04 dezembro 2008

A colheita de Essen

Quais dos jogos de Essen deste ano é que já foram jogados pelo povo superior do JogosDeTabuleiro?

Aposto que essa é a pergunta que invadiu a vossa mente e vos atormenta diariamente, em todas as horas e todos os minutos, que vos provoca pesadelos e vos faz acordar aos gritos, com o suor a escorrer pela cara, a meio da noite! Aposto que essa é a pergunta que, pouco a pouco, vos está a levar à loucura!

Ou então, não!

Mas, seja como for, essa é a pergunta a que eu quero responder com este post.

Os jogos de Essen que fazem parte da minha colecção e/ou das dos criminosos com quem eu costumo jogar são: Powerboats, Space Alert, Confucius, Le Havre, Pandemic, Ghost Stories, Mecanisburgo, Race for the Galaxy: the gathering storm, Leader 1... e creio que é tudo. Destes, jogámos até agora: Space Alert, Powerboats, Confucius, Race for the Galaxy: the gathering storm e Leader 1. Eu joguei um jogo incompleto e solitário de Le Havre, para aprender as regras, mas isso não conta.

Powerboats

Se fizerem um ligeiro scroll para baixo, serão confrontados com uma das piores reviews jamais escritas sobre algum jogo, no período que vai do paleolítico superior ao dia de ontem (que foi quando comecei a escrever a review do Space Alert). No entanto, é uma review sobre este jogo em particular e que resume, de uma forma trapalhona e, a espaços, ridícula, a minha opinião sobre o jogo. Por isso recomendo a sua leitura, nem que seja só para terem mais um argumento para gozar comigo, no caso, altamente improvável, de vos faltar um argumento para gozar comigo. Mas, resumindo a minha opinião sobre o jogo: é rápido, é fácil de explicar, é emocionante, é o meu novo jogo de corridas favorito e, apesar disso, é o jogo de corridas que mais gosto de jogar.

Space Alert

Está a caminho a pior review de sempre (comecei ontem e já escrevi o título), mas posso adiantar que este jogo foi o prato principal de uma das melhores sessões de jogo do período que vai do paleolítico superior até hoje (vamos jogar hoje e eu sou um gajo optimista por natureza)! Jogámos 3 vezes seguidas e jogaríamos mais! Mas, devido ao adiantado da hora quando terminámos o terceiro jogo, optámos por jogar antes Powerboats até às 3 da manhã. E isto num dia de semana! Não vou dar muitos detalhes, para não tirar potência ao verdadeiro murro no estômago - daqueles de fazer caír para trás e ficar no chão agarrado à barriga com convulsões - que eu espero que a review seja, mas posso dizer que este jogo é uma bomba Antónia! É caótico de uma forma positiva, é tenso, de uma forma tensa, por causa da pressão do tempo, é brutalmente temático, por causa do tema, e é extremamente rápido porque uma missão não dura mais de 25 minutos, embora os 10 passados em tempo real, pareçam 2 horas. Uma sessão de Space Alert é uma sessão de gritaria, stress e tentativas patéticas de coordenação, mais ou menos condenadas ao fracasso. É um jogo-experiência e é diferente de tudo o que joguei até hoje. Gostei tanto deste Space Alert que posso revelar que, depois deste e do Through the Ages, estou pronto para me casar com o Vlaada Chvatil, se ele algum dia pedir a minha mão!

Confucius

Este está num campeonato diferente dos anteriores. É um jogo complexo e interessante, mas com aqueles pormenores temáticos a la Wallace no topo da sua forma. Há muitas opções, há muito planeamento a fazer, um pouquinho de sorte... e o mecanismo dos presentes é extraordinário! É um jogo rijo e complicado de dominar, na melhor tradição de coisas como o Struggle of Empires, que é sempre o título que me vem à cabeça quando penso neste Confucius. Dura 2 horas e picos, tem negociação, interacção, conflito, estratégia, tema... é daqueles jogos que faz crescer a barba e faz um gajo arrotar, quando o joga! Muito bom!

Race for the Galaxy: the gathering storm

Quando se joga um jogo quase 100 vezes, isso quer dizer alguma coisa. Normalmente quer dizer que o se é doente e, provavelmente, se tem demasiado tempo livre, por falta de competências sociais que permitam, entre outras coisas, engatar gajas. Outras vezes quer dizer que o jogo é a puta da loucura, como costuma dizer o pároco da minha igreja. E, do alto dos meus quase 100 jogos de Race, posso afirmar peremptoriamente que, de facto, o sexo feminino permanece um mistério insondável para mim. Para além disso, também posso dizer que, no jogo base, as estratégias de produce/consume são um pouco beneficiadas em relação ao resto. Esta expansão resolve admiravelmente a segunda questão embora, lamentavelmente, não faça qualquer contributo para resolver a primeira. Talvez a próxima expansão inclua um "Guia de conversação para encantar senhoras"?

Leader 1

É injusto talvez referir o Leader 1 nesta lista, porque só o jogámos uma vez e, mesmo aí, com apenas 2 jogadores. Seja como for, gostei muito do que vi! Este é o jogo ideal para os cromos da volta à França! Aqueles mariquinhas que gostam de ver homens que rapam os pêlos das pernas, vestidos de licra e suados, montados em bicicletas e a dar ao pedal durante horas! Se pertences a essa estirpe, então veste a tua melhor roupa de licra, monta-te na tua bicicleta e pedala à velocidade máxima para comprar este jogo, porque isto é a simulação perfeita do ciclismo! Se, por outro lado, jogas na equipa dos machos, pelo que preferes ver os jogos de voleibol feminino e não sentes nenhum tipo de entusiasmo quando vês um homem de roupa justa, então vai comprar este jogo na mesma, porque para além de uma excelente simulação, é um excelente jogo de corridas!

26 novembro 2008

Powerboats: maldito sábio holandês!

Introdução

Sempre gostei de jogos de corridas, apesar de, até hoje, só ter jogado um verdadeiramente bom! Não sei se é do cheiro dos escapes, do barulho dos motores, ou dos bikinis das mulas semi-nuas que, habitualmente, fazem qualquer coisa não identificada junto à pista antes da prova começar, mas o facto é que desde sempre me senti fascinado por este universo.

Foi por isso que comprei o Formula Dè Mini que, apesar do sistema giro de usar os dados, sempre me pareceu que não era bem aquilo que se pretendia. Andei a namorar o Bólide, mas descobri que demorava muito tempo. Cheguei a ter o Ave Caesar no shopping basket e a caçar o Daytona 500 no ebay, mas também acabei por adiar sempre, por achar que não eram bem, bem o que procurava.

Quando joguei pela primeira vez o Um Reifenbreite, ou Zong Binguetrumf, como o Hugo carinhosamente lhe chama, pensei para mim mesmo: "Aqui está a mãe de todos os jogos de corridas! Já não dá para melhorar isto e podes parar de procurar porque isto, meu amigo, é o melhor que existe".

Até que, quando vagueava sem destino ou companhia pelo BGG, ouvi falar no Powerboats.

