03 dezembro 2009

Ra: Leilões para quem os tem no sítio

Há certas coisas que nos aquecem o coração. Estava eu a navegar pelo site todo catita do tujogas.pt quando me deparo com este parágrafo sobre este cantinho:

“Este blog foi um dos primeiros sites, senão o primeiro, a escrever conteúdos sobre jogos de tabuleiro em Portugal. Mantido por dois jogadores da zona de Lisboa, oferece reviews, sessões de jogo e artigos de opinião sempre com um toque humorístico muito particular e característico, que nos faz rir e sorrir vezes sem conta. Apesar de actualmente não ter a mesma actividade regular de outrora, é, e será sempre um marco de referência no panorama nacional.”

Após a leitura de tão simpáticas palavras só me restou, enquanto visado, abrir o Word e escrever qualquer coisa de forma a poder merecer o palavreado.
Com a chegada do Gabriel, agora com 9 meses, o tempo para conhecer as novidades no mercado é escasso. Por isso, só tenho acesso a jogos antigos o que me torna inútil para os jogadores ávidos por saber o que de novo anda no mercado. A todos eles apenas digo que não há nada como os clássicos.
Paradoxalmente, e apesar de todo o tempo que uma cria consome a um homem, 2009 foi o ano em que joguei mais, isto devido a ter um grupo certo de jogadores, constituído por colegas de trabalho que aproveita a hora de almoço para uma jogatina. Portanto, devido a essa feliz contingência da vida, sou um grande consumidor de Snow Tails, Powerboats, Bohnanza e Ra.
Este último jogo, de Reiner Knizia, é mesmo um dos preferidos, tornando-se bastante jogado e comentado na hora de expediente.



Não é fácil explicar como tudo se processa. Existe um saco negro onde se acotovelam 1600 tiles de vários tipos. As combinações destas tiles determinam a pontuação do jogador.
Exemplo, o jogador que tiver mais tiles verdes no final de cada ronda ganha 5 pontos. O jogador que tiver menos perde 3 pontos. Por outro lado, o jogador que não conseguir uma tile cinzenta por ronda perde 5 pontos. Como podem ver, o sistema de pontuação não é muito simples e o jogo está cheio de exemplos destes. Cada tipo de tile tem o seu sistema próprio de pontuação. Isso faz com que algumas tiles sejam de extrema importância e que exijam um esforço do jogador para as conseguir, de forma a poder maximizar a sua pontuação.
A forma de conseguir os pedaços de cartão tão badalados no parágrafo anterior é através dum leilão algo sui generis. Aqui, mais uma vez, as coisas voltam a complicar-se. Cada jogador no início de cada turno dispõe de 3 fichas. Estas fichas têm valores diferentes para cada jogador, mas são sequenciais. Ou seja, vão de 1 a 13 ou 16 consoante o numero de convivas. As coisas começam equilibradas. O jogador que tiver a peça com o número mais alto é também o que tem o número mais baixo.
As tiles vão saindo do saco e a determinada altura (não interessa entrar aqui em pormenores) vai-se fazer o leilão. Nesta fase os jogadores pegam nas suas peças numeradas e leiloam. O twist final, ou não fosse este um jogo do Mestre Knizia, é que a peça que o jogador usou para ganhar o leilão vai para o meio e será leiloada juntamente com as tiles que saírem na próxima arrematação. Exemplo: Imagine o adorado e inteligente leitor que vão ser leiloadas 3 tiles verdes, 2 azuis e uma cinzenta. No meio da mesa está uma peça com o numero “4”. Ciente da importância desta mão, o jogador decide num acto de sensatez, jogar a sua peça “15”. Ganha o leilão e todas as tiles mais o número 4 que pode ser usado para leilões posteriores. O seu nº 15 vai para o meio. No próximo leilão o jogador que o ganhar, vai ficar com as tiles que saírem do saco mais o numero 15.
Basicamente é isto. Convém ainda salientar que existem tiles negativas que fazem um jogador perder pontos. Por outro lado existem os “RA” que são tiles que aceleram o fim do jogo e forçam um leilão. Seja como for, existe também a possibilidade de qualquer jogador poder forçar um leilão, ficando apenas obrigado a licitar.


Tudo isto parece complicado e de facto é. Mas após meia dúzia de jogadas já se percebe tudo e não existem dúvidas.
O que é interessante no meio disto tudo é que o jogador vê-se obrigado a tomar muitas decisões. Valerá a pena licitar ou esperar por melhores oportunidades? Esta dúvida acompanha o jogador por 45 minutos e é preciso ter algum sangue frio para não perder a cabeça e começar a fazer merda. Até porque, as contingências do jogo podem originar que um jogador fique sozinho a jogar. Repare que uma vez usadas as peças que o jogador dispõe em cada ronda, este ficará de fora, não podendo participar em mais nada até que todos tenham usado as suas peças de leilão. Portanto quem se guardar para o fim poderá tirar tiles à vontade do saco sabendo que irá ficar com elas. No entanto o saco é padrasto e nem sempre jogar sozinho equivale a uma grande jogada.


Ra é isto. Claro que depois desta explicação não percebeu patavina do jogo. O que posso garantir é que é um jogo rápido e onde é necessário decidir. Originará muitas dúvidas na sua cabeça e ficará a rodar as peças de leilão pelos dedos enquanto decide o que fazer.
De certa forma até se pode equiparar a um banal jogo de Poker, pelo menos no que toca a sangue frio. Embora Ra não disponha da artimanha do Bluff, tem outras vantagens bem mais interessantes na minha opinião, como por exemplo a profundidade.
Ra é um jogo brilhante que dá gozo jogar e faz parte dos grandes clássicos do tabuleiro. Infelizmente nem toda a gente consegue partilhar esta paixão por esta obra de Reiner Knizia, mas os que gostam não o param de jogar.

Classificação: ****

02 outubro 2009

Snow Tails: O jogo que veio do frio

Muitos dos leitores que por aqui aparecem já devem ter desabafado com o monitor o estado em que este blog está. A verdade é que, admito, nunca foi grande espingarda, mas agora chegou mesmo ao fundo do poço. Dois meses para escrever o que quer que seja é realmente um hiato de tempo considerável. Especialmente quando a concorrência já começa a lançar episódios de vídeo de grande qualidade cujo à-vontade do apresentador faz lembrar os grandes nomes do entretenimento americano.
Mas a explicação deste abandono é simples. Eu trabalho numa instituição onde temos um período de almoço de 90 minutos. O que acontecia amiúde era que aproveitava todo este tempo livre para escrever alguma coisa para o blogue. E a coisa ia-se fazendo.
Até que um dia, contudo, andava eu a passear pelos corredores quando vejo dois colegas enfadados a jogar solitário para ocupar o tempo livre. Foi aí que tive uma ideia.
Comprei propositadamente o Genial do Rener Knizia e levei-o. Apresentei o jogo em 5 minutos e jogámo-lo com entusiasmo. A partir daí o ciclo começou a ser mais ou menos recorrente. Comíamos e jogávamos Genial até às duas. A curiosidade acabou por contaminar outros colegas e às tantas já éramos 6. Muita gente para um jogo de 4 jogadores. Levei o Powerboats e, meus amigos, a explosão de entusiasmo que o jogo gerou foi tanta que tenho a sensação que houve quem chorasse com a emoção.
Senti, então, que já tinha jogadores prontos para uma jogatina à hora de almoço. E melhor do que tudo, as raparigas, mais avessas a estas coisas, participavam e jogavam com um afinco desmedido. Para terem uma ideia já fazemos campeonatos de Powerboats com prémios e classificação. Além disso fez-se uma encomenda especial onde se comprou 5 cópias do jogo.
Agora jogamos tudo, Catan, Stone Age, Carcassonne, Great Wall of China e o que mais aparecer. Muitas vezes trazemos sandes ou uma salada para aproveitarmos os 90 minutos do período de almoço.
Mas no meio deste idílio lúdico houve um jogo que foi recebido com especial atenção e que causou uma sensação diferente. O seu nome? Snow Tails.


Snow Tails dos irmãos Lamont, é um jogo que tenta simular uma corrida de trenós. O jogo é simples. Uma pista na neve com curvas rectas e contracurvas, e 5 trenós que disputam a vitória. Cada jogador tem um baralho com cartas de 1 a 5. Estes valores são o motor que faz avançar o trenó. O trenó tem 3 secções que podem receber as tais cartas. O cão direito, o cão esquerdo e o travão. A velocidade que o trenó alcança é o valor do somatório dos cães menos o do travão. Exemplo: o cão esquerdo tem uma carta de 3, o do lado direito 2 e o travão tem uma carta de 3. Contas feitas 3+2-3=2. O jogador avança duas casas.
Simples não? A somar a este mecanismo existe também a diferença de valores entre os rafeiros. Pegando no exemplo acima, o trenó avançaria 2 casas mas teria forçosamente de descair uma casa para a esquerda devido à diferença de valores entre o canídeo esquerdo e o direito (3-2=1). Resultado, o jogador avançaria uma casa a direito e outra para o lado canhoto. É através deste sistema que se vão conseguir fazer curvas.
O jogo é isto ressalvando sempre a obrigatoriedade de se jogar uma carta, ou então mais do que uma carta desde que tenham o mesmo valor.


