26 março 2007

Session Report: Imperial com pouco gás

É quase como uma doença. Após uma jogatana de Imperial existe a necessidade de partilhar com a comunidade a experiência que se teve. Urge contá-la aos quatro ventos e, como seria de esperar, desta vez o desejo manteve-se. Este é um dos principais atractivos deste jogo de Mac Gerdts: jogá-lo para contá-lo.
Desta vez decidi apresentá-lo a um grupo que tem vindo aos poucos a interessar-se pelo hobby. Não são jogadores experientes, nem clientes habituais das lojas online, mas nunca recusam um convite meu. São jogadores sociais, jogam mais para passar uma tarde com amigos do que pelas potencialidades do jogo. Não querem saber quem é o Knizia ou o Kramer e normalmente gostam de tudo, muito embora tenham um carinho especial pelo El Grande, Modern Art e Ticket to Ride.
Como desta vez éramos só quatro (o encontro entre Portugal e a Bélgica tirou-me alguns dos clientes habituais), decidi arriscar no Imperial. Um dos grandes atractivos da sessão foi também a primeira presença do Lindinho. O Lindinho foi sempre um feroz e inteligente jogador de Risco que partilhou a mesa há uns anos atrás. Jogar Risco sem o Lindinho não tinha piada nenhuma e por isso, achei que era uma boa ideia apresentá-lo a este mundo dos jogos de tabuleiro com um jogo que, duma forma ou de outra, tem alguns elementos familiares. As guerras, as potências, o controlo de países, etc.
Este Imperial, não é segredo nenhum, é um dos jogos, senão mesmo o jogo, que mais me surpreendeu nos últimos tempos e que constitui uma lufada de ar fresco no que por aí se produz. Por outro lado, o jogo é tão bom que depois de o jogar tornei-me bastante mais exigente e aborreço-me com muito mais facilidade com jogos que não tenham um toque especial. Confesso que hoje em dia sou um gajo insuportável no que toca a jogos novos. Tudo o que tenho jogado ultimamente me pareceu monótono, pouco inteligente e sem grande inspiração.


Imperial não é um jogo fácil. É, de alguma forma difícil de explicar a não gamers e também é difícil saber o que é preciso fazer durante as duas horas e meia que dura uma partida. As regras são difíceis de entender, não porque estejam mal explicadas, antes pelo contrário, mas porque é um jogo inovador e que traz com ele muita coisa nova a que o jogador, mesmo o mais experiente, não está habituado.
Por isto tudo tive muitas dificuldades em fazer entender as regras aos meus comparsas. Principalmente qual é o objectivo do jogo, como se ganha dinheiro e a vantagem e desvantagem dos investimentos.
Como sempre acontece nos jogos de tabuleiro, a única maneira de saber como tudo funciona é, evidentemente, jogar. E foi o que fizemos.
O Lindinho teve uma inclinação inicial pela Inglaterra. Comprou então acções do Império de sua majestade. Não satisfeito, comprou também o governo da França. O Cabão, homem pragmático, não resistiu aos encantos da Alemanha e gastou muita das suas poupanças nele. O Luís foi para a Itália e eu comprei a Áustria e a Rússia.
O Lindinho começou bem, demonstrou logo que não estava ali para brincadeiras e teve logo como objectivo dominar os mares do Norte. Construiu uma fábrica e encheu o mar com navios. Foi um começo ameaçador. Ganhou muitas zonas de influência e como tinha a França sobre o seu domínio, a paz entre os dois países beneficiou os seus intentos.
O Luís começou por distribuir os navios italianos no Mediterrâneo e a Itália foi uma potência com grande poder no norte de africa, zona que também foi cobiçada pela França.
O Cabão com a sua Alemanha avançou sem medos para os países baixos e eu marchei com os exércitos Austríacos e Russos para os Balcãs.
Foi, sem dúvida um início prometedor. Mas a partir daqui as coisas complicaram-se. A falta de familiaridade dos jogadores com o jogo fê-los cometer erros que os prejudicaram. O Lindinho, com a sua Inglaterra, não taxou e com isso perdeu uma oportunidade de ouro para se adiantar. Os outros jogadores seguiram-lhe o exemplo. Eu, mais experiente, tratei logo de avançar o marcador da Áustria e da Rússia, obtendo logo uma vantagem preciosa.
Esta situação evidenciou as dificuldades na interiorização das regras. Não consegui na minha explicação dar a entender a importância da “taxation”. Foi pena, mas creio que uma das características de Imperial é precisamente essa. Só na segunda sessão é que se está suficientemente familiarizado com as regras para que se possa gozar mesmo a sério a experiência.
Mas com a continuidade da partida, as coisas começaram a seguir o seu rumo natural, os jogadores começaram a taxar na hora certa e a ter vantagens com isso. Mas o arranque foi a conta gotas.