"Hmmm", pensei, "o Corné Von Moorsel não costuma fazer maus jogos"... e decidi ir ver o que era.

"Olha, olha, afinal também dá para jogar online... deixa-me cá experimentar..."

E foi a morte do artista!

De facto, o Corné não falhou e, após 2 ou 3 jogos no site, o Powerboats já repousava no meu shopping cart e eu carregava no botão "Proceed to checkout" com sofreguidão e impaciência.

Três dias depois, 4 homens adultos, alguns deles barbudos e mal encarados...quem é que eu estou a tentar enganar? Todos eles barbudos e mal encarados, lançavam dados e davam guinchinhos ridículos, mais próprios de menininhas de 10 anos, enquanto tentavam conduzir os seus barquinhos coloridos pelo emaranhado de ilhas e atóis o mais depressa possível, até à vitória final. Qualquer jogo capaz de fazer um homem de barba rija guinchar como uma menina, merece o meu respeito e admiração!

O jogo

O Corné Von Moorsel é um gajo que deve estar num equilíbrio perfeito com o cosmos, sabe de certeza artes marciais a ponto de partir tijolos com a tromba e só faz jogos para que nós, comuns mortais oprimidos pelo peso dos nossos prazeres terrenos, consigamos abandonar o vício e atingir mais facilmente o Nirvana. As regras são sempre tão simples que até metem nojo e, quando as ouvimos, temos tendência a pensar que o jogo é demasiado simples para os nossos skills avançados de gamers de elite. Pelo menos, foi isso que eu pensei na primeira vez que joguei StreetSoccer, a minha iniciação a este mundo zen, criado pelo sábio holandês.

Depois, começamos a jogar o jogo e percebemos que é divertido. Jogamos mais algumas vezes e pensamos que afinal até há ali mais qualquer coisa que não tínhamos antecipado inicialmente e que torna o jogo mais interessante. Vamos ao site fazer um joguito, desafiamos um dos jogadores mais bem cotados e levamos uma tareia e pensamos "bom, o gajo teve sorte desta vez. Vamos lá tentar outra vez"... e a tareia repete-se!

De repente estamos envolvidos em 10 jogos ao mesmo tempo e a perceber da forma mais difícil, como é tão mais fácil levar uma tareia de um dos jogadores de topo, do que conseguir aplicar-lhes uma a eles. E aí ouvimos a voz de Corné Von Moorsel ressoar na nossa cabeça, a dizer "agora que aprendeste o valor da humildade e a desconfiar da ilusão das aparências, meu pequeno e ingénuo gafanhoto, está na hora de perceberes a importância da persistência". Pelo menos, isto foi o que se passou comigo e com o StreetSoccer.

E o Powerboast não foge muito a esta lógica. As regras são enganadoramente simples: o tabuleiro representa um pedaço de mar ou rio e está dividido em hexágonos pequenos. no tabuleiro estão colocadas 3 bóias numeradas.



Cada jogador controla um barco e o objectivo é contornar as 3 bóias por ordem e depois disparar para a meta de forma a ser o primeiro a chegar.
Na sua jogada, cada jogador tem de:
- Decidir se quer adicionar ou remover um dado.
- Decidir se quer relançar um ou mais dados.
- Decidir se segue em frente, ou se vira 60º em qualquer direcção.

A seguir deve somar o valor de todos os dados que tem e avançar esse número de casas na direcção escolhida. Se encontrar um obstáculo pelo caminho - uma ilha ou uma bóia - recebe um ponto de dano por cada casa que deveria ter movido e não pôde mover e perde todos os seus dados. Quem acumular mais do que 4 de dano, afunda e perde essa manga. Há um twist importamte: se houver opção entre bater e não bater, o jogador é sempre obrigado a escolher a trajectória onde não bate (ou a que lhe rende menos dano, caso bata em todas), mesmo que isso o desvie da rota planeada.

Uma corrida é composta por 3 mangas e o jogador que fizer mais pontos no somatório das 3 será o vencedor. Os pontos da segunda manga duplicam e os da terceira triplicam. Os dados têm apenas 3 faces, numeradas de 1 a 3.



E o jogo é isto!

A apreciação

Este é, tal como o StreetSoccer, uma obra-prima-zen, do mestre de kung-fu holandês! Consegue, com regras tão simples que até metem nojo, ter uma fidelidade ao tema impressionante e, ao mesmo tempo, ter estratégia suficiente para que um novato tenha de suar bastante antes de conseguir ganhar a um jogador mais experiente. E é temático... meu deus, como é temático! Como nas corridas a sério, grande parte da ciência está em saber escolher as melhores trajectórias (porque neste jogo escolhe-se mesmo a trajectória em vez de apenas se mudar de faixa), que podem não ser as mais curtas. Para além disso, é preciso aprender a gerir bem os dados, planear 2 ou 3 jogadas em antecipação e saber quando é que vale a pena arriscar e quando não vale. Há sorte envolvida, naturalmente, mas esta é mitigada não só pelo facto dos dados variarem apenas entre 1 e 3, como, principalmente, pela forma brilhante como são utilizados, permitindo que passem de umas rondas para as outras sem serem relançados, caso seja essa a vontade do jogador.

O jogo pode jogar-se de 2 a 6 jogadores e, como qualquer jogo de corridas que se preze, lida bem com mesas bem fornecidas. Curiosamente, ou talvez não, fazer um mano a mano também é bastante interessante. Aliás, no site só dá para fazer jogos a 2 e isso não me tem impedido de passar lá a vida. Mas, voltando ao que interessa: as 3 mangas fazem-se em mais ou menos 1 hora (depende da experiência e do número de jogadores), mas é perfeitamente exequível fazer só uma mangazita em 20 ou 25 minutos, para encher um tempo morto.

Acho que é um dos melhores jogos que já joguei, da colheita de Essen deste ano, e, provavelmente, o melhor jogo de corridas de sempre, destronando até o lendário Um Reifenbreite, ou Zip Zap Zunfenbrücken, como o Hugo carinhosamente lhe chama.

03 novembro 2008

Wabash Cannonball: o lobo em pele de cordeiro

Wabash Cannonball é o primeiro jogo da Historic Railroads Series, da Winsome e a estreia do seu autor, o misterioso artista oriental Harry Wu, nestas lides dos jogos de tabuleiro.

Para quem não sabe, a Winsome Games é uma empresa muito pequena, que se dedica ao desenvolvimento de jogos de comboios. O seu pessoal resume-se a John Bohrer (o ex-melhor amigo de Martin Wallace que agora disputa com ele os direitos de publicação da nova edição do Age of Steam), um multifunções Canon qualquer coisa, com impressora jacto de tinta e scanner integrados, uma guilhotina comprada na Staples e um cigano com uma máquina de plastificar, que dantes costumava estar à porta da DGV a oferecer-se para plastificar as cartas de condução do pessoal.