O que é realmente interessante em Snow Tails é que o jogador tem de planear as suas jogadas seguintes de forma a gerir as cartas e rentabilizar a sua velocidade na pista que, diga-se, está cheia de perigos. Arvores, buracos, caminhos estreitos, bifurcações, etc são alguns dos exemplos. No entanto sempre que o jogador perder o controle do trenó e bater, em vez de jogar com as 5 cartas que formam uma mão, ficará com 4 e assim sucessivamente. Ou seja, sempre que houver dano, as opções do jogador para o resto da corrida diminuem.
O jogo é um extraordinário exercício de corrida com várias decisões, algumas delas complicadas, mas que consegue preservar a emoção até ao fim. Joga-se em 45 minutos e dá um gozo do catano. Para os apaixonados de corridas, como eu, é um título obrigatório.



Classificação: ****

29 junho 2009

Session Report: Automobile

- Então o que é que vais jogar hoje?
- Ao último do Wallace.

Foi assim, como quem vai ver o último filme do Scorcese, que me desloquei à casa do Zorg, último reduto da cidade de Oeiras onde se consegue jogar sem que seja servida uma única pinga de álcool. Mas se na maior parte das vezes a secura pode ser um transtorno para a alegria e boa disposição da mesa, noutras ocasiões é uma abençoada benesse para o normal desenrolar da partida.
Foi o caso de Automobile. Jogo que recebeu por todos os lados os mais rasgados elogios, mas que, diz-me a experiência, tratando-se dum Wallace, poderia ter havido a tendência para exagerar nas qualidades da obra.
Automobile mostrou logo no tabuleiro o mesmo grafismo pobre e pouco imaginativo que caracterizam os jogos da Warfrog/Treefrog. Não sei qual é a relação entre Martin e o seu art designer mas convenhamos, já é altura de mandá-lo para um curso de Photoshop para ver se desenvolve algumas capacidades. Houve mesmo quem dissesse por maldade que a qualidade gráfica do protótipo era francamente melhor que a do jogo final. Seja como for, para o efeito, o tabuleiro é realmente pouco importante. Ao contrário do que é normal neste britânico de olhar apaixonado, Automobile não é um jogo de mapa e, atendendo a isso, pouco relevância tem jogá-lo numa folha de papel vegetal ou num pedaço de cartão.
O que é realmente importante e que se realça na experiência de jogo é a dimensão contabilística exigida aos jogadores. Aqui brinca-se ao lucro/prejuízo e as contas surgem a cada ronda em doses industriais. Quantas fábricas construir, quantos carros produzir, o que é que o mercado quer e que fabricas vão dar prejuízo? Acreditem, é de dar com a cabeça nas paredes. No fim, quando tudo termina, parece que é tirado um peso de cima dos miolos e todos nos sentimos aliviados por aquele pesadelo ter finalmente acabado.
Só para que sirva de exemplo, éramos 5 jogadores. Eu, de cada vez que a era a minha vez, não sabia literalmente o que fazer. O Francisco (vulgo Spirale) que é um homem dado à conversa estava quietinho no seu lugar perscrutando as oportunidades do jogo em silêncio como se nada existisse além dos seus carros e das suas fábricas. O Teixeira, homem de grande ponderação, que normalmente faz sempre grandes jogadas baseadas numa meditação profunda, abanava a cabeça em desespero, impotente para resolver os problemas que lhe iam surgindo. O Bruno que percebe de contas e consegue chegar a uma conclusão em 2 minutos, não resistiu a Automobile e fez o seu jogo sempre agarrado à maquina calculadora do telemóvel, pratica muito contestada, diga-se, por todos os adversários.
Automobile é isto. Contas, ponderação e desespero. Isto pode ser, para os mais masoquistas, o maior elogio que se pode fazer a um jogo, mas para mim, homem que prefere uma boa dose de descontracção, senti bastante desconforto. É que apesar de tudo, Automobile exige mais a um jogador do que aquilo que eu pessoalmente estou disposto a dar a um jogo de tabuleiro. Mas claro, são opiniões.
Mas Automobile está muito bem desenvolvido e é um jogo de gestão puro. Se eu mandasse no ensino deste país, todos os alunos de Gestão seriam obrigados a jogar Automobile e a seguir fazer um trabalho sobre os problemas que o jogo cria e, claro, as formas de os solucionar.
Pouco mais me adianto, só queria deixar aqui as minhas impressões até porque o Zorg está encarregado duma crítica mais pormenorizada sobre o tema a escrever sabe deus quando. Mas para quem gosta de jogos pesados e difíceis tem aqui um desafio bem interessante.


24 junho 2009

Vinícola

Há gajos espertos e o Vital é um deles! E é esperto porque percebeu logo que se havia tema capaz de vender um jogo, esse tema era o tintão! E foi com esta premissa que nasceu o Vinícola!

Com um tema destes, era impossível ninguém pegar nisto e hoje foi oficialmente anunciado que, após duríssimas negociações, a What's your game, uma das mais respeitadas editoras Italianas, vai publicar este Vinícola! Os números do contrato ainda estão no segredo dos deuses, mas ao que consta alguém ouviu o Vital dizer "digamos que não vou ganhar menos que o Cristiano Ronaldo".

O jogo será lançado oficialmente em Nuremberga e mais detalhes podem ser lidos na RedeDeJogos.

Da nossa parte, resta-nos dizer: parabéns Vital... e quero fazer parte da tua posse! Deixa-me viver às tuas custas, como uma espécie de cunhado do Cristiano Ronaldo. Eu lavo, limpo, passo a ferro e bajulo 24h por dia...

18 maio 2009

Wealth of Nations: Amigos amigos negócios à parte


Uma das grandes maravilhas que a televisão recentemente me ofereceu foi sem dúvida a prestigiada série americana Anatomia de Grey. Não sei se existe alguma mensagem subliminar nos diálogos ou então nas célebres cenas de elevador mas a verdade é que as mulheres andam completamente doentes por aquilo. A minha, como seria de esperar, segue o exemplo do mundo e já faz parte do clube de fiéis seguidoras do programa. Veste o pijama, faz pipocas para alimentar uma família inteira, dá-me o Gabriel para as mãos e, durante horas, deixa-se estar no sofá com os olhos depositados no televisor como se não houvesse nada mais importante na vida do que as desventuras amorosas daqueles médicos bonitões.
Mas o que é demais também cansa e, depois de 5 ou 6 episódios seguidos, cai na realidade e permite-me então escapar de casa por algumas horas e fazer o que bem me der na gana.
- Vai, eu fico com ele!
E foi assim, na sequência deste sentimento de culpa feminino, que me meti no carro e fui na bisga para casa do Zorg onde me esperava uma bela sessão de Wealth of Nations.

Wealth of Nations tem uma carga mítica por trás que é sempre bom recordar à mesa antes de se explicar as regras. A empresa responsável pelo jogo faliu no exacto momento em que as cópias estavam numa longínqua e movimentada doca da China, prontas para serem transportadas para os Estados Unidos. Diz-se que os trolhas chineses descansavam sentados em cima delas enquanto aguardavam ordens para carregar. Mas quis o destino que, em vez de serem lançadas ao mar ou vendidas a um euro e meio numa das muitas lojas chinesas de bugigangas espalhadas pelo mundo, as cópias chegassem sãs e salvas à terra do cão de água mais famoso do mundo. Depois de andarem em convenções da especialidade e de haver uma reacção positiva, num ápice foram vendidas 2000 em apenas um mês. Uma delas, atravessou o oceano e chegou feliz mas cansada à casa do Zorg. Mediante esta epopeia inter-continental, nada mais natural do que confirmar o valor lúdico do título em questão.


