04 junho 2007

Session Report: Indonésia e a queda do homem macho

O dia estava soalheiro e quente, um calor agradável que convidava a um banho no Oceano ou a uma tarde numa esplanada.
Por entre as filas de trânsito junto às praias conseguia-se desfrutar, aqui e acolá, mini saias generosas que mostravam mais do que um homem poderia pedir quando acompanhado da família. Mediante tamanha oferta, o usufruto visual que, ao princípio, era tímido e simulado tornava-se, aos poucos, mais confiante e displicente. Mas a vida é feita, como todos sabemos, de acontecimentos estranhos e já é normal estar no sítio certo à hora certa e com as pessoas erradas.
- Tás a olhar para onde? Andas a olhar para as mulheres agora, é? Tem vergonha!

O telefone tocou. Mais um convite para uma jogatana. A tarde de Domingo trazia consigo tempo para desfrutar dum jogo mais pesado, mais à imagem de todos. Afinal quantas tardes se podem passar entre homens, a jogar Pro Evolution e a fazer um joguinho de tabuleiro de queimar os neurónios todos? Além disso encontrava-se a liberdade necessária para dizer asneiras a rodos e arrotar quando houvesse vontade para isso.
O Zorg anuncia:
- Jogamos Indonésia porque já li as regras. Não há problema!
Indonésia foi a escolha. Jogo caro e tido em consideração pelos geeks com opiniões mais acertadas no mundo da net. A caixa era bonita, o tabuleiro todo pimpão e o livro de regras a parecer um edição de luxo do mundo da Banda Desenhada.
O Shahim chega com 2 horas de atraso e a tarde esgotou-se na espera. Mas nem isso abalou a confiança de todos. Afinal de contas, o jogo tem fama e a caixa é bonita e convidativa à joga. Mas Deus lá tirou o dia para transformar a tarde de Domingo num inferno:
- Afinal não sei as regras, por isso temos de aprender enquanto jogamos. Duas horas devem chegar para ler isto e perceber a mecânica do jogo. Com sorte devemos começar pela hora do jantar.

Enquanto, desiludidos, mostrávamos sinais de cansaço e alguns elementos abriam mesmo a boca em sinal de impaciência, as regras lá foram aos poucos explicadas com uma voz monocórdica que evocava as belas imagens do Chico Escuro e João Pestana a deitarem-se na cama na hora da despedida.
Despertados pela hipótese de jogar 3 horas depois da hora combinada, já o sol se começava a esconder no horizonte, o jogo começou. Felizmente o jogo deu logo mostras de ser mais um colosso da Splotter Spellen. E foi o que salvou a tarde. Mas o sossego durou pouco, os telefones começaram desesperados a tocar.
- Oh querida, não sei quando vou acabar isto. Não sei se posso jantar contigo. Oh querida não fiques furiosa! Tens razão, mas não esperava este atraso... Não fiques assim... Depois falamos.

O jogo finalmente começara a ser percebido e todos os jogados já estavam embrulhados na compra e venda de companhias e na distribuição de arroz pelos mares da Indonésia. Dinheiro para a frente e para trás, a rodar de mãos e o tabuleiro a ficar composto.
- O que ia bem era uma cervejola. Tragam aí as cervejas.
Como se fosse pouco o que tivera acontecido até ao momento, Zorg, ainda combalido do incidente de ter entornado um copo de vinho para cima do tabuleiro do Twilight Struggle, impôs logo ordens de precaução.
- Aqui ninguém, bebe cerveja. Se quiserem bebem um copo de água façam-no na cozinha. Ao pé do tabuleiro ninguém bebe nada!
A revolta foi grande, o desânimo ainda maior. Ficaram-me no pensamento as últimas palavras que dissera à minha namorada antes de sair de casa:
- Vai ser uma tarde porreira. Somos só gajos e vai ser fixe. Já tinha saudades de ter uma tarde assim. Mas não te preocupes porque chego cedo!