Atenção, que estamos a falar do John Bohrer que é considerado nalguns círculos um dos melhores developers de jogos que por aí anda! Para quem não sabe, o developer é o gajo que olha para o protótipo do autor, o testa exaustivamente e lhe retira as ideias parvas. Dizem as más línguas que o impacto da sua zanga com Martin Wallace tem sido bastante visível nos jogos deste último. Não sei porque razão, mas o nome Perikles vem-me à cabeça. Noutros círculos, no entanto - aqueles mais próximos do seu ex-melhor amigo - a opinião generalizada é que John Bohrer não passa de um merdas.

Da minha parte, não sei quem tem razão, mas estou confiante que a história fará justiça a estas duas grandes personalidades da cultura contemporânea. O que me interessa é que ambos continuam a fazer jogos!

Mas voltando ao que interessa: o objectivo da Winsome é fazer jogos com componentes muito mais - eles chamam-lhes protótipos - e levá-los a Essen em edições muito raras e limitadas. A ideia é que estes "protótipos" chamem a atenção de um dos big kahunas das grandes editoras alemãs e estas os republiquem em grande escala, ou então vendê-los directamente a totós como eu, por preços exorbitantes. No caso deste Wabash Cannonball, o plano correu na perfeição. Por um lado, depois de ter sido apresentado em Essen no ano passado, este Wabash Cannonball foi lançado este ano pela Queen, com o nome de Chicago Express. Por outro lado, há um "protótipo" na prateleira deste totó, pelo que essa parte do plano também correu bem! Já decidi é que não vou adquirir a nova edição da Queen! Totó, ma non troppo! Pelo menos é que digo a mim próprio todos os dias.

Sobre o autor, o misterioso artista oriental Harry Wu, há que dizer também que muito boa gente está perfeitamente convencida de que não passa de um pseudónimo do próprio John Bohrer, que terá optado por não assumir em nome próprio a autoria deste jogo. Porquê, ninguém sabe. E se por um lado, nunca ninguém os viu juntos na mesma sala, por outro, parecem existir diferenças físicas irreconciliáveis, já que John Bohrer usa óculos e veste-se sempre de fato e gravata, enquanto Harry Wu não tem óculos e costuma usar uma espécie de kimono oriental, à la Fu Manchu.

A dúvida persiste, embora me pareça que há gente a ver demasiados filmes do James Bond.

O jogo

O mapa está dividido em hexágonos e representa a zona dos Estados Unidos, entre o Ilinois e a Pensilvânia. Do lado direito do mapa começam 4 companhias de comboios. Do lado esquerdo, nas margens do lago Michigan, encontram-se Chicago e Detroit. Cada companhia tem um número fixo de acções que poderão ser vendidas durante o jogo. O número de acções que cada companhia tem disponível para vender varia e este é um pormenor da máxima importância.

As regras são simples. Na sua vez de jogar, um jogador pode escolher uma de 3 acções possíveis: capitalização, desenvolvimento ou expansão.

Quando um jogador escolhe capitalização, escolhe uma companhia que tenha acções disponíveis e coloca uma acção à venda, num leilão. O dinheiro resultante da venda da acção entra para os cofres da companhia e é o que lhe vai permitir operar e gerar lucros.

A acção de desenvolvimento permite "melhorar" um hexágono à escolha no mapa, por onde passem os carris de, pelo menos, uma companhia. Os efeitos dependem do tipo de terreno: o desenvolvimento de uma cidade ou de uma mina faz aumentar a cotação das companhias que por lá passam, enquanto as florestas permitem injectar dinheiro nos seus cofres. A acção de desenvolvimento não custa dinheiro e qualquer pessoa pode desenvolver qualquer hexágono, desde que lá esteja, pelo menos, uma companhia.

A última acção possível é a expansão. Expandir uma companhia é, na prática, assentar carril! O objectivo é ligar as várias cidades, gerando lucros para a companhia e, por arrasto, para os seus accionistas. Esses lucros são representados pela cotação da companhia, que esta vai ligando mais cidades. Em termos práticos, expandir uma companhia é acrescentar 1, 2, ou 3 cubos à linha dessa companhia no mapa. Os custos de expansão dependem do tipo de terreno dos hexágonos em causa e os custos são suportados na íntegra pelos fundos da própria companhia. Para um jogador poder executar a acção de expansão, tem de possuir pelo menos 1 acção da companhia em causa.

Cada acção pode ser executada um número limitado de vezes. Para controlar isto, existem 3 másculas tracks no tabuleiro (creio que na edição da Queen são uns mostradores redondos, todos bonitos e potencialmente indutores de homossexualidade a quem apreciar demasiado a sua beleza). Quando duas das 3 acções se esgotam, as companhias pagam dividendos aos seus accionistas e as tracks são reiniciadas. O valor do dividendo que cada companhia paga é o valor da sua cotação a dividir pelo número de acções que a companhia vendeu até ao momento. Este é outro pormenor da máxima importância porque esta "diluição" do valor das acções (quanto mais acções já foram vendidas, menor o valor unitário de cada uma delas) pode ser utilizada pelos jogadores em seu benefício.

Quando a primeira companhia consegue chegar a Chicago, acontecem 2 coisas importantes: há um pagamento de dividendos especial só para essa companhia e entra em jogo a Wabash Cannonball, que começa em Fort Wayne. Esta nova companhia funciona de forma exactamente igual a todas as outras (podem ser vendidas acções, pode ser expandida, etc) e os seus efeitos no jogo dependem muito da situação.

O jogo acaba após terem sido pagos os dividendos, se 3 companhias já não tiverem acções para venda e/ou cubos para construir camino de ferro. Há mais algumas condições de fim de jogo, mas as que acontecem mais habitualmente são estas. Ganha quem tiver mais dinheiro na mão (o portfolio accionista não serve para nada, no fim).

Há mais algumas coisitas, mas o jogo é mais ou menos isto.

A minha opinião

O Wabash Cannonball é um jogo dissimulado. À primeira vista, é simples e inofensivo, mas não é. Parece que tudo se resume a comprar acções de uma companhia e depois tentar expandi-la até Chicago, para receber o tal dividendo extra. Mas rapidamente se percebe que as coisas não são assim tão simples.

O mecanismo de acções é muito engenhoso e previligia, de uma forma simples e limpa, as alianças temporárias entre os jogadores. Passo a explicar o teor desta afirmação com um pequeno exemplo explicativo a que chamarei "Pequeno Exemplo Explicativo".

Pequeno Exemplo Explicativo

Imaginemos que estamos a jogar com 4 jogadores. Se eu tiver 2 acções da companhia "A" e estiver a tentar que ela chegue a Chicago, vou poder expandi-la uma vez a cada 4 acções que são executadas no jogo, já que cada jogador na sua jogada executa uma acção. Mas se eu tiver uma acção da companhia "A" e outro jogador tiver outra acção, isto significa que vamos poder expandir a mesma companhia 2 vezes, em cada 4 acções, ou seja, ao dobro da velocidade da primeira situação. E se fizermos isso de uma forma concertada, há uma probabiilidade muito maior da companhia ser a primeira a chegar a Chicago e receber aquele dividendo extra gostosão. A desvantagem desta situação é que vou dividir os lucros com o outro gajo que também tem acções da minha companhia embora, verdade seja dita, ele também esteja a trabalhar para o nosso bem comum. A vantagem é que os outros jogadores ficarão a chuchar no dedo e a olhar para nós, cheios de inveja do nosso sucesso.