Wealth of Nations é um jogo económico com muita negociação pelo meio e que põe toda a gente a discutir preços como se fossem marroquinos num bazar para turistas. A sinopse consiste em cada um dos jogadores ter a seu cargo uma potência fictícia e desenvolvê-la industrialmente de forma a poder transpirar saúde financeira e aparecer nos noticiários do mundo como um exemplo a seguir. Os mecanismos são bastante intuitivos e simples de perceber e, olhando para o Player Aid, os jogadores mais experientes conseguem perceber facilmente o jogo.
O jogador vai poder construir quintas, geradores de energia, bancos, fábricas, minas e academias. Estas construções, quando entram em fase de produção, vão originar 6 recursos diferentes que não são mais do que cubos coloridos e também notas (no caso do banco). Assim, é necessário gerir comida (das quintas), energia (dos geradores), dinheiro (bancos), capital (fabricas), minério (das minas) e trabalhadores (das academias). Como já certamente percebeu, a conjugação dos vários tipos de cubos permitirá ao jogador construir e produzir mais, tornando deste modo a sua potência mais forte e competitiva.
Exemplo muito prático: A produção de minério necessita que o jogador tenha uma mina e para além disso um cubo de energia e outro de comida para que a mina produza; um banco produz 30 dinheiros mas para os produzir precisa também de uma comida e de uma energia; construir um hexágono de academia que vai fornecer trabalhadores, vão ser necessários 1 minério e 1 capital; a construção de um gerador vai consumir, tal como a academia, um minério e um capital e bla, bla, bla, bla, bla. Já toda a gente jogou 7000 jogos com este sistema de cubinhos e portanto já percebeu que vai precisar de todos para poder fazer alguma coisa de jeito. No entanto, não pense o adorado leitor que o jogo é um deja vu insuportável. Nada disso, Wealth of Nations traz consigo ideias muito bem conseguidas, bastante interessantes e que funcionam muito bem tornando a experiência bastante fresca e desafiadora.


Para começar o mapa é um hexágono gigante onde as potências vão construir na medida do possível as suas indústrias. O espaço é pequeno e o sistema de construção não dá jeito nenhum, dificultando imenso a vida ao jogador que tem de pensar muito bem a melhor forma de se expandir e arrumar as suas construções. Existem industrias que produzem 3 recursos, outras que produzem 2 recursos e 1/2, outras 2/4 recursos, outras 1 e 1/3, etc. Pode-lhe parecer estranho, mas a ideia é que o jogador tenha de construir vários hexágonos da mesma cor para poder ter algum proveito.
Exemplo: Se eu construir uma mina ganho um minério, mas se construir duas já ganho 3 e se construir a terceira mina ganho 5. A grande chatice é que os hexágonos de construção entram muitas vezes em conflito e é difícil arranjar uma posição permitida pelas regras, tornando assim o espaço num bem muito valioso que convém gerir com alguma inteligência e planeamento.


Existem recursos mais valiosos que outros e, em consequência disso, mais difíceis de produzir. Mas como já escrevi, irá precisar de todos. Não à volta a dar e escusa de arquitectar um plano para ser auto-suficiente. Vai cobiçar e necessitar bastante dos cubos do vizinho do lado. A sua dependência pela produção alheia é grande, muito embora possa sempre conseguir o que pretende no mercado. Só que o preço a pagar é bastante mais alto do que aquele que conseguirá regateando com os outros convivas. Esta premissa é a alma da experiência.
O que ressalta logo à vista é que o jogo vem equipado com uma mecânica de mercado bem sensual e que funciona na perfeição. Assim, consoante a variação da oferta e da procura, os valores dos cubos oscilam também. Se houver muitos cubos azuis o valor deles baixa, mas se houver poucos o seu preço sobe consideravelmente. Um bocado à semelhança do que acontece no Brass. O que torna o mecanismo interessante é que os jogadores podem, ao não vender os seus cubos excedentes, tornar os preços mais altos, mas como estão dependentes da produção alheia, os outros jogadores podem fazer o mesmo, criando aqui uma situação bastante interessante de ser resolvida. Para mais o dinheiro é escasso e este é daqueles jogos que por vezes uma diferença em um dinheiro é considerável.
Exemplo prático que está sempre a acontecer: Um jogador tem 35 dinheiros para gastar. Precisa de comprar um cubo vermelho e outro preto. Se comprar ao mercado vai gastar 41. Tinha então de fazer um empréstimo que é sempre chato, mas se tentar comprar estes dois cubos a jogadores pode consegui-los pelos 35. Para isso terá de negociar e ser simpático. Se conseguir pelos 35 óptimo, mas se conseguir, após várias tentativas por 36, terá de pedir um empréstimo. Pela diferença mínima será obrigado a endividar-se.
Os empréstimos podem ser pedidos quando se quiser e na quantidade que se achar necessária. Porém, sempre que pedir um empréstimo o valor que recebe em troca é menor do que o anterior. Se pedir um empréstimo recebe 20, mas se pedir o segundo já recebe 19 e assim sucessivamente. No fim terá de pagar 25 por cada um. Não chateia, podia ser bem pior.


Em jeito conclusão posso afiançar que gostei imenso deste Wealth of Nations. É um jogo de negociação para homens e por vezes atinge alguma tensão e intensidade especialmente quando se diz não. Eu não sou um grande apreciador de jogos de negociação precisamente por causa disso. As pessoas têm tendência a transformar-se e a levar um bocado a sério a capacidade de persuasão ao ponto de se tornarem desagradáveis. Wealth of Nations pode, nesse aspecto, transformar-se de alguma forma numa experiência algo violenta. Por outro lado como existe muita conversa entre o vende e não vende, o tempo que o jogador fica à espera da sua vez pode exceder o razoável originando uma falta de ritmo considerável e de alguma forma desmotivante. Além disso o planeamento do que se quer fazer não é de todo evidente e é necessário saber o que se quer construir, quantos cubos são precisos, quais as cores e o preço que se está disposto a dar. Esse cálculo ainda carrega mais o tempo de espera. Outro dos aspectos a ter em consideração é que o jogo penaliza imenso uma má jogada. Basta calcular mal um cubo para lixar todo o esquema de produção. Isto origina que o jogador fique para trás e se sinta desmotivado a continuar, o que é de certa forma grave quando um jogo pode atingir as 3 horas.
Em contrapartida para os apreciadores da negociação Wealth of Nations é um diamante raro e acreditem os entendidos do género que há muito para explorar. Não é só o negociar mas também o produzir de forma sustentada para que haja uma continuidade ao que se transacciona. Pode-se ser um negociador nato, mas se o sistema de crescimento industrial não está devidamente desenvolvido, pouco há a fazer.
O mercado é um mecanismo que seduz bastante e, em consequência, os jogadores querem aprender mais sobre ele e testar as suas ideias de forma a tirar o melhor partido das oscilações que sofre. Não é de estranhar que haja falatório após a partida e cada cabeça dite a sua sentença e, quanto a mim, só há uma forma de saber quem tem razão, jogar outra vez. E garanto que quem experimenta quer lá ir novamente. Isto é um ponto a ter em consideração, especialmente para aqueles jogadores que compram muitos jogos mas que raramente têm a oportunidade repetir.
Por outro lado, com repetidas sessões poderá haver tendência para se formar um padrão negocial o que tira o efeito surpresa, mas como só joguei uma vez não posso sustentar esta ideia.
Contudo o maior ou menor sucesso da sessão depende do grupo. Jogar com quem sofre de AP pode transformar uma ronda num autêntico pesadelo.
O jogo sofre ainda de males menores como o final algo atabalhoado ou a forma como gere os empréstimos. Nada de extraordinário, claro, mas que obrigaram o seu designer pensar em formas de melhorar esses pormenores, abrindo para o efeito um fórum no BGG com algumas soluções.
Uma boa notícia é que está a ser testado uma expansão com o sugestivo nome de War Clouds que poderá, quem sabe, apimentar a interacção.

Classificação: ***

08 abril 2009

Commands & Colors Ancients: Batalhas com história

O nascimento dum filho, como a grande maioria de vós o saberá melhor que ninguém, acarreta para um pai extremoso e ciente das suas funções, grandes responsabilidades e também grandes mudanças. Por muito que se oiça os conselhos e avisos dos mais velhos e experientes, nunca ninguém está devidamente preparado para as exigências insondáveis e incontroláveis duma cria, mesmo que esta tenha um ar absolutamente encantador. Face a isso, este pobre e honrado escriba deixou assim a vida boémia e lúdica a que estava habituado, remetendo a sua mísera existência a uma rotina de mudar fraldas, preparar biberões e acalmar choros descontrolados. Mas não se pense que não batem as saudades duma mesa cheia de amigos e boa pinga que tradicionalmente um bom jogo de tabuleiro oferece. Claro que sim, mas na impossibilidade, por ora, de mergulhar de corpo e alma no seu hobby de eleição, resta-lhe apenas meter o catraio no marsupial e entregar-se às jogadas diárias de Street Soccer e Powerboats que faz na solidão do seu PC.
Mas nem tudo são privações. Diga-se pois, em abono da verdade e do equilíbrio das coisas, que o que Deus tira com uma mão dá com a outra e estes tempos de abstinência serão compensados no futuro, porque a criança nasceu macho e, portanto, acredito que tenha dentro dela aptidões para ser um grande jogador e para passar ao lado do pai muitas tardes com dados de seis faces na mão. Não faço questão nenhuma que seja do Benfica, aliás provavelmente o futebol português não deve durar muito mais, mas levarei a meu encargo um esforço nobre para que ele saiba apreciar, na mais tenra idade, a excelência dum bom Knizia e a importância dum Wallacce dos primeiros tempos.
Gostava muito de continuar este paleio introdutório, mas terei primeiro de preparar o biberão para o alimentar, pois começo a ouvir os primeiros sinais dum despertar que, tenho a certeza, será bastante ruidoso.