Subitamente começou uma procura desenfreada às acções da França. A razão era simples. A França teve sempre muitas tropas e podia conquistar muitos territórios, não só porque tinha muitos exércitos, obra feita pelo Luís, mas também porque urgia estragar o arranjo do Lindinho de ter para ele a França e a Inglaterra. O único problema foi que o poderio militar não se evidenciou nos pontos de vitória da França. Isto porque os jogadores que se sucediam na governação do império francês não construíram fábricas. A simples construção duma fábrica (vale 2 pontos) iria fazer subir a França para os níveis da Inglaterra (que entretanto eu comprei e taxei) e da Rússia. Mais uma vez a inexperiência dos jogadores veio ao de cima. Não consegui, na minha explicação, evidenciar o peso que uma fábrica tem no resultado do país. Por isso não é de estranhar que os países que se evidenciaram no resultado final foram os países que tinham uma fábrica (Inglaterra e Rússia).
No meio disto tudo o Cabão tratou logo de estragar a paz entre a Áustria e a Rússia, comprando-me a Áustria. O Cabão foi sempre um investidor agressivo. Comprava com grande oportunidade os governos dos países, mas o problema dele foi o facto de não ter construído fábricas. Principalmente na Alemanha, país que teve sempre ao longo do jogo mas que tratou logo de o destruir financeiramente. A Alemanha teve os seus cofres vazios durante metade da partida, mas com uma quantidade de exércitos capaz de assustar a França, que nessa altura já tinha uma posição confortável no norte de Africa e também na península Ibérica. A França foi sempre um império que passou muitas vezes de mão, foi bastante cobiçada, mas não teve efeitos práticos. Faltavam fábricas para que o país, depois duma “Taxation” subisse no Ranking.
A Itália também esteve bem. Teve uma forte presença no norte de África e Mediterrâneo. Trabalho do Luís que sempre tratou dos interesses territoriais do país. Mas também ele falhou ao nunca ter construído uma fábrica ou porto.
A minha Rússia, antes de ser cobiçada por todos, ganhou bastante vantagem, não só porque tinha uma fábrica construída como também teve sempre muito bem nos territórios dos Balcãs e nos países nórdicos.
E o jogo foi caminhando para o seu final. Eu ganhei com alguma vantagem, a razão foi a minha experiência anterior.
Apesar dos erros, O jogo foi emotivo e bastante divertido. Toda a gente estava envolvida e a compra de títulos foi sempre emocionante e os jogadores acabaram por gostar de experiência. Mas enfim, não conseguimos evitar o amargo de boca de que só no fim é que todos estavam a perceber a mecânica do jogo, perdendo a partida com isso a competitividade e o equilíbrio. Havemos de jogar outro para a próxima!
Fica aqui só um conselho a todos aqueles que vão no futuro apresentar este jogo a outros jogadores: Insistam na importância das fábricas e da “Taxation” e de como os resultados da “Taxation” influênciam o ranking dos impérios.

15 março 2007

Questionário: As perguntas a que sempre quis responder

De vez em quando gosto de ver as listas do BGG. Na maioria das vezes são uma perda de tempo, mas um dia prometi a mim mesmo que deveria aproveitar algumas delas, principalmente quando não tenho nada para escrever e prefiro passar os dias deitado no sofá a fazer zapping vertiginosamente em vez de trabalhar e escrever coisas originais que maravilhem uma legião de leitores que sinistramente apreciam passar por aqui entre a consulta de um e outro site pornográfico mais atrevido, alguns deles envolvendo repteis e anões.
Às questões que se seguem já todos os jogadores tentaram responder quando perdidos nos seus pensamentos. Enquanto estão numa fila de trânsito, quando estão preste a adormecer ou mesmo enquanto estão na casa de banho e lhes falta uma revista para lerem. Agora, graças a nós, têm a hipótese de partilhar as suas ideias na comunidade. Seja como for esta pequena compilação tem a autoria de Mike Marmont.