Mas esta colaboração entre 2 accionistas igualitários de uma companhia assenta num equilíbrio muito frágil e só funciona quando há igualdade entre os intervenientes. Assim que deixa de haver igualdade - porque, por exemplo, um dos invejosos de que eu falava escolheu "capitalização" para tentar mandar as gânfias ao nosso lucro, e o outro gajos adquiriu mais uma acção da nossa companhia "A" - o outro accionista deixa de ter interesse em colaborar na sociedade. Porquê? Porque já não terei interesse em estar a desperdiçar as minhas acções numa companhia que vai dar mais lucro a outro gajo do que a mim... ele que gaste as acções dele! Em certos casos - leia-se "muitas vezes" - um accionista minoritário até tem interesse em lixar deliberadamente a companhia em causa, para impedir o maioritário de ter um lucro significativamente superior ao seu e, assim, vencer o jogo. Isto é particularmente verdade, quando está em causa a chegada a Chicago, com o seu respectivo dividendo extra e/ou quando há um diferencial grande em número de acções entre o accionista maioritário e o(s) minoritário(s). Como é que se lixa deliberadamente uma companhia? Expandindo-a para sítios idiotas, de forma a esgotar o seu stock de cubos, e/ou a gastar o seu dinheiro. Nos nossos últimos 4 ou 5 jogos, nenhuma companhia conseguiu chegar sequer perto de Chicago e muitas optaram por fazer expansões parvas para o meio das montanhas (que é onde é caro), o que é bem representativo do que eu estou a dizer.

Sprinters e maratonistas

Para adicionar à complexidade, as companhias não são todas iguais. E não são iguais porque não têm todas o mesmo número de acções disponíveis para serem vendidas, nem o mesmo número de cubos para construir linha. Há vantagens e desvantagens em investir numa companhia com poucas acções. Por um lado, quanto menos acções uma companhia tiver disponível para vender, maiores são os dividendos que potencialmente vai pagar (lembrem-se que os dividendos dependem da cotação da companhia e do número de acções vendidas). Por outro lado, se uma companhia tiver poucas acções disponíveis para vender, pode ter problemas de dinheiro (vender acções é a única forma que uma companhia tem de ganhar quantidades significativas de dinheiro) e, por isso, ficar estagnada, sem se conseguir expandir. Eu costumo dividir as companhias entre as sprinters e as maratonistas e a melhor maneira de utilizar cada tipo é diferente.

Conclusão

Tudo isto para dizer aquilo que já deve ser óbvio: eu estou perdidamente apaixonado pela minha personalidade electrizante... e, para além disso, gosto muito deste Wabash Cannonball! Cada jogo é um desafio difícil e interessante, em que cada jogador tenta colocar-se numa posição em que os outros tenham de o ajudar, para se ajudarem a si próprios. E isto não é nada fácil de fazer. O jogo é de informação perfeita (o dinheiro de cada um tem de estar visível), não tem nenhum tipo de factor aleatório, mas é de tal forma complexo e compacto que cada jogo é muito diferente de todos os anteriores.

Não é um jogo fácil de perceber, embora as regras sejam muito simples. Nas primeiras vezes que se joga, em que todos os jogadores são inexperientes, é muito fácil cometer erros numa fase inicial, que depois são irrecuperáveis. Também é normal um jogador inexperiente "dar" a vitória a outro jogador ao cometer um erro, sem perceber muito bem que o está a fazer. Felizmente o jogo é rápido (um jogo demora entre trinta minutos e uma hora, quando já toda a gente sabe o que anda a fazer) e. por isso, as consequências desses erros não são muito penosas.

Mas quando se está a jogar com uma mesa de jogadores que sabem o que estão a fazer, este é um jogo rápido, complexo e interessante, que dá imenso prazer jogar. Recomendo vivamente!

22 outubro 2008

Memoir 44: Soldadinhos de plástico

Muita coisa tem vindo a mudar na minha vida de jogador nos últimos meses. Se é verdade que, durante muito tempo, qualquer jogo de tabuleiro me fascinava e me distraía durante várias horas, independentemente da sua temática, mecânica ou mesmo aparato visual, agora, depois de ter começado a jogar jogos com uma vincada ambiência militar, a minha definição de entretenimento deu um rodopio de 180º e tudo o que não possua tiros, sangue e mortes pode tornar-se bastante aborrecido e é bem natural que daqui para a frente me torne um tipo insuportável quando chamado a jogar um Euro.
A minha primeira experiência no domínio dos Wargames foi através deste Memoir 44. Esta afirmação pode inclusive estar neste momento a despertar os mais variados comentários de desprezo por parte dos Wargamers, mas a verdade é que, digam eles o que disserem, Memoir 44 é uma óptima porta de entrada para este fabuloso mundo dos jogos de guerra.
Richard Borg conseguiu, através dum sistema imaginativo e bem oleado, reduzir a duração de reprodução duma batalha, normalmente 77 horas, para apenas trinta minutos. Além deste feito, que não é tão pequeno como isso, Richard Borg simplificou as regras de tal forma que um jogador conseguirá calmamente, e em apenas meia hora, ler o livro de instruções na cama antes de adormecer e ainda ficará com tempo suficiente para chatear a parceira para uma fogosa aventura sexual. Aviso já os leitores audazes que a fogosa aventura sexual durará bastante menos que a leitura.
Esta notável filosofia da simplificação criou um novo paradigma na abordagem a este tipo de jogos. Agora sabemos todos que, qualquer pessoa, poderá fazer uma batalha com um amigo sem chatear a esposa que normalmente, noutras condições, ficaria privada do seu macho pelo menos durante uma semana. Esta inovação, bastante sensata diga-se, trouxe com ela muitos novos jogadores e, claro, muitas vendas.



Memoir 44 foi feito de encomenda para as comemorações do 60º Aniversário do Dia D e da libertação da França. Por isso não é de estranhar que os primeiros cenários dos muitos disponíveis sejam precisamente do afamado desembarque na Normandia e das consequentes batalhas em terras Francesas.
A ideia do jogo é bastante simples. Dum lado estão os Alemães e do outro os aliados. Tradicionalmente, salvo algumas excepções, no primeiro contacto com o jogo, cada um dos adversários terá a oportunidade de movimentar dois tipos de unidades, os soldados e os tanques. Os tanques são mais rápidos que os soldados e têm um poder de fogo de meter medo. Por outro lado, de nada valem em certas localizações, como florestas, cidades ou cercas de florestação onde perdem poder de fogo. As unidades de infantaria, por outro lado, têm mais facilidade em se esconderem e aproveitarem os terrenos que constituem cada cenário para beneficiarem de alguma vantagem face à oposição das unidades inimigas. Cada unidade de infantaria pode lançar em batalha 1, 2 ou 3 dados consoante a distância a que está do alvo. Por outro lado os tanques “disparam” sempre 3 dados, mas este número pode ser reduzido quando o disparo tem como objectivo unidades estacionadas em cidades ou florestas cuja visibilidade é menor. Aproveitar as características dos terrenos e os pontos vitais do mapa são os factores determinantes para vencer uma batalha.
Existem mais algumas coisas que vão aparecendo com o desenrolar das campanhas, como fortes, arame farpado, pontes, artilharia e unidades especiais que tornam cada cenário uma experiência única com características distintas e singulares.