Há já algum tempo que estava para escrever algumas palavras sobre Commands & Colors: Ancients, mas nunca o consegui fazer. Tecer parágrafos sobre jogos de guerra, especialmente quando são bons, é quase como, para um escritor de romances, aventurar-se na poesia. Mas afinal este é talvez o meu jogo preferido e, portanto, nada de mais lógico do que dar aqui a minha opinião.
Desenhado por Richard Borg, C&C:A é um jogo que pega novamente no seu aclamado Command Card Sytem que já antes tinha sido posto em prática com resultados interessantes em títulos como Battle Cry e Memoir 44. Tudo gira à volta de cartas que permitem ao jogador movimentar as suas tropas consoante as instruções nelas impressas. Ou seja, e para os poucos que não conhecem, o tabuleiro está dividido em 3 campos (direita, centro e esquerda) e as instruções, basicamente e duma forma muito grosseira, referem-se a ordens relacionadas com as posições na batalha. Exemplo: Movimentar 3 unidades do lado direito, movimentar toda a cavalaria que estiver no centro, uma unidade em cada um dos 3 campos, etc. Percebem a ideia? O objectivo é o jogador ter de fazer escolhas consoante a sua mão de cartas. O jogo deste modo cria limitações às movimentações e muitas dúvidas sobre que corpo do exército movimentar resultando daí uma experiência de jogo intensa e com o bónus de uma simulação de batalha durar no máximo uma hora.
O sistema em questão atinge o seu auge em C&C:A que calça como uma luva na história militar da antiguidade e faz rebolar de contentamento os curiosos e estudiosos das grandes batalhas. O primeiro título da franchise centra-se nas guerras púnicas e o jogador pode finalmente por em prática as suas aptidões de general e ver como se saia se vivesse naquele tempo e tivesse a cargo milhares de homens e alguns elefantes. É que estudar uma batalha púnica e saber os seus passos é um hobby mais menos recorrente e bastante saudável diga-se. No entanto, para todos aqueles que já passaram dezenas de horas e ler sobre o assunto, fica-lhes um amargo de boca sempre que fecham um livro e imaginam como seria um campo de batalha. É que, por muita teoria que se tenha, falta o mais apetecível. A sensação. E é essa lacuna que C&C:A vem, na minha opinião, colmatar na perfeição.
Em primeiro lugar as batalhas mais importantes e mais badaladas estão todas reconstituídas, como a do Rio Ticinus, Cannae, Castulo, Baecula ou Zama. A par disto, o jogador pode ler um pequeno apontamento histórico sobre a batalha em si e sobre o que aconteceu. Para além disso tenta-se recriar o tipo e quantidade de tropas envolvidas e as vicissitudes do terreno e da própria contenda. Um mimo.
Em segundo lugar estão lá os grandes generais cartagineses e romanos como Hamilcar, Hannibal, Hanno, Hasdrubal, Scipio, Cassius, Atilus, etc. Eles têm a sua peça especial que se movimenta e que é fulcral no desenrolar dos acontecimentos.
Por último o jogador pode também contar com uma panóplia extensa de unidades para se entreter. Infantaria, carros, cavalaria, camelos, máquinas de guerra, elefantes, camelos, arqueiros, etc. Cada uma destas unidades tem especificidades próprias e nem sempre são iguais dum lado ou do outro da barricada.
Bem, acabada que está a apresentação, vou ali pôr a chucha no Gabriel que ele parece estará resmungar com qualquer coisa.


Quanto ao jogo em si, este lê muito bem o que deveriam ter sido as batalhas da altura. É tida e atenção a supremacia de certas unidades, a entrada delas em cena, a importância do líder como elemento moralizador, a vital necessidade das tropas estarem unidas e não dispersarem, a fragilidade dos flancos e a imprevisibilidade do comportamento dos elefantes e também de certas tribos barbaras que são incorporadas. Nesse aspecto a simulação parece-me muito bem conseguida e acho que é impossível fazer melhor. Só para verem até onde pode chegar o pormenor, a inexperiência dos generais envolvidos é tida em consideração, ficando para o efeito, o jogador, com mais ou menos cartas de jogo. Contudo, não se acobardem os mais justos, que existem batalhas realmente muito desequilibradas e portanto mal se monta o cenário já se sabe, em teoria, quem vai perder, mas relembro que o que interessa essencialmente é simular o que aconteceu no campo e não passar por cima da história para se ter cenários justos.
Existe contudo o elemento sorte. Há dados no meio e as contendas resolvem-se com um lançamento deles. Mas aí impera o cálculo das probabilidades. Se a infantaria resolve ir ao encontro da cavalaria, o mais certo é levar uma carga de porrada tal que para a próxima o jogador pensará duas vezes se valerá a pena repetir a graça. A infantaria, por exemplo, lança menos dados e movimenta-se mais devagar que a cavalaria. Existem vários tipos destas unidades e cada um desses tipos tem características diferentes tanto ao nível da movimentação como de poder de combate. A listagem é grande e é necessário consultar, pelo menos nos primeiros jogos as cabulas que a GMT gentilmente oferece para que as dúvidas sejam dissipadas rapidamente.
No calor da batalha é muito importante as unidades estarem unidas, especialmente em redor do seu líder. Isso torna-as menos vulneráveis aos ataques inimigos. O objectivo é manter um corpo coeso porque as vantagens são enormes tanto no ataque, como na defesa e também nas movimentações. Existem muitas cartas que activam o líder e todas a linha de homens que estiver unida. Isto permite que um jogador ao jogar uma carta deste tipo possa mexer mais peças, desferindo ataques mais mortíferos. Claro que conseguir fazer isso é difícil, porque no meio da confusão pode-se perder o controlo e com ele a formação. Os ataques pelos flancos conseguem resultar melhor, especialmente se forem desferidos pela cavalaria, mais ágil para estas ocasiões. Por outro lado algumas unidades podem retirar quando confrontadas com um ataque desproporcional do inimigo, evitando assim baixas importantes. O senão da opção é que recuam e poderão fugir da formação, tornando-se mais apetecíveis para ataques futuros. Mas mais vale uma unidade perdida do que morta. Até porque mais tarde pode ser possível voltar a inseri-la no corpo principal.
A ideia do jogo é esta, portanto todos os condimentos para uma recriação deste tipo estão presentes. As boas notícias não acabam aqui, porque existem no mercado mais experiências. O franchise já conta com algumas expansões como “Greece and Eastern Kingdoms”, “Rome and the Barbarians”, “Roman Civil Wars” e “Imperial Rome”. Portanto tem muito por onde se entreter caso goste deste período da história e tenha tempo para jogar. Por falar em tempo, tenho de me despachar porque está na hora de preparar o banho à sua alteza que tresanda a leite instantâneo que carinhosamente tem vindo a bolsar para o pescoço.


Refiro ainda, para que depois não diga que não o avisei, que as regras são relativamente fáceis de compreender, embora o livro de instruções seja considerável (mas tem muitos exemplos) e basta usar o bom senso e os conhecimentos militares para perceber o que possa estar mal compreendido. O único ponto desfavorável é que a caixa traz 250 blocos de madeira a que é preciso colar uns autocolantes minúsculos. É um trabalho árduo, não o vou negar e vai ser necessária muita, mas mesmo muita paciência. Pode contratar, em opção, um chinês para o trabalho que normalmente cobra 30 cêntimos pelo serviço mas arrisca-se a que o resultado não seja o que pretende.
Só para terminar, acho que este jogo deveria estar presente nas bibliotecas nas universidades, especialmente nas que têm faculdade de história. Como ex estudante de história, tive uma disciplina que se chamava história militar da antiguidade e parece-me que C&C:A dava um bom complemento às aulas e resultaria muito bem para explicar a organização das batalhas e como elas se processavam. Pelo menos não era tão enfadonho como os tradicionais slides em Powerpoint.

Classificação: *****

06 abril 2009

We're back!