Mesmo assim, Indonésia aguentou-se. Apesar de tudo conseguiu abstrair dos jogadores a dura realidade. Aos poucos já ninguém se importava com a lei seca nem com a tarde perdida a ler regras e a esperar pelos mais atrasados. A hipótese de ter problemas com a hora tardia a que se viria a chegar a casa também não causava grande transtorno. Afinal macho é macho e faz o que quer.
Compraram-se companhias daqui, companhias dali, fizeram-se fusões consoante os interesses económicos, plantou-se arroz numa ilha para se transportar para outra, abriram-se poços de petróleo e leiloou-se tudo ao melhor preço. Fizeram-se fortunas com um piscar de olhos. Indonésia é tudo o que um macho quer e muito mais.
O jogo lá acabou. Tarde, ou seja 7 horas depois da hora combinada para começar. A fome, claro, apertou mas a noite ainda era uma criança. A parte mais difícil ainda estava para vir:
- Isto é que são horas de chegar? Saíste daqui ás 3 horas da tarde e voltas às onze? Achas isso bem? Diz adeus aos jogos ao Domingo. Estive à tua espera para jantar desde as oito. Se quiseres agora comer faz tu o Jantar. Não tens vergonha nenhuma!
Mas nem tudo foi mau, afinal o Indonésia é um jogão e Deus, depois do dia todo a sofrer, lá me deu uma abébia:
- Vá lá, pelo menos não estás a cheirar a cerveja!

11 comentários:

Unknown disse...

mais uma vez um excelente artigo, e escrito com um humor que só vocês conseguem. Não me canso de ler as vossas críticas. Parabéns.

Já tinha visto o filme do Scott sobre este jogo e despertou-me mesmo a curiosidade, pois sou fan de jogos pesados. O único problema que me pareceu é que no final do jogo e pela quantidade e dimensões das peças, o tabuleiro pode tornar-se caótico e de difícil visualização. é verdade?

Estou mesmo desejando joga-lo, mas é difícil de encontrar.

Hugo Carvalho disse...

O tabuleiro em si não é muito esclarecedor. Claro que te vais habituando, mas é dificil perceber aonde acabam umas regiões e começam outras. Mas depois de uma hora consegues perceber.
Aquilo tem muita pecinha. Mas não acho que dificulte a visualização do que se passa. O que chateia é estares sempre a virar as peças que são pequenas e escapam dos deods com facilidade.
Mas o problema do jogo é mais o preço. 70 euros para os amigos!

soledade disse...

Eu adorei o Indonesia. Acho um jogo fantástico. Aquela Splotter faz-nos destas coisas e depois as mulheres é que pagam.

Para já o jogo é lindo, sobretudo o tabuleiro. É difícil interpretar mas, passado um bocado, já se chega lá também com um bocadinho de bom senso. Depois vem a jogabilidade. Impressionante como um jogo de 4 horas pode parecer durar tão pouco. Economia pura, a lei do mais esperto impera. Porque não há nada aleatório. As diferentes estratégias para se vencer ainda são mais estimulantes porque, se de um lado, a estratégia pode ser escolhida, por outro, um autista que não repare no jogo dos adversários é, facilmente, arredado do jogo. Ou seja, tem estratégia e táctica combinadas de forma superior.

Este está no meu top, acho um jogo do catano, provavelmente o melhor de 2005 que joguei, e tende a melhorar com a repetição.

Unknown disse...

Estão a deixar-me muito curioso, não se arranja mais um lugar no grupo para mais uma jogatana? :)

zorg disse...

Está giro o session report. :)

Posso dizer em minha defesa que o incidente com o twilight struggle não foi a única razão para esta espécie de lei seca. A realidade é que também não havia cerveja e o atraso de 2 horas do shahin inviabilizou qualquer eventual expedição aquisidora...

Bruno Valério disse...

Já estava a imaginar o porquê da falta de actualização do blog.

Indonésia é mesmo para homens... e de barba rija... só não percebi o que o Zorg andava por lá a fazer :D

Ah ok foi ele que comprou o jogo... vá serve de desculpa.

Afinal de contas quem ganhou ?

zorg disse...

Ganhou o pato! Usou os seus conhecimentos superiores de economia para nos enganar! É um intruja! :)

Anónimo disse...

Só quero dizer que ainda estou vivo...

Anónimo disse...

O comentário acima é meu!

Obelix

Anónimo disse...

Não vais continuar vivo se fizeres outra destas.

(Mulher do Obelix!)

Anónimo disse...

Não há como escapar destas confusões.
Teve um dia que combinamos 6hs da tarde e só fomos começar a jogar lá pelas 11hs da noite devido a inúmeros atrasos, daí um tinha que levar o carro não sei aonde, o outro tinha que levar a namorada em casa 10hs e assim foi indo.
Não tem jeito. Quando marcar uma jogatina não se pode marcar nenhum compromisso pra depois pois é certo que não conseguirás cumprir.

Abraços do Brasil