Toda esta roda militar que este escriba vos escreve é movimentada por cartas. Cada general ou jogador tem várias cartas na mão e essas cartas servem para darem ordens às unidades que estão no terreno. Por exemplo, o jogador tem uma carta que lhe permite movimentar todas as unidades no lado esquerdo. Desta forma o jogador na sua jogada movimenta só as unidades do lado esquerdo do mapa. Em contrapartida, todas as outras unidades ficam paradas. Existem cartas de vários tipos, que permitem movimentar apenas uma unidade, recuperar unidades que sofreram baixas em rondas anteriores, construir trincheiras, duplicar o poder de fogo, pedir um ataque aéreo e muito mais. A ideia subjacente a tudo isto é que o jogador não pode movimentar as suas peças conforme a sua vontade. São as cartas que ditam o que fazer. Ao jogador caberá a tarefa de, mediante as opções que tem em mãos, seguir aquela que melhor lhe serve no rumo da batalha. Poderá haver alturas em que o pobre do general não terá nada de jeito que possa fazer. Muitas vezes acontece o jogador ter várias unidades do lado direito da batalha e não ter cartas que permitam movimentá-las. Nestas ocasiões o melhor é fazer o que se pode com o que se tem ao centro e à esquerda.


Como já referi, uma batalha nunca demora muito tempo a ser resolvida. Tudo isto se desenrola rapidamente. Todavia, julgo que um cenário desvenda-se totalmente aos jogadores nas primeiras 3 tentativas e, a partir daí, pode-se tornar bastante previsível e os generais perderem a motivação para o repetirem. A boa notícia é que existem, pela última contagem, 7026 cenários espalhados pela net e alguns deles podem ser mesmo sacados da página oficial do jogo. Muitos foram desenhados pelo próprio autor. Se mesmo assim o jogador achar que é pouco, então porque não fazer os próprios cenários e partilhar essa veia com o mundo? Memoir 44 é um jogo que nunca se torna repetitivo e existem sempre desafios diferentes, com regras diferentes e pormenores variados. Se juntarmos isso ao facto de haver 5 expansões com muitas novidades dentro delas (existe mesmo a possibilidade de trazer aviões para o mapa), a experiência Memoir 44 parece não ter fim. Como se tudo isto fosse coisa pouca, existe sempre a possibilidade de se juntarem 2 mapas e jogar-se em Overlord, que transforma uma simples batalha num épico para mais do que os tradicionais dois jogadores com o dobro das unidades e das opções.


Memoir 44 é um jogo catita, servido com dezenas e dezenas de figuras de plástico que tornam tudo agradável à vista e que transformam os combates numa diversão. Não é um jogo de guerra como nós os imaginamos, difíceis, cheios de particularidades e que dão trabalho a aprender e jogar. Mas isso é, contudo, o seu maior trunfo. É um jogo directo e simples que elimina tudo o que pode ser supérfluo e apenas se centra nas manobras de cada lado da contenda. Não espere decisões muito difíceis mas também não espere grandes facilidades. Vai sentir dúvidas e vai ter afrontamentos quando lhe faltarem as cartas para o movimento que lhe dava jeito. O melhor é usar a imaginação. Tudo limpinho, sem sangue e sem lama. Na verdade faz-nos lembrar a altura em que, quando éramos mais novos, comprávamos soldadinhos de plásticos e que depois, quando so tínhamos na mão não sabíamos o que fazer com eles. Quanto muito, lançávamos berlindes para ver quantos é que tombavam. Pois bem, Memoir 44 é o jogo para essas figurinhas de plástico mostrarem o que valem.
Além disso, pode até servir, para os pais mais interessados, como introdução à segunda guerra mundial aos filhos.

Classificação ***

24 setembro 2008

Session report: Imperial

ho do vos ser sincero. Cada vez me custa mais escrever para aqui. Não é que não goste de o fazer, mas a preguiça para o feito é tanta que na maior parte das vezes acabo por desistir. São 3 anos nisto, meus amigos, 3 anos! Ando cansado, velho e parece que estou sempre a escrever o mesmo post.
Mas apesar de tudo, depois de ter jogado a semana passada a Imperial de Mac Gerdts, fiquei com um bichinho de fazer uma Session Report gloriosa, daquelas a contar como correram as mudanças de países, as guerras, o sangue, o dinheiro e os interesses políticos por detrás de cada jogador. Mas se a intenção era boa, pior foi a sua concretização. Nada! Passei o fim-de-semana a ver bola, golf e a beber margueritas (que entretanto aprendi a fazer). Nem o computador liguei e a determinada altura já estava com os copos e o momento ideal para a escrita passou.
Por isso deixei de lado a aventura de escrever uma session gloriosa e vou apenas descrever as minhas ilações sobre a jogatana. Assim, a seco, sem rodopios narrativos nem nada. Esta é a session report mais aborrecida que você, leitor, pode encontrar nos blogs da especialidade, mas por outro lado pode até ser bastante interessante discutir. A ideia é conhecer as experiências dos caros leitores sobre este jogo e como é que as partidas fluem no vosso grupo.

Filipão: O Filipão foi sem dúvida o jogador da noite. Numa estreia absolutamente sensacional, conseguiu trazer muita frescura à experiência. Sem saber muito bem o que fazer e de maneira a esconder-se do jogo, nunca assumiu nenhuma potência. Ora, esta opção acabou por ser bastante proveitosa para ele. Com ela, acabou por poder comprar acções de todos os países e como não tinha o controlo de nada, acabava por adquirir as acções sempre que a carta de investor passava de mãos. Por outro lado, como tinha acções de praticamente todos os países acabou por estar sempre a receber dinheiro cada vez que alguma potência caía no investor. Por esse facto os seus ganhos, apesar de serem poucos de cada vez, eram constantes. Acabou por ser uma estratégia bastante funcional que me fez pensar no jogo e equacionar toda a minha forma de jogar. Filipão não se aguentou até ao fim. Ironicamente, a determinada altura, acabou por decidir, num acto de coragem, comprar o poder na Áustria. A partir dessa altura não pôde mais comprar acções com a passagem do investor, porque não beneficiava da regra que permite a um jogador sem controlo em nenhuma potência poder comprar uma acção. Filipão apostou na Áustria, perdeu a aposta e acabou por perder o primeiro lugar.