Como é do conhecimento geral, o Hugo é, nada mais nada menos, do que a grande Matriarca deste blogue, fonte de toda a energia postadeira e inspiração para todos nós! Como também é do conhecimento geral, a Matriarca do blogue resolveu ser mãe (se não estavam a par, sugiro que façam scroll para o post abaixo e observem o Don Juan que aparece no meio do turbilhão de jogos: é o rebento do Hugo, por mais improvável que pareça) e isso retirou-lhe algum tempo de blogue.

Eu já lhe comuniquei que esta situação é inadmissível e que os nossos clientes merecem mais do que fotos de putos no meio de um turbilhão de jogos, por mais giros e sagazes que os putos pareçam.

Assim, consegui-lhe arrancar a promessa do reatar os posts num futuro próximo. Da minha parte, ocupadíssimo como estou a não ter filhos, vou tentar fazer o mesmo. Do Spirale, o contribuidor mais descaradamente inútil da história da blogosfera, nem vale a pena falar...

28 fevereiro 2009

O próximo jogo

Aqui está ele, o Gabriel.
Tem uma semana e manifesta já uma bela dose de aleatoriedade. Chora quando quer, dorme quando quer e come quando bem lhe apetece. É um bocado como rodar dois dados de seis faces.
Saiu-me um duplo seis.

Foto da Tatas

04 fevereiro 2009

Insecto publicitário

A história não tem qualquer interesse para o cidadão comum mas, para nós, homens e mulheres que gostam de passar algum tempo em frente ao tabuleiro, enche-nos a alma de alegria e, porque não admiti-lo, de enternecimento.
Descobriu o nosso querido Zorg numa das suas passagens pelo BGG que o actor Rich Sommer, desconhecido para muitos de nós, é um jogador de grande gabarito e tem, na sua casa, cerca de 200 jogos de tabuleiro. Atendendo aos padrões normais é uma colecção invejável pelo menos se a compararmos com a minha prateleira da sala de 20 títulos.
Ciente da sua condição de boardgamer e na ânsia de evangelizar o máximo de amigos e colegas possível, o nosso fiel artista decide numa manhã de sol, levar para o set de filmagens da excelente série onde é protagonista, Mad Men, um jogo bem querido de muitos de nós – Hive.
Os actores aderiram com entusiasmo ao desafio e, antes de entrarem em cena, não dispensavam uma partida deste xadrez com insectos. Ajudava a passar o tempo e sempre os afastava das drogas, álcool ou pior.
Seja como for, Rich Sommer, mostrou-se feliz com os resultados e a 1ª temporada da série ficou conhecida, por entre a malta do burgo, como a season Hive. No entanto, aproveitando o espírito da época onde a série se passa, anos 50/60, um dia levou o 1960 e o Twilight Struggle sendo a reacção também positiva.
Portanto meus amigos, aqui fica mais uma evidência. Lá em Hollywood, as celebridades não são muito diferentes das pessoas anónimas que conhecemos diariamente pelas ruas. Damos-lhes um jogo para as mãos e a experiência transforma-se em vício.
Assim é que é!

Podcast

Perfil do artista

A série

Imdb do homem

29 janeiro 2009

A nova onda

Bem, para muitos não é novidade nenhuma mas aqui fica para os mais distraídos a revelação da nova tendência de marketing por parte de algumas editoras para darem a conhecer os seus produtos.
A iniciativa ainda é recente, provem das americas como não poderia deixar de ser e parece-me que dentro em breve vai ser imitada pelas casas europeias.
Falo de vídeos de apresentação de jogos que, no caso, estão muito bem feitos e aguçam o apetite tanto de jogadores como de curiosos.
Deixo então aqui meia dúzia de exemplos, com legendagem em Português, agradecendo, para o efeito, a boa vontade do tradutor.

Starcraft

Tannhauser

Pandemic

Battlestar Galactica

Confrontation

Android

20 janeiro 2009

Le Havre: O som das gaivotas

Uwe é o homem do momento. Se houvessem revistas sobre Boardgames, em todas elas a fotografia deste designer alemão apareceria estampada na capa do mês de Dezembro. Seria um Uwe sorridente, despreocupado com o seu futuro e com a calma de quem finalmente conseguiu fazer algo de muito positivo pelo mundo e pelos seus habitantes.
Muitas das opiniões de 2007 tinham colocado Agricola no top dos melhores do ano. O jogo venceu todos os prémios a que tinha direito e merecidamente chegou ao topo do BGG ou seja, para todos os efeitos, assumiu-se como o melhor jogo de sempre, destronando de vez o mítico Puerto Rico. Relembre-se que Puerto Rico esteve 6 anos no poleiro e o efeito psicológico de ter sido destronado, relembra-me mais ou menos, na minha infância, a sensação de alívio que tive quando o single do Stevie Wonder “I Just Call to Say I love You” saiu do lugar cimeiro do Top Singles de Portugal.
Ora, face a esta evidência e mediante a notícia que o Sr. Uwe teria feito 4 jogos baseados em Caylus, os olhos do mundo estão postos agora em Le Havre, o segundo título da série. Logo nos primeiros comentários após Essen deu para perceber perfeitamente o que estava em jogo. Se Agrícola foi o melhor de 2007, Le Havre será o melhor de 2008. Um bocado como Coppola fez com os seus padrinhos.


Le Havre é um jogo muito semelhante a Agricola uma vez que não esconde e percebe-se bem, que a grande fonte de inspiração para o seu desenvolvimento foi o prestigiado Caylus. Não interessa aqui fazer uma listagem das diferenças. O que importa é dizer categoricamente para princípio de conversa e para dissipar todas as possíveis dúvidas que Le Havre é suficientemente diferente de Agricola para merecer a sua aquisição e fazer pensar aos fieis proprietários destes dois jogos qual deles é o melhor. A resposta não é de todo fácil e, tal como no futebol, as opiniões vão-se dividir. A defesa das mesmas tende a tornar-se mesmo bastante violenta no caso dos intervenientes possuírem um proeminente desamparo social.

A história de Le Havre não é nada fácil de contar. Somos uma espécie de negociante que se movimenta pelas ruas sujas e manhosas desta cidade costeira e que tenta conseguir o máximo de dinheiro possível nos seus negócios e investimentos. Mas a demanda pelo ouro tem como base e força motriz este porto francês que traz à sua população diariamente e sem interrupções, peixe fresco, animais, madeira, ferro, barro e cereais. São estas as matérias-primas com as quais os jogadores podem iniciar a dinamização dos seus investimentos e dar à população tudo o que ela precisa.
Com a aquisição destas matérias, os jogadores poderão ir comprando edifícios. Estes edifícios permitem não só obter algum dinheiro numa base de troca como também, e isso é muito importante, transformar as matérias-primas que diariamente chegam ao cais sujo e gorduroso de Le Havre em recursos mais valiosos.
Os jogadores na sua vez de jogar vão assim poder fazer uma de 2 coisas. Ou vão buscar uma quantidade variável de matéria-prima primária do tipo que enumerei ou utilizam um dos edifícios em jogo e aplicar a sua função (um deles permite construir mais edifícios). Estes fazem e sem querer adiantar muito, o que se espera que façam em jogos deste tipo. Transformam madeira em carvão, tijolo em barro, animais em bifes, peixe em peixe fumado, etc. Ou seja, a par de todas as matérias-primas iniciais, os jogadores a determinada altura vão transformá-las. Assim, e que isto sirva de aviso dos mais corajosos, o pobre do jogador vai ter mais activos para gerir do que alguma vez geriu em qualquer jogo de tabuleiro. Escusado será dizer que os recursos transformados vão ser necessários para construir edifícios mais poderosos e que valem mais pontos no final do jogo. No meio disto tudo, ou não estivéssemos nós num porto, as construções mais esperadas são os barcos. São difíceis de construir, até porque vai ser obrigatório a obtenção do recurso mais raro, mas é a partir deles que se consegue escoar os produtos. Assim, cabe ao jogador pegar nos seus recursos, sejam eles primários ou transformados e enviá-los via mar. Como está bom de adivinhar, os recursos transformados valem bem mais do que os que não o são.
No fim conta-se o dinheiro e os pontos dos edifícios.


Basicamente é esta a ideia do jogo. Outro dos aspectos importantes é que o jogador terá de alimentar a sua população e também obter a energia necessária para a transformação das matérias-primas de que escrevi há pouco. Madeira e carvão serão gastos na transformação, peixe, cereais e carne na alimentação. O ferro, o barro e a madeira servem para a construção dos edifícios. Todos estes afazeres vão dar cabo da mioleira do desgraçado do conviva e terá vários motivos de stress, principalmente nas primeiras partidas. Aconselho que cada um jogue com a intuição que Deus lhe deu e que não se preocupe muito com as consequências. Numa primeira fase é apenas aconselhável colher o máximo de informação possível para depois, já mais calmo no leito e antes que a esposa quebre o silêncio com o ronco, o jogador possa pensar o que é importante e o que não o é para melhorar a sua prestação nas jogatanas seguintes.