Aqui vai o questionário:

1 – Será Puerto Rico realmente o melhor jogo?
A simples resposta a esta questão pode originar merecidamente uma tese universitária. Existem manuais na Internet sobre a melhor forma de jogar Puerto Rico que têm umas 50 páginas, daí se pode concluir que o jogo é muito mais complexo do que o que se pensa. Seja como for já aqui lhe fiz uma crítica e realmente acho que merece o título. Não é o meu jogo preferido, nem pouco mais ou menos, mas é sempre um prazer jogá-lo e sempre o será, porque a sua mecânica é genial e consegue agradar a toda a gente. Este clássico consegue sintetizar nele todas as virtudes dos eurogames.
Eu posso-me considerar, com algum orgulho, o pior jogador de Puerto Rico do mundo e não vou descansar, dentro da racionalidade é claro, enquanto não ganhar um jogo aqui ao Zorg que joga que se farta.
A minha resposta é, portanto, sim.

2 – Ainda se joga Catan?
Catan tem vindo a cair drasticamente no top do BGG. É considerado por muitos como um clássico. É merecido, porque na verdade o é, mas à medida que o tempo corre e a indústria vai evoluindo, Catan não parece tão atractivo, embora para muitos, os clássicos nunca envelhecem.
Desapareceu dos Tops pessoais e já não vejo ninguém a jogá-lo. Seja como for continua a vender e isso deverá querer dizer alguma coisa. Mas eu já não lhe consigo pegar.

3 – Analysis Paralysis: Motivação ou tortura
Este é talvez o assunto a que ando mais sensível. Bem sei que há quem goste de ganhar e que a jogada perfeita existe, mas estar 10 minutos á espera que um jogador veja todos os ângulos e calcule todas as consequências para cada uma das suas possíveis opções é realmente estragar-me a experiência. Chega ao ponto de se tornar insuportável e um jogo que em média demoraria 90 minutos tem tendência a arrastar-se para o dobro. Admito que numa ou outra fase uma pessoa esteja mais receosa, mas em todas as jogadas fazer os outros esperar é francamente irritante. Meus amigos, se são acusados de demorarem muito tempo a fazerem as jogadas é porque, de facto, demoram muito tempo e estão a estragar o jogo aos outros jogadores. Levem este tipo de comentários a sério, ou muito provavelmente mais ninguém vai querer jogar convosco nos próximos 10 anos.

4 – Jogar com a namorada/esposa/namorado/marido
Terá alguma piada? Este tipo de proximidade funcionará em jogos de negociação?
Há quem diga que é o suficiente para salvar um casamento e há quem diga que prefere estar em aventuras sexuais em vez de estar a gastar tempo a lançar dados com o cônjuge.
Eu, felizmente, tenho a sorte da minha namorada odiar jogos de tabuleiro...:)
Seja como for, nos jogos que envolvam negociação, a existência dum casal na mesa estraga quase de certeza a experiência.

5 – O tema é importante?
Eu pessoalmente gosto de temas e que os jogos assentem bem neles, mesmo que o jogo seja abstracto e possa, nesse sentido, funcionar tanto em alhos como em bugalhos. Não gosto muito de colagens à pressão e sem sentido. Mas também há o reverso da medalha. Os jogos do Knizia são péssimas colagens e muitos deles são brilhantes.
Mais importante do que esta questão é que o jogo traga com ele mecanismos inteligentes e motivantes para o jogador.

6 – Knizia Vrs Kramer
Gosto dos dois, mas sou muito mais vezes surpreendido pelo Knizia, muito embora aceite que não seja um designer do agrado de todos e nesse sentido o Kramer possa ser mais consensual e os incontáveis prémios que ganhou até agora sejam prova disso. Voto no Knizia.

7 – Joga sempre da mesma cor ou não tem preferência?
Esta pergunta é estúpida, mas engraçada. Gosto de jogar dos amarelos, mas não faço birra se não jogar deles. Mas gosto do efeito que dão no tabuleiro. É estúpido, eu sei, mas pronto.

8 – Qual é o melhor jogo de Richard Borg: Memoir 44, Commands and Colors ou Battlelore?
Só ainda joguei ao Commands e é brutal. Mas também sinto uma grande curiosidade em relação ao Memoir 44 que já li umas regras e pareceu-me também ele bastante bom, além de que a forma de jogar me parece diferente.
O Battlelore não achei muita piada ao facto das miniaturas virem todas da mesma cor. Apesar de todo o aparato não gostei de olhar para o tabuleiro e diferenciar uns dos outros pelas bandeiras. Prefiro os cubos do Ancients.