Hugo: Eu fiz o que costumo fazer nos jogos todos de Imperial. Compro a Áustria e a Rússia e faço um pacto de não agressão e consigo que as potências em questão dividam os países da Europa do Leste. Isso é o suficiente para lutar pelos primeiros lugares e também para que tanto a Áustria como a Rússia sejam bons investimentos. Mas desta vez a coisa não correu muito bem. Quer dizer, ao princípio as potências em questão até se destacaram (mais a Rússia) mas não deram o salto. Descobri, que apesar da vantagem inicial duma ligação Áustria/Rússia chega-se a um ponto em que estas se anulam e acabam por não conseguir evoluir. Penso que vai ser a última vez que faço um jogo baseado no controle Austra/Rússia. Bem me avisou o Zorg para esse facto.

Zorg: Investiu mais na Itália e Inglaterra, com algumas investidas na França e Rússia. Acho que nunca assumiu o risco e ficou sempre na expectativa. A expectativa compreende-se porque foi um jogo em que as potências andaram sempre juntas pela track de pontuação. Era de facto muito difícil prever qual seria a vencedora para se gastar dinheiro nas suas acções. A oportunidade só chegou no fim, mas já era muito tarde e os outros jogadores anteciparam a vitória da Alemanha e já tinham comprado acções desta, obtendo vantagem sobre ele. No entanto fiquei impressionado como ele trabalhou a Inglaterra e ganhou dinheiro com ela. De facto com um investimento fraquinho conseguiu retirar imenso das terras de sua majestade. Inglaterra deve funcionar bem como apoio marítimo á França ou mesmo Alemanha. Acho difícil conseguir ser a potência mais valiosa num jogo.

Spirale: Em termos de grandes líderes, Spirale sabe o que faz. Com uma astúcia sem memória, Spirale assumiu a si a Alemanha e construiu uma potência com “P” grande. A Alemanha ganhou o jogo e foi Spirale que lhe edificou o poder. Apesar de tudo, Spirale não ganhou. Foi o jogador que mais se esforçou por levar uma potência a bom Porto, mas não conseguiu a vitória. Bateu em tudo e todos mas aprendeu que ser um bom líder em Imperial não serve de nada. No entanto Spirale vai fazer referência durante vários meses a esta sessão e principalmente à Alemanha que conseguiu construir.

Ricardo: Começou o jogo como o Filipão. Passou o início escondido do grande palco, sem assumir nenhuma potência. A determinada altura do jogo pegou na França e na Itália. Percebeu-se que a França tinha grandes hipóteses de ganhar o jogo quando ele lho pôs as mãos. A determinada altura havia dúvidas se seria melhor comprar acções da França ou Alemanha. Mas, ao contrário de Spirale, Ricardo nunca teve uma mão de ferro e nunca conseguiu assumir-se como um líder nato. A França, acabou por não evoluir na classificação e acabou se afundar. Mas Imperial tinha uma surpresa reservada para os jogadores. Deu a vitória a Ricardo. Apesar de ser um mau líder, acabou por ganhar. Beneficiou de comprar a última acção dum país, numa altura em que se sabia que a Alemanha ia ganhar. Comprou uma acção alta deste país e ganhou. Isto levantou-me uma questão pertinente. Saber se o último jogador a comprar uma acção ganhava sempre. Isto porque nas minhas 3 últimas partidas foi isso que aconteceu. Mas outros jogadores juraram-me que nunca tinham reparado nisso.


A sessão foi muito boa. O Jogo terminou às duas da manhã e havia tanto para falar na altura que, devido ao adiantar da hora e à obrigação de acordar cedo na manhã seguinte, vimo-nos forçados a despedirmo-nos. Mas essencialmente esta secção fez-me ver Imperial com outros olhos e perceber alguma coisa dele. Para já que tem sorte. Parece-me, de alguma forma, que quando o jogo se começa a definir, os jogadores que vão ter a possibilidade de investir têm vantagem.
Por outro lado, de nada valem as teorias que se possam ter sobre o jogo. Tudo pode falhar na hora de fazer as contas. E isso é fantástico, ou não fosse ele um SpielPortugal. Por outro lado também é um jogo que se transforma consoante as dinâmicas dos grupos.


05 setembro 2008

Reportagem: Guia de compras para jogadores com poucos amigos

Um dos grandes momentos da vida dum homem casado é a descoberta do BoardGameGeek por mero acaso e a consequente navegação obsessiva pelos seus menus. O BoardGameGeek torna-se instantaneamente numa amante e o caro leitor não descansa enquanto não lhe percorrer as páginas todas e vislumbrar, sequioso, todas as suas potencialidades. Vai ter orgasmos, vai sonhar com o seu futuro e vai deixar de ter sexo com a sua parceira.
Todo este comportamento é tido, como é lógico, fora do conhecimento da esposa e não vão ser raras as alturas em que terá de fechar rapidamente a janela do browser ao sentir a aproximação da cônjuge. É natural. Aconselho apenas e ser cuidadoso e inteligente e fazer o que costuma fazer com a habitual consulta de pornografia - retirar todas as provas que o possam comprometer do histórico. Mas, não aguentando a pressão constante, a determinada altura toma uma posição que vai ser uma das mais marcantes da sua vida: Aceitar o que a vida lhe reservou e tornar-se abertamente um jogador de jogos de tabuleiro.
Já com mais liberdade e sem peso na consciência, é altura do caro leitor passar o seu tempo livre a consultar as críticas, imprimir as regras para as ler na cama antes de adormecer e fazer planos para comprar um jogo. A escolha vai ser difícil de tomar, porque o pretendente a jogador não quer um mero jogo mas antes o jogo que lhe vai alterar os hábitos e por isso passará muitas semanas numa demanda pelo santo graal.
Como acontece com quase todos, a encomenda é feita e a sua chegada provocará um grande contentamento ao destinatário. Vai ver os materiais, vai colocar a caixa na estante à vista de todos até que vai chegar a uma triste conclusão mais cedo ou mais tarde: Não tem ninguém com quem jogar.
A tomada de consciência de tão triste realidade provocará uma dor no coração e na alma, logo sentirá a necessidade humana de equacionar todo o seu futuro enquanto bebe uma garrafa de Whisky. Afim de se salvar a si e à sua família e num acto de desespero a que nunca pensou chegar, vai pedir à sua mulher para jogar consigo. Se a esposa for honrada e de confiança, como todos esperamos, vai recusar várias vezes até que por fim, já magoada de o ver sofrer pelos cantos da casa, aceita o desafio.
Claro que o jogo que o leitor escolheu não é um jogo que funcione bem a 2 jogadores e em vez de sentir alívio, irá mergulhar numa espiral de ânsia e desespero que o pode levar ao choro.
Face a estas contingências da vida moderna, que tanto a Oprah como a Fátima Lopes escondem do grande público, resta a este blog fazer a justiça que o assunto merece, escrever algumas linhas sobre bons jogos para 2 jogadores.
Aqui vão algumas sugestões, algumas delas poderá encontrar críticas mais aprofundadas pelo blog. Se eu fosse um tipo organizado e com brio da tarefa colocaria links para as críticas, mas não sou. Tenho outras virtudes para compensar, não sei é muito bem quais!