É muito difícil jogar a esta maravilha de Sr Uwe. Existem 130 coisas para fazer ao mesmo tempo e cada jogador na sua vez de jogar terá apenas uma acção. Situação que vai deixar muitos a gargalhar como as pessoas em que lhes é servida uma feijoada ao jantar no anúncio da Frize. Não esqueça o amigo leitor que estamos a falar de 15 recursos. Por outro lado a mecânica da quantidade de recursos de ronda para ronda ir aumentando, provoca uma tentação do jogador tão grande que acaba por ser decepcionante. Imaginemos que eu tinha pensado em pegar nas minhas vacas e transformá-las em bifes e pele curtida. Tudo bem, basta para o efeito ir ao porto pegar nas vacas disponíveis, ir ao matadouro deixar os animais e depois pagar a energia suficiente para as máquinas do matadouro trabalharem. Após todo triturado é só pegar nos bifes e nas peles e colocar na minha área de jogo. Num futuro poderei alimentar a população com os bifes e vender nos barcos a pele. Mesmo para o leitor que não jogou estará a pensar que a ideia lhe parece fazer bastante sentido. Pois, o problema é manter-se fiel ao plano. Imagine que quer ir buscar as vacas ao porto. Existem 4 vacas. Mas mesmo ao lado estão disponíveis 9 barros. Bem, se calhar o melhor é pegar já nos barros e logo se vê como vai ser com os animais. Quando o jogo der a volta, e se ninguém pegar nos animais, estarão lá 5. Mas, mesmo ao lado estão 10 moedas. O jogador fica indeciso e pega no dinheiro. Pergunta: Então e o plano de levar a vacaria para o matadouro? Lá se vai o plano. Esta tentação repete-se umas 30 vezes em 3 horas.


Apesar de todo o esclarecimento que demonstrei, a verdade é que apenas joguei uma vez. Por isso ao contrário da maioria dos jogos em que basta jogá-lo uma vez para lhe tirar a pinta, Le Havre assume-se como um brinquedo manhoso e de mau feitio. Desvenda-se aos poucos e existem sempre estratégias diferentes para explorar e colocar em prática. Nada parece certo e vai demorar algum tempo até que um jogador consiga conhecer o tabuleiro como a palma da mão. Le Havre está tão bem desenvolvido que até chateia. Nada é posto ao acaso, tudo está equilibrado e funciona na perfeição. A interacção entre os jogadores é bastante pequena, pelo menos nas primeiras jogas, onde o jogador estará mais preocupado em sobreviver do que em matar os outros. Mas não existe muita interacção. Claro que as escolhas dos adversários acabam sempre por influenciar as opções disponíveis. Se um palhaço for buscar as vacas eu não o poderei fazer. Mas como as opções são sempre tantas que nada parece influenciar muito, muito embora seja uma opinião que não posso fundamentar por ter jogado uma vez. Em comparação julgo que o Agricola tem mais interacção. Por outro lado Le Havre demora 180 minutos a ser resolvido numa primeira fase. Com a explicação das regras o tempo excede o razoável, mas acredite que valerá a pena porque há realmente muito por descobrir. Eu achei o tempo demasiado longo e custou-me um bocado, mas eram 2 da manhã e compreende-se que o cérebro e a clarividência não estejam nas suas melhores alturas. Seja como for convém avisar que Le Havre é muito pesado, bastante mais que Agrícola e vai exigir mais. No entanto quem gosta do Agrícola irá certamente ficar feliz com Le Havre. Se não gostou do Agricola parece-me que não terá melhor sorte com este. Se não tiver nem um nem outro, talvez a pele de agricultor lhe sirva melhor.
Uma coisa é certa, jogos destes há muito poucos. Se tiver de escolher entre Agrícola e Le Havre, acho que escolheria o Mercator, o 3º jogo da série a sair este ano.

Classificação: *****



13 janeiro 2009

Especial: One minute rules

Se lhe perguntarem um dia, por mero acaso, que habilidades consegue fazer num minuto, o caro leitor certamente dirá que nesse minúsculo espaço de tempo estrela facilmente um ovo, manda os mails de publicidade para o lixo electrónico, descasca um laranja sem cortar os dedos, vem aqui a este blog saber se o Zorg já se decidiu qual o melhor jogo de 2007 e, se for um jovem facilmente excitável, pode até conseguir ter uma relação sexual completa.
Mas a esta lista poderá juntar a partir de agora, caso leve a sério a opinião que se seguirá, o ensinamento de regras de alguns jogos de tabuleiro. Esta particularidade é bastante interessante e especialmente útil a todos aqueles que não têm paciência para ensinar regras e que se atrapalham facilmente na tarefa. Ao mesmo tempo, são perfeitos para testar novos jogadores e saber se na próxima oportunidade já pode pôr o Catan ou o Ticket na mesa. São a opção ideal para que os mais resistentes a uma experiência neste mundo possam confiar em si e se possam, essencialmente, divertir. Como são jogos de 30 minutos, mesmo que a experiência não corra bem, o que duvido, não se perderá nada.
Aqui fica uma lista muito incompleta do que pode encontrar no mercado de jogos que se explicam em um minuto e que demoram entre 20 e 45 minutos a serem jogados. Todos eles privilegiam bastante o factor divertimento e são ideais para introduzir novos jogadores. Ensinam-se como se ensina um banal jogo de cartas de baralho. E claro, são bastante melhores. Ah, alguns deles, principalmente os 4 iniciais, também podem ser jogados a dinheiro o que implica que, se é homem ou mulher de casino, pode aqui ter uma opção válida para as suas aventuras mudando de jogo e divertindo-se à grande. Até porque consta, pelas notícias chegadas a público recentemente, é uma carga de trabalhos conseguir que os casinos paguem os prémios que saem.

Diamant
de Alan R moon e Bruno Faidutti
De todos os exemplos que se seguem, Diamant é talvez o mais fraquinho. É um Push your Luck puro onde os jogadores que tiverem mais coragem conseguem ganhar tudo ou perder tudo. Na verdade não existe muita ciência. O papel dos jogadores é explorar uma mina. Cada secção da mina vai ser acrescentada no princípio do turno. Essa secção pode ser uma exploração bem conseguida ou um acidente. Se for uma exploração bem conseguida os jogadores dividem o valor da carta que sair. Exemplificando: Somos 5 jogadores. Sai uma carta de valor 14. Cada jogador ganha 2 diamantes e ficam 4 em stand by. Ora a seguir a este processo os 5 jogadores vão decidir secretamente se continuam em jogo ou se saem do mesmo. Se continuarem não lhes acontece nada. Se um jogador decidir sair, fica com os 2 diamantes da divisão mais os 4 que estavam em Stand By. Por outro lado se forem 2 jogadores a sair, cada um leva os 2 diamantes da divisão mais metade dos diamantes em Stand By, neste caso 2.
Para além das cartas de exploração bem conseguida, existem também as cartas de acidente. Existem seis acidentes diferentes e três cartas para cada um. Quando sai uma carta de acidente não há problema nenhum. O jogo continua normalmente. Quando sair o 2º acidente igual o jogo termina e todos os jogadores que ainda estiverem em jogo perdem tudo e ficam com zero diamantes.
Diamant é um jogo extremamente simples que beneficia quando jogado com um grupo grande. Tem a vantagem de poder ser jogado facilmente por crianças alfabetizadas e é um divertimento honesto. É uma experiência que tem muito de dois ditados populares: Quem não arrisca não petisca e Quem tudo quer tudo perde. A ideia é que quem demorar mais tempo a desistir terá mais diamantes nas explorações bem sucedidas porque as dividirá por menos gente. Voltando ao nosso exemplo acima, se a carta de 14 tivesse saído com apenas 2 jogadores, cada um ganhava instantaneamente 7 diamantes. O problema é que se saísse um 2º acidente nenhum deles ganhava nada.
Diamant é um jogo que se pode tornar aborrecido facilmente porque a sorte envolvida é grande e é tudo muito repetitivo. Mas as primeiras vezes são sempre muito divertidas e vai ouvir muitas gargalhadas, podendo assim verificar se os seus amigos ainda têm os dentes todos.
Classificação **