9 – Jogos de Guerra: Os verdadeiros jogos ou a verdadeira chatice?
Tenho vindo a olhar para eles com outros olhos. O problema de muitos deles é que exigem um envolvimento grande por parte dos jogadores. Arranjar tempo para ler as regras e estudar o manual e também ter um amigo que se preste ao mesmo pode ser uma missão algo difícil de completar. Mas, entretanto, apareceu o senhor Richard Borg que facilitou em muito este problema. Agora em apenas 40 minutos podemos fazer uma batalha histórica sem grandes esforços.

10 – Cooperative Games: Sim ou não?
Nunca joguei a nenhum por isso não me vou pronunciar muito sobre o assunto. Mas ao ver muita gente a jogar Shadows over Camelot parece-me que dão mais prazer do que estava à espera e que têm uma repetitividade bem superior ao que julgava. Terei de tirar as minhas próprias conclusões brevemente.

11 – Serão as miniaturas necessárias nos jogos de tabuleiro?
A minha resposta é SIM. Não há nada como as miniaturas para tornar a experiência encantadora. Parte do sucesso do Ticket to Ride vem das miniaturas. O Railroad Tycoon é um colosso com aquilo tudo em cima do tabuleiro. Valerá a pena pagar mais uns Euros para ter mais tralha?
Obviamente, SIM!

12 – Dados: Os maus da fita?
Eu não sou fundamentalista, gosto da lançar de vez em quando os dados. Mas sou mais adepto das cartas, parece-me que é um mecanismo mais sensual de distribuir a sorte. Uma coisa é certa, os jogos que utilizam dados têm tendência para diminuir o bug “Analysis Parlysis” e isso pode significar acabar a partida a horas e não desmaiar de fome.

13 – Jogar pela Internet. Vale a pena?
Não jogo. O nervosismo dos jogadores online para fazer um jogo de Puerto Rico em 5 minutos irrita-me tanto como o Analysis Paralysis.

14 – É aceitável continuar a jogar monopoly?
Aceitável é, mas qual é o objectivo? Acho o Monopólio bastante dependente da sorte. O dinheiro pode cair do céu sem que um jogador faça nada por isso. Tem uma coisa boa, a parte negocial mas, que por si só, não justifica perder tempo com ele.

15 – Age of Steam ou Railroad Tycoon?
Isto é como perguntar se nasceu primeiro o ovo ou a galinha. Venha o Diabo e escolha. Adoro os dois jogos. Os dois têm muitas virtudes e poucos ou nenhuns defeitos.
Qualquer dia, quando jogar novamente aos dois vou-me debruçar sobre esta resposta, por enquanto marco um X. Ficam empatados.


08 março 2007

Opinião: Struggle of Empires

Já aqui foi feita uma ligeira crítica a este jogo, mas senti, após jogar uma segunda vez, a necessidade de voltar a escrever sobre ele. É-me sinceramente difícil ficar indiferente a uma sessão deste assombro saído da mente do mestre Martin Wallace.
Da primeira vez que o experimentei, já lá vai um ano, confesso que fervilhei numa alegria inexplicável e profundamente infantil que percorreu a minha vida durante a semana seguinte. O momento também era propício, era o dia do 2º encontro de jogadores de tabuleiro organizado pelo Ricardo e quis o destino que aparecessem 6 pessoas. Não nos conhecíamos de lado nenhum e como o Struggle era o único jogo que dava para os seis, jogámos a esse. O resultado não podia ter sido melhor. Todos os envolvidos foram unânimes: Grande Jogo!
Agora, mais velho e com mais experiência nestas andanças, voltei a jogar e felizmente a ter o mesmo sentimento de satisfação quando abri a caixa e coloquei as tiles todas sobre a mesa. Aliás, esta minha boa disposição e este brilho nos olhos que me tem acompanhado diariamente tem vindo até a motivar alguns comentários, alguns deles bastante desagradáveis pois põem em causa a minha lealdade e sugerem, com escárnio, que a causa de tamanha boa disposição é o resultado dum envolvimento emocional extra-conjugal.
Mas não, a minha alegria vem toda de mais uma sessão de Struggle. Posso jogar por ano dezenas ou centenas de jogos mas é com Struggle of Empires que percebo a razão porque gosto tanto de jogos de tabuleiro. Parece um exagero mas não o é.
Parte deste contentamento já vem de longe. Remete para os anos de Risco. O Risco, apesar de tudo, é o jogo que mais joguei na minha vida e com quem tive mais afinidades. Deixei-o de jogar porque não é suficientemente bom para que sobreviva à idade e ao festim de lançamentos de dados. Mas foi a demanda por uma experiência igual aos anos do Risco que me fez aventurar neste mundo particular dos jogos.
Por isso, não foi de estranhar que, na minha primeira encomenda, mandasse vir Struggle Of Empires que, pelas imagens e pelas críticas, me pareceu ir buscar muito do que o Risco trouxe á minha vida de jovem inconsciente. Não me enganei.



