso grande parte das jogadas consistem apenas em ver se tenho alguma carta que me dê jeito em cima da mesa, apanhá-la se isso acontecer e colocar uma rota, ou biscar cartas face down, caso contrário. A excepção a isto são os passageiros, porque no caso deles os jogadores competem pelos bónus, ao contrário do que acontece com os tickets.

No TuT, a cada jogada não só tenho de decidir que carta jogar, como tenho de olhar para o que se passa em cima da mesa para ver se não é melhor fazer um ajuste à estratégia definida porque estou em risco de perder um determinado bónus que contava ganhar, ou porque surgiu uma oportunidade inesperada de roubar um bónus com que não estava a contar. Aqui não há pontos ganhos sem competição directa e é por isso que o jogo é giro.

Para mim, o ticket melhoraria ainda mais se a relação entre os pontos obtidos através dos passageiros e os pontos obtidos através dos tickets fosse mais favorável aos primeiros. Aumentar o valor dos bónus e diminuir o número deles em cima do tabuleiro se calhar era uma ideia interessante. Vou mandar um email ao Alan Moon a sugerir isso... ;)

zorg disse...

Achilles

Tens de jogar mais vezes. O TuT é daqueles jogos que parece óbvio da primeira vez que o jogas, mas depois se vai revelando subtilezas inesperadas à medida que o vais jogando mais vezes. Daqui a 3 ou 4 jogos já vais levar muito mais coisas em consideração a cada jogada do que levas agora. ;)