For Sale:
de Stefan Dorra
Só joguei uma vez e é um título que goza de excelentes críticas um pouco por todo o lado. É fácil de ensinar, fácil de jogar e há um leilão envolvido que ajuda a apimentar as coisas.
A ideia do jogo é a seguinte. Vão saindo várias cartas de valores diferentes que os jogadores vão leiloando. O problema é que numa rodada estão, para 4 jogadores, 4 cartas de valores diferentes a leilão. Os jogadores vão pondo dinheiro na mesa. O primeiro a passar paga metade da sua licitação e fica com a carta menos valiosa. E assim sucessivamente até ficar apenas um jogador em jogo. Este paga a totalidade da sua licitação e fica com a carta maior. Isto repete-se durante algumas rondas, até que as cartas saiam todas. Os valores variam entre 1 e 30. Acabadas as várias rondas de leilões, o jogador fica com um portfólio de cartas com valores diferentes. A seguir a esta fase os jogador pega no que tem e vai para o mercado. O que vai acontecer é que em todas as rodadas vão ser retirados aleatoriamente dum baralho 4 cheques de valores diferentes. Os jogadores, secretamente colocam uma das suas cartas ganhas no leilão com a face escondida. Depois de reveladas as cartas, a que for mais alta fica com o cheque mais valioso e assim por diante até que o cheque menos valioso vá para a mão do jogador que jogou a carta mais baixa. Isto repete-se por várias rondas até não sobrarem cheques e cartas nas mãos dos intervenientes. No fim somam-se os cheques.
É um jogo divertido, melhor que o diamant e com um prazo de validade também maior. Mais uma vez toda a gente joga e se diverte. O problema é que se torna chato e a felicidade inicial vai-se esmorecendo, porque as opções são poucos e tanto a parte do leilão como a do mercado não resultam bem.
Classificação: **

Félix: The Cat in the Sack
de Friedemann Friese
Agora é que as coisas começam a aquecer.
Félix the Cat é um Poker sabichão onde o enganar o próximo é o prato principal. Há bluff por todo o lado e há uma tensão crescente. Não há nada melhor para um grupo que se diverte à custa dos outros. Diz-se mesmo que, em alguns bairros de Kiev, a máfia russa se diverte à fartasana com este joguinho.
Cada jogador tem 8 cartas em mão que são iguais para todos. Estas cartas vão de valores mais elevados a valores negativos. Cada jogador no início de cada turno coloca uma carta virada para baixo. Começam as apostas e vão se virando as cartas à medida que os jogadores vão desistindo. Aposta-se para ver tal como no Poker. A curiosidade de cada um faz aumentar a parada. Quem conseguir aguentar até ao fim ganha o valor das cartas colocadas em cima da mesa. O resultado pode ser muito bom ou muito mau ou assim assim. Há muito bluff, como já disse, mas essencialmente os jogadores podem sempre controlando as cartas que vão saindo e tentar adivinhar o que pode ter sido posto na mesa. O que acontece normalmente é que alguns jogadores sabem mais ou menos o valor do que está na mesa e outros não fazem a mínima ideia. Mas como qualquer jogo de bluff que se preze, os mais informados vão subindo a parada. Os outros acompanham. O que sucede na maioria das vezes é que o subir da parada nem sempre está em consonância com o real valor da mão, havendo depois da resolução gritos de raiva e olhares desconcertantes. Paralelamente um jogador pode fazer subir a parada com o intuito de enganar os outros e estes, fugindo do plano inicial, passam todos, ficando o espertinho com uma mão fraca e com o seu dinheiro diminuído. Félix: The cat in the Sack não tem pretensões nenhumas a não ser tentar imitar as sensações do Poker. Consegue ser mais divertido e mais ritmado. Aconselho vivamente a todos aqueles que gostam do jogo americano e que por uma razão ou por outra o deixaram de jogar por envolver dinheiro e por não encontrarem ninguém disposto a apostar umas massas.
Classificação: ****

Turn the Tide
de Stefan Dorra
Enchi-me de amores por este Turn The Tide.
Faz lembrar bastante o clássico copas que me fartei de jogar nos meus tempos de secundário e que foi imortalizado pelo Windows. Existe um baralho de cartas que vai de 1 ao 50. Estas cartas são divididas pelos jogadores. A ideia é os jogadores irem colocando as cartas na mesa afim de evitar as cartas de maré que penalizam em um ponto o tipo que as apanhar. As cartas menores do baralho servem para fugir e as cartas maiores para ficar com a carta de maré melhor que evita a penalização. A partir daqui é uma questão de gerir o jogo que lhe calhar. Um aspecto interessante é que os jogadores vão trocando de mãos. Ou seja, todos vão jogar com as mãos de todos, tipo os campeonatos de bridge. Depois é uma questão de saber quem se sai melhor com as mãos dos parceiros. Turn the Tide apresenta, ao contrário dos anteriores exemplos, a vantagem de se poder evoluir enquanto jogador. Pode-se aprender algumas manhas, controlar as cartas altas que saíram e as baixas para assim maximizar a prestação. De todos é talvez o meu preferido.
Classificação: ****

Genial
de Reiner Knizia
Genial ou Ingenius deve ser o Knizia mais fácil de ensinar e que menos dúvidas suscita para quem aprende. Tudo limpinho. Cada vez que tenho o prazer de o jogar vem-me à memória o Puzzle Bubble onde o objectivo é juntar bolas das mesmas cores para elas saírem do mapa. A ideia aqui é juntar cores para se ganhar pontos. Existem 6 cores diferentes e os jogadores vão colocando as suas peças no tabuleiro. Cada vez que as peças com uma cor se juntam às peças dessa cor no tabuleiro, o jogador pontua. Se existirem, por exemplo, 3 vermelhos e o jogador juntar um 4 vermelho, ganha 3 pontos. Se o próximo jogador juntar um vermelho, ganha 3 mais 1 do vermelho do jogador anterior, somando deste modo 4 pontitos. Tudo gira à volta disto, mas os jogadores vão sempre, se forem espertos, fechando as possibilidades de pontuação dos outros. No entanto, o pormenor mais importante de todos, para o resultado final, o que conta é a pontuação que o jogador conseguir na sua pior cor. De nada vale ter 700 pontos no amarelo se tiver 2 no azul. Neste caso específico, a pontuação final seria uns míseros 2 pontos.
O grande atractivo deste Genial, é que não se percebe muito bem até onde a sorte dita o resultado ou a escolha acertada de peças que se vão metendo no tabuleiro. Diz-me a experiência que um jogador sensato nas suas escolhas tem mais possibilidades de vitória. A discussão entre sorte e sensatez tem sido calorosa nos fóruns habituais. A propósito, a ultima opinião que li sobre o assunto foi bastante esclarecedora sobre o valor deste jogo. Dizia um querido americano que se sentia ofendido porque tinha jogado 160 vezes a Genial, mas que tinha percebido que afinal é a sorte que dita as leis, uma vez que com 160 jogos deveria ganhar a maior parte dos jogos o que, na verdade, não lhe acontecia.
O jogo no mercado tem o triplo do preço das opções anteriores, mas também tem a vantagem de poder ser jogado a 2 como a 3 ou 4 sem nunca perder a beleza. A 2 torna-se mais cerebral.
Classificação: ****

Great Wall Of China
de Reiner Knizia
Ao contrário dos outros, este Great Wall of China não se consegue ensinar em um minuto. Aviso já para depois não virem para aqui refilar com este escriba. Vai precisar de 3 minutos porque vai haver alguém que não percebe. Mas depois da primeira ronda fica tudo entendido. Great Wall é um jogo de cartas que pega no sistema de leilão do Taj Mahal. Os jogadores vão construindo com cartas secções desta muralha que pode ser vista do espaço. As secções têm valores diferentes. Os jogadores vão gastando as suas cartas para espalharem influência pelas secções. As cartas são um recurso escasso e se o jogador gastar muito desse recurso numa determinada secção, terá menos hipóteses de ganhar pontos nas secções posteriores. Muito interessante. Existem cartas de valor 1,2 e uma carta de 3. Por outro lado algumas cartas tem poderes especiais. Umas anulam as cartas já jogadas por outros jogadores e outras podem reduzir os valores postos na mesa. O jogador vai ter de pensar muito e vai ficar muitas vezes na dúvida sobre o melhor sítio onde gastar recursos. É um jogo rápido e cheio de artimanhas. Mas no fim vai sentir um sabor agradável na alma. Além disso não se esgota e vai ser sempre uma opção válida para por na mesa. Joga-se muito bem a 3.
Classificação: ***

Fica pois aqui uma selecção pequena mas honrada, de títulos de aprendizagem rápida que poderão fazer as delícias de amigos e familiares. A estes se poderiam juntar também street soccer e Wings of War. A razão porque não os juntei foi por se terem feito críticas aos mesmos em outra parte deste blog. As críticas são excelentes, diga-se.

05 janeiro 2009

Ghost Stories: os eurocooperativos

Um gajo passa por várias fases, quando entra neste mundo dos jogos. No início, logo após ter jogado o primeiro "jogo de estratégia" em que, de facto, é necessária alguma estratégia para ganhar - a fase a que os peritos chamam "tesão do mijo" - um gajo só quer é jogos pesados e mete, o que eu chamo, as palas da complexidade: "eu sou um gamer, meu amigo! Gosto é de jogos com baixo factor sorte, muita complexidade e que dure pelo menos 6 horas! O ideal para mim seria uma mistura de Die Macher com Age of Steam e uns pozinhos de Caylus, que é para ficar mais complexo! Não quero cá trivial pursuits, nem pictionaries"!