Exploradores (Lost Cities)
de Reiner Knizia
Este é sem dúvida um dos jogos mais apetecíveis para um serão em família. Tornou-se num clássico e raramente alguém põem em causa os seus merecidos méritos. É um jogo de cartas e por isso facilmente aceite pelos novatos nestas coisas. Assume também uma experiência muito próxima dos conhecidos jogos de paciência que normalmente se jogam para ajudar a passar o tédio da hora do almoço. O solitário, instalado com o seu Windows é talvez o mais conhecido e o mais jogado. O que Exploradores traz à baila é a oportunidade de fazer uma vulgar paciência de cartas ao mesmo tempo que compete com um adversário. Ora isto traz propositadamente alguns problemas, ou seja, na sua tentativa por conseguir maximizar o seu jogo vai, como todos os jogos solitários, descartar cartas, mas ao invés das cartas descartadas ficarem despejadas quietinhas num monte, podem ser aproveitadas pelo adversário para que este consiga ser mais eficaz que você. Por isso o jogador não tem só de se preocupar em colocar as cartas por ordem numérica, tem também de se preocupar que o adversário não o consiga fazer e não aproveite os seus restos.
Jogo de 20 minutos que fica bem em qualquer casa e além disso tem edição em português e vende-se em qualquer canto. As mulheres costumam gostar e quando ganham desperta-lhes, sabe-se lá como, uma predisposição real para o sexo.
Para bom entendedor, meia palavra basta!

Classificação: ****

Batlle Line
de Reiner Knizia
Jogo de cartas mais ou menos com os mesmos contornos que Exploradores. Apesar de se jogar duma forma diferente, o grau de envolvimento é semelhante. Aqui o que se quer é que o jogador jogue um estilo de Poker com o adversário. Para ser bem sucedido terá de fazer contas ás cartas que saíram e as que ainda andam em jogo.
Tal como em exploradores as mulheres costumam gostar e quando ganham, bem já sabem o que acontece!

Classificação: ***

Carcassonne: The castle
de Reiner Knizia
Se os puzzles se transformassem em jogos para dois jogadores com pontuação e tudo é natural que não fossem muito diferentes deste Carcassonne: The Castle. Num misto de Dominó e Puzzle, este desafio de Reiner Knizia pede ao jogador que construa dentro das muralhas dum castelo edifícios, torres, estradas, fontes e campos de pasto. As peças encaixam umas nas outras e os edifícios vão-se formando. Quanto maiores forem as construções mais pontos terá o seu construtor. É um jogo levezinho, com alguns rasgos imaginativos especialmente porque existem bónus na pontuação para o jogador mais rápido a chegar a determinado score. A luta pelos bónus é feroz e o interesse do jogo reside precisamente aí.
Aconselho a todos que queiram passar meia hora a descontrair da vida antes da pizza chegar. Quem perde, paga!

Classificação ***

Street Soccer
de Corné van Moorsel
Bem, aqui está um jogo que tem feito as delícias aqui do vosso escriba. É tão fácil que até chateia, Street Soccer assume-se como um objecto muito curioso. O tema é universal e apesar de ter um dado e a sorte estar envolvida em quantidades próximas do industrial, não deixa de ser muito engraçado. À medida que se joga percebe-se, com alguma felicidade, que afinal o azar pode ser diminuído mediante uma boa gestão da posição dos jogadores no terreno. Quando se começa a ter a consciência que são sempre os mesmos a ganhar, o vício envolve os jogadores e simplesmente não se consegue parar de jogar. Por outro lado existem grupos de jogo espalhados pela internet e campeonatos que têm jogadores de todos os países do mundo. Ao contrário dos jogos olímpicos, os chineses são relativamente fáceis de derrotar e é natural que se sinta bem consigo mesmo por disputar uma final. Uma vez cheguei a uma meia-final e estive uma semana sem dormir!
Mas eu tenho tendência para o exagero.

Classificação ****

Catan: the Card Game
de Klaus Teuber
Visto como um dos milhares de subprodutos Catan, nunca foi levado a sério e são raros os novos jogadores que olham para ele com curiosidade, preferindo namorar o jogo de tabuleiro. O namoro é bem visto mas tem o problema de ser um jogo para 4, enquanto o baralho de cartas foi pensado para jogar a 2. Acredite-se ou não Catan: The Cardgame é um jogo muito maneirinho com uma mecânica de jogo bastante interessante e bem pensada e faz lembrar mesmo o jogo de tabuleiro. Tem o problema de não ser muito bonito a nível visual uma vez que precisa de alguma mesa para colocar as cartas que vão saindo, mas dá bem para os gastos e se a sua única opção são jogos para dois, não tenha medo, não vai ficar desiludido. Seja como for, deve resultar melhor com novatos que com jogadores mais experientes. As cartas têm instruções em Inglês.

Classificação: **

Samurai
de Reiner Knizia
Pode parecer um bocado esquisito tantas referencias a este designer alemão. Mas não há como fugir, o homem teve o seu tempo áureo e as suas criações são ainda referências incontornáveis no mundo dos jogos de tabuleiro.
Samurai é um jogo que lembra muito aqueles passatempos matemáticos de jornal, como o Soduku. A ideia é um bocado essa. Colocar tiles de números à volta dos objectivos, ganhando o jogador que possuir as tiles com números mais altos. O problema é que existem muitos objectivos no tabuleiro e o jogador terá de dividir a sua influência numérica por eles. É um jogo que funciona a dois como a três e a 4 jogadores.
Se é do tipo de casal que gosta de jogar Sodoku e essas páginas de jornal são as mais concorridas, pode adquirir o jogo à confiança que vai ficar muito satisfeito. Além disso Samurai introduz uma pitada de sorte que apimenta as coisas e tem um sistema de pontuação bem esgalhado que ajuda a baralhar a lógica.

Classificação: ***

Tigris & Euphrates
de Reiner Knizia
Aqui já se começa a entrar num mundo bem mais misterioso e negro. Tigris e Euphrates é um jogo para 2 a 4 jogadores, mas funciona muito bem a 2. Aqui o que se pretende é que o jogador pense um bocado. Um bocado é pouco. Pense bastante. O tipo de raciocínio pretendido assemelha-se muito ao tipo de raciocínio que se tem nos jogos matemáticos, como o Xadrez ou o Go. Por isso é natural que não seja um título do agrado de toda a gente. Mas as peças coloridas e as nuances desta obra de Reiner Knizia aligeiram muito a frieza dos tabuleiros dos jogos ancestrais.
As regras não são muito intuitivas e dão algum trabalho a digerir, uma vez que só se percebe a função das coisas quando se joga e aparentemente nada faz sentido nas primeiras rondas de jogo. Depois o arco-íris aparece e tudo fica claro e saboroso. Se quer ter uma experiência matemática, não ponha de lado esta possibilidade. Além disso pode ter a felicidade de convidar até 3 jogadores para jogar consigo sem que se perca o encanto do desafio.
Um clássico imortal.