Para começar, SoE é um épico de 5 horas. Não há volta a dar. Jogá-lo exige tempo e disposição. Não pode haver pressas, tudo tem de ser feito cuidadosamente, com calma e com os olhos ausentes de relógios. Quebrar esta regra implica estragar a experiência.
Um dos seus grandes atractivos é precisamente essa componente épica que está longe, no entanto, de se tornar enfadonha ou repetitiva.
O desenrolar do jogo é um processo que se entranha gradualmente no jogador. Este vai construindo sentimentos de raiva ou de amizade com os adversários e com a estrutura política do globo. Há uma história comum que se desenvolve a cada turno e a cada opção que se toma. Porque uma derrota humilhante tende a ser vingada na mesma região onde foi sofrida, usando para o efeito o jogador maior ou menor racionalidade. A determinada altura a honra torna-se uma condição bem mais importante que a vitória nos pontos, comemorando-se, deste modo, as vitórias com bastante pompa e entusiasmo.
Existem dados, o elemento sorte está presente, mas ao contrário do que se possa pensar, cada lançar de dados tem uma história por detrás, uma história de alianças, traições, dívidas antigas ou simplesmente o mau feitio como motivo. As guerras são caras, custam dinheiro difícil de obter e as derrotas ferem a população e a opinião pública, deixando o derrotado de rastos. Por isso só se olha a guerra de frente quando existe uma franca possibilidade de vitória. Normalmente os dados não estragam a certeza pelo que a sorte não é um factor determinante. Mas claro que existem surpresas.
O jogo é todo uma dança, uma dança que é feita aos pares onde existem cúmplices e culpados por todos os lados. Qualquer que seja o vencedor no final da partida, ele só é determinado com a ajuda dos adversários que, numa ou noutra situação o protegeram e lhe deram apoio militar suficiente para ganhar uma batalha e aumentar a sua influência.

SOE é um área control. Esse controle é conseguido através de batalhas. Cada derrota implica menos influência militar e política numa determinada região e cada vitória origina o inverso. As áreas estão divididas pelo globo. Africa, Índia, Indonésia, América e Europa central. Umas valem mais pontos, outras valem menos. É aqui que começa a dança. As potências vão dividindo as suas tropas, os seus barcos e os seus fortes pelo mundo à procura de pontos vitória ou então a defender os pontos que já obtiveram.
Como ser líder duma grande potência não é coisa fácil, Martin Wallace faz sentir os jogadores que por muito que tentem, vão cometer erros atrás de erros, fazer más jogadas atrás de más jogadas e a ter más opções atrás de más opções. Vão ser traídos, vão fazer maus arranjos políticos e terão mais cedo ou mais tarde a cabeça a prémio na opinião pública. Sim, porque Struggle of Empires penaliza as perdas em combate e também o endividamento externo. São os chamados pontos de descontentamento que serão contabilizados no fim. O Jogador que tiver mais subtrai à pontuação final uma penalização que poderá, no pior dos cenários, custar a vitória. Por outro lado se obtiver 20 pontos de descontentamento perderá o jogo. Não é um valor fácil de chegar, mas também não é difícil.