Depois, um gajo começa a perceber que há jogos que são giros de jogar, demoram muito menos tempo do que todos Die Machers deste mundo, e onde o pessoal todo, mesmo o que gosta do Trivial e do Pictionary, se consegue divertir à grande. É aí que um gajo tira as palas da complexidade e olha à sua volta para descobrir, maravilhado, que é precisamente esse o mercado que as editoras de "eurogames" pretendem atingir e que, por isso, a oferta é imensa, original e diversificada. É nesta fase que se descobre que há toneladas de jogos de média complexidade interessantes, que há milhares de jogos de cartas da classe "20 segundos para explicar as regras, 20 minutos para jogar o jogo" que são um verdadeiro regalo com o grupo certo e que até há jogos em que toda a gente ganha, ou toda a gente perde, os jogos cooperativos.

E é de um destes cooperativos que vos venho falar hoje, mas antes, um pouco de história!

Durante muitos anos, a grande referência dos cooperativos foi o Lord of the Rings, da autoria do grande mestre Knizia. Mais tarde, começaram a aparecer alternativas, como o Shadows over Camelot (que introduziu a ideia de haver um traidor disfarçado no grupo, que podia ganhar o jogo sozinho sabotando as acções dos outros), ou o Arkham Horror, passado no universo de H.P. Lovecraft. Todas estes jogos eram ricos em tema, demoravam 2.30h, ou mais, e todos tinham a sua legião de fãs.

Recentemente, uma nova tendência surgiu: a dos jogos cooperativos rápidos (1h, ou menos) assentes em mecanismos inteligentes e inspirados. No fundo é como se os cooperativos, depois de uma fase mais visceral e ligada ao tema, se tivessem "euroízado". O percurssor destes novos "eurocooperativos", foi o Pandemic, um inacreditável caso de sucesso comercial da Z-Man. Este ano foram lançados 2 novos jogos nesta linha: o Red November, do incontornável e caótico Bruno Faidutti, e o jogo de que vos vou falar, o Ghost Stories, do quase estreante Antoine Bauza.



O tema

Alguém já viu filmes de kung-fu antigos?

A história podia ser tirada de um: o malvado feiticeiro Wu-Feng quinou mas, infelizmente, isso não significa que tenha deixado de ser um problema para toda a humanidade! Não, do além, o gajo mandou uma data de servos infernais - criaturas horripilantes, assustadoras e, de uma forma geral, pouco simpáticas - para tentar recuperar a urna onde estão as suas cinzas e que repousa numa tranquila aldeia, algures na China. Se o conseguir fazer, a humanidade está tramada, porque o sacana quer transformar o nosso planeta numa espécie de campo de férias para mortos-vivos, zombies, vampiros, e toda a espécie de malandragem do além, especialmente aquela que gosta de se alimentar de nós. Os jogadores representam os monges taoístas que têm a difícil tarefa de mandar de volta para o além as dezenas de servidores que o Wu-Feng vai enviando para atormentar a aldeia, sobrevivendo o tempo suficiente para derrotar o manda-chuva em pessoa - que se digna fazer uma aparição, quando vê que as coisas não lhe estão a correr bem - garantindo o triunfo da liberdade, da democracia, dos direitos humanos e do aquecimento global.

Claro que a pergunta que todos vocês estão a fazer neste momento é: "monges taoístas? Como é que é suposto monges derrotarem fantasmas... rezando com muita força"?

Mas por isso é que eu perguntei se já tinham visto filmes de kung-fu! Qualquer pessoa que já tenha visto um sabe que os monges taoístas não se limitam a andar vestidos com lençóis coloridos, a rezar pelos cantos do templo! Não, isto é gente danada para a porrada, treinada nas várias artes do massacre e que não tem medo de espetar a tromba de um fantasma na ombreira de uma porta, ou de partir os caninos a um vampiro com uma cabeçada à cais do sodré (que, como toda a gente sabe, é com a nuca)! Este é o tipo de monges que tu queres ter do teu lado numa rixa de bar, numa luta de gangues, ou num confronto de claques!

Para além dos monges, a próprio povo da aldeia também sabe uns truques que vão poder ser usados pelos monges taoístas na sua difícil missão. E é uma aldeia bem freakazóide: tem monges budistas, estes sim, nada dados ao combate, mas disponíveis para oferecer estátuas do Buda que fazem mal à saúde dos fantasmas ; tem umas moças sobre cuja profissão eu não me vou debruçar, mas que permitem aos corajosos taoístas recuperarem forças para o combate e até ganhar uns acessórios que tornam mais fácil a exorcização da bicheza do além ; há um cemitério, onde se enterram os mortos (duh) e onde se pode ir ressuscitar algum taoísta que tenha sido apanhado distraído e tenha sido morto à traição ; há uma feiticeira que exorciza, ela própria, um fantasma à escolha, mas leva um ponto de vida em troca, porque, como toda a gente sabe, as feiticeiras não são de confiar... enfim, há muito por onde escolher em termos de auxílio aos taoístas.



A aldeia é construída com a partir de 9 tiles dispostas em quadrado aleatoriamente. Em cada face do quadrado colocam-se 4 tabuleiros com capacidade para receber 3 fantasmas cada um, de forma a que cada fantasma fique em frente a uma fila de 3 tiles da aldeia. Na sua jogada, um taoísta move-se uma casa e depois opta por pedir auxílio ao aldeão da casa onde se encontra ou, em alternativa, pode exorcizar o fantasma que estiver à sua frente, se houver algum.



A exorcização é feita através do lançamento de dados de faces coloridas a que se podem somar os efeitos de alguns aldeões, ou a utilização de uns tokens coloridos, chamados Tao tokens. Há sorte envolvida, naturalmente, embora se possa definir com bastante precisão o nível de risco que se quer correr em cada tentativa de exorcização.



Cada um dos 4 personagens também tem um poder especial, que é escolhido aleatoriamente antes do jogo começar, para maior variabilidade. Há um taoísta que voa, outro que lança mais um dado quando está a exorcizar, outro que tira Tao tokens à borla, etc.

O feeling

Este Ghost Stories caiu-me no goto! Nunca pensei gostar de um jogo cooperativo, porque a ideia de jogar cooperativamente sempre me pareceu... como dizê-lo? Parva! No entanto, tanto este como o Pandemic me levaram a concluir, como habitualmente, que o parvo sou eu! O jogo é como um puzzle, em que a situação se vai alterando a cada jogada. O que é giro neste Ghost Stories - e nisso, acho que o prefiro ao Pandemic - é que o puzzle não tem uma só solução e há um grande leque de ferramentas disponíveis para o resolver. É por isso fácil e normal estar toda a gente envolvida e a sugerir formas de resolver a crise que se vai instalando, jogada após jogada.

Este Ghost Stories é também um jogo bastante difícil! Eu só consegui ganhar no nível introdutório ao fim de 5 jogos e só ganhei no normal ao 8º jogo (joguei 11, até agora)... e ainda há 2 níveis de dificuldade acima de normal! Mas é também muito compensador, porque se sente na pele o progresso! Um gajo nota que está a aprender e a melhorar a coordenação e a eficiência da equipa, de jogo para jogo. Não há informação escondida, o que - contrariamente ao que eu esperava inicialmente - também contribui para que toda a gente esteja em volta da mesa a analisar a situação e a dar sugestões para a resolução dos problemas.

Um jogo deste Ghost Stories bem jogado é uma sucessão de planos a 2,3 ou 4 jogadas, envolvendo vários intérpretes, intercalados com soluções de emergência, para apagar um fogo urgente. É um jogo incrivelmente tenso, com a pressão a subir rapidamente jogada após jogada, à medida que os fantasmas vão entrando, até se chegar ao clímax final, com a chegada do Wu-Feng em pessoa. Gosto imenso deste arco, que consegue dar alguma história a cada jogo. Os dados fornecem aquela dose extra de frustração, quando a coisa corre mal, mas também aquele saborzinho extra, quando corre bem! Os momentos de lançamento de dados são normalmente momentos de silêncio absoluto e atento, seguidos de suspiros de alívio e gritos de alegria, ou de imprecações furiosas e esgares de dor, consoante o resultado do lançamento.

Os componentes são muito bons e bonitos, com o toque de classe a ser dado pelas estatuetas dos Budas e dos fantasmas voadores (parecidos com os infames Dementors do Harry Potter).



Muito recomendável, sem sombra de dúvida!