O grande atractivo deste jogo é o sistema de alianças. Nos três turnos do jogo existe um leilão em que os jogadores são arrumados em 2 alianças. Metade dos jogadores ficam dum lado e a outra metade fica do doutro (daí ser mais interessante jogar com o nº par). Para fazer parte dum ou outro lado da barricada é preciso pagar. Além de se estruturar os lados em conflito também se determina no leilão a ordem de jogo. Os valores por vezes atingem valores altos num jogo em que o dinheiro é um bem muito escasso.
A regra de ouro é que os jogadores não podem lutar contra os jogadores da própria aliança. No entanto podem luta ao seu lado nos combates que vão fazendo nas regiões. Quando a ajuda aparece, após pesadas negociações de troca de favores, os exércitos aliados juntam-se numa força multinacional. Em caso de vitória só o jogador activo é que beneficia com ela. Normalmente, o jogador passivo, quando passar a jogador activo receberá em troca a mesma ajuda. Os termos das alianças variam muito conforme as circunstâncias. Mas existe uma constante fase diplomática de troca de favores e esquemas que permitam uma posição mais confortável a uma aliança do que a outra. Aqui joga também o efeito psicológico. Pertencer a uma aliança traz sempre um sentimento de pertença e por muito calculista que um jogador seja, gosta que o seu lado vença.
Mas não se habitue o caro leitor a este ambiente de amizade e fraternidade. E que terminado o turno, é feito novo leilão e a estrutura das alianças pode-se alterar. Os aliados do turno anterior podem tornar-se inimigos no presente e o jogo dá um volte face do catano sendo novamente necessário novas conversações diplomáticas de forma a equilibrar as forças em conflito.
As regras apesar de não serem difíceis são maçudas de explicar. Demora algum tempo, mas faz tudo sentido. Aconselho vivamente a leitura das FAQ, que por sinal têm mais do quíntuplo das páginas que as regras oficiais (5 páginas). Mas é um jogo que só de olhar se percebe o básico.
Seja como for é um jogo de guerra e portanto as acções dos jogadores são o costume neste tipo de jogos. Pode-se fazer guerra, fazer movimentações, construir exércitos e ir buscar tiles (que dão vantagens variadas). Cada vez que o jogador joga, pode fazer 2 dessas acções, muito embora o jogador tenha a consciência que seriam precisas 10 acções para se sentir satisfeito. Pode-se compreender assim a dificuldade que é administrar tudo o que se passa no tabuleiro.
As batalhas são o costume. Contam-se os exércitos em contenda e somam-se o resultado dos dados. As batalhas estão divididas em 2 fases. Primeiro resolve-se a batalha marítima (se houver barcos na zona) e depois a terrestre. Os soldados para se deslocarem dumas zonas para as outras precisam de barcos, pelo que é necessário ter um bocado de tudo.



Struggle faz uma adaptação para o tabuleiro duma época (do século XIX aos princípios do XX) e fá-lo com extrema inteligência e sentido de oportunidade. Aqui estão representados parte dos efeitos perversos da revolução industrial, onde as potências vão criando cada vez mais um arsenal maior cujo objectivo passa mais por intimidar o adversário do que propriamente batalhar. O constante fazer e desfazer de alianças entre potencias, a colonização brutal e sanguinária, a mina do mercado de escravos, a opinião pública que ia tendo cada vez mais informação através da imprensa do que se passava no mundo, as guerrilhas de independência e muito, muito mais.
Para quem gosta dum bom jogo de guerra à moda antiga e para quem o tempo bem passado sentado à mesa com amigos é um luxo difícil de resistir, Struggle of Empires assume-se como um título indispensável e obrigatório. Não existe grande complexidade, a maior dificuldade surge nas poucas acções a que um jogador está submetido atendendo aquilo que quer fazer. Seja como for tem de ser jogado com mais de 4 jogadores para ser compensador.
Talvez tenha dado uma opinião bastante poética daquilo que o jogo é. Mas entenda-se que é o meu preferido e quando é jogado a 6 é como ir ao céu e voltar.


01 março 2007

A vida deste rapaz!

É certo e sabido que os jogos de tabuleiro, enquanto hobby, despertam o geek que há em nós. Muitas vezes somos levados a ultrapassar a barreira do racional.
Fazemo-lo por amor e proporcionando, com isso, algum delírio na comunidade.
Já vi de tudo. Desde o rapaz que esteve uma tarde toda a lançar cubos para a torre do Shogun e fazer uma estatística sobre os cubos que caíam até ao gajo que foi capaz de escrever um tratado de 50 páginas sobre as estratégias que se podem usar em Puerto Rico.
Pois bem, desta vez e só a título de informação, deixo-vos um link dum jovem advogado chileno que anda doido pelos jogos de tabuleiro e após a descoberta das suas reais capacidades de comunicador, deu-lhe para investir no material multimédia lá de casa e com isso construir um blog bem interessante sobre o hobby.
Os vídeos sucedem-se a bom ritmo e o jovem chileno, bem intencionado, mostra-nos como funciona cada jogo que filma. Tudo bem feitinho, com música de fundo e tudo. O único problema deste jovem é que ainda não aprendeu muito bem a questão do timing televisivo e os seus vídeos pecam por exagerados. Uma hora para explicar como funciona um jogo é capaz de ser pouco convidativo.
Seja como for, o esforço é bem positivo e, neste momento, ele é o meu geek favorito!

http://juegosmontt.info/