Classificação: *****

Hive
de John Yianni
Já que se fala em Xadrez, nada melhor que referir este Hive, que é talvez o jogo que se pode encontrar neste universo que mais parecenças tem com a invenção persa. As peças andam em cima da mesa em movimentos estranhos, não fossem elas representações de insectos, e as opções são muito abrangentes. Claro que não tem o nível de complexidade do desporto do Karpov o que, ironicamente, acaba por ser uma vantagem competitiva. As peças são poucas, demora 15 minutos cada partida e tem a particularidade de se tornar um vício difícil de resistir. É talvez o jogo que conseguiu angariar mais jogadores para este universo dentro do meu grupo de amigos. Joga-se na praia, nas piscina, na cama, na mesa, no carro, no campo, no elevador e onde houver 50 cm quadrados.
Recomendo vivamente a todos os jogadores de xadrez e a todos os que tentaram mas nunca conseguiram perceber onde se põe o raio da rainha e do rei.

Classificação ****

Agrícola
de Uwe Rosenberg
Pode parecer parvo, mas a verdade que a grande sensação do momento deste hobby é um jogo cujo tabuleiro é moldável ao número de jogadores que se sentarem à mesa. De 1 (sim, leu bem) a 5. Nunca joguei a 2, mas pelas experiências que tive até hoje tanto a 3 como 4, a coisa resultou muito bem e a sensação de se estar perante um dos melhores jogos de sempre é evidente e sente-se a cada segundo. Nada me faz duvidar que a experiência a 2 seja tão boa como em outras configurações. Além disso se por acaso convidar um amigo ou um casal a jantar consigo, e lhe quiser dar a conhecer os jogos de tabuleiro, tem sempre uma opção válida neste agrícola. Tenha só atenção que as cartas têm instruções em Inglês, que pode ser uma informação importante a ter em conta na hora de decidir.
Ah é verdade, o jogo para um jogador não é lá muito interessante.

Classificação: *****

Memoir 44
de Richard Borg
Se tiver um amigo macho que se costuma pendurar na sua SportTV em dias de clássico e que por acaso esteve na tropa e conta histórias mirabolantes da semana de campo, nada melhor que o convidar para mostrar a sua coragem e raça no campo de guerra. Memoir 44 tenta recriar os cenários da segunda guerra mundial opondo os dois lados do conflito. Tem muitas figurinhas e cada uma delas tem especificidades próprias, tanto a nível de poder de fogo como alcance e movimento. As batalhas resolvem-se em meia hora e Memoir 44 acaba por ser uma abordagem bem feliz aos jogos de guerra, apesar da sua simplicidade. Experimente desembarcar na Normandia e perceba a dificuldade da operação. As regras são fáceis de perceber e o livro de instruções tem vários exemplos
As cartas têm instruções em inglês.

Classificação: ***

The Battle of hill 218
de Darwin Kastle
São poucos os jogadores mais veterenos que conhecem este jogo. Só o coloquei neste post para me armar ao pingarelho e dar um tom exótico à coisa. The Battle of Hill 218 é um jogo de cartas muito simples e que tem um ambiente de guerra. Vários tipos de unidades com formas diferentes de entrar em jogo e de alcance. É muito simples e faz lembrar aquele jogo que se jogava antigamente num baralho tradicional que se chamava, salvo o erro, guerra. As cartas vão se anulando umas ás outras até que um jogador fique sem possibilidades de jogar. Cada partida demora 15 minutos e há quem diga que é o jogo de cartas ideal para os wargamers. Foi uma bela surpresa e além disso custa 5 euros.

Classificação: ***

30 julho 2008

Agricola: é difícil a vida no campo!

Se passaste o último ano enclausurado num submarino reforçado com titânio, a 4500 metros de profundidade a explorar a vizinhança da fossa das Marianas, então provavelmente nunca ouviste falar do Agricola e esta review é para ti!

Se, num episódio inexplicável de misticismo e espiritualidade, abandonaste tudo e te converteste a um obscuro culto oriental que te obriga a viver num buraco cavado no chão inóspito da estepe mongol, vendado e em meditação permanente, então provavelmente nunca ouviste falar do Agricola e esta review é para ti.

Se, quanto te falam em jogos de tabuleiro, a única coisa de que te lembras são os serões em família nas férias do natal a jogar monopólio e onde a avó passava a vida na cadeia, para gáudio geral, então provavelmente nunca ouviste falar do Agricola e esta review é para ti.

Se achas que Ameritrash é o nome técnico que se dá aos discursos do George W., se não tens posição definida sobre o papel dos dados num jogo de tabuleiro porque pura e simplesmente nunca te ocorreu pensar nisso, ou se não sabes distinguir um abstracto puro de um gateway game de medium weight, então provavelmente nunca ouviste falar do Agricola e esta review é para ti.

Em qualquer outra situação, sabes perfeitamente o que é o Agricola e, por isso, recomendo-te que vás para BGG ler as reviews dos jogos que estás a pensar mandar vir na próxima encomenda, ou então que vás reservar os bilhetes de avião para a viagem de Outubro para Essen, porque de certeza que esta review não te vai dar nenhuma informação nova.




O jogo


Agricola é a última criação de Uwe Rosenberg e o seu primeiro "gamer's game". Está a anos luz de tudo o que ele tinha feito até agora e ombreia, em termos de complexidade, com títulos como Caylus, Puerto Rico, etc. Os jogadores controlam uma família de agricultores do século XXVII, que tem à sua disposição um terreno virgem, com uma cabana de madeira. Ao longo de 14 rondas, os jogadores vão ter de lavrar e semear os campos, construir cercados para guardar animais, expandir e melhorar a cabana e, eventualmente, fazer filhos e pô-los a trabalhar na propriedade da família, que a vida de agricultor não é fácil. No final, ganha a "melhor" quinta, ou seja aquela que apresenta um desenvolvimento mais equilibrado nas várias áreas.

Os mecanismos

Uma ronda é um processo relativamente simples: cada jogador começa com 2 trabalhadores (o pai e a mãe) e, na sua vez, pode colocar um deles numa das acções disponíveis executando imediatamente a sua função. O processo repete-se enquanto houver jogadores com trabalhadores para colocar. Nada de novo aqui, pois já todos vimos isto numa série de outros jogos (Caylus, Pillars of the Earth, Tribune: primus inter pares, Stone Age, entre outros).

No entanto há aqui algumas nuances interessantes. Para começar há acções que vão acumulando recursos caso não sejam escolhidas, um pouco à semelhança do que acontece nos roles não escolhidos no Puerto Rico. Depois, o número de trabalhadores disponíveis para colocar não é fixo, já que quando os pais procriam o que acontece na prática é o jogador ficar com mais um trabalhador à disposição. Por último, é necessário alimentar os trabalhadores em rondas específicas do jogo - as alturas de colheita - e isso tem uma importância determinante no jogo. Posso dizer sem medo de mentir que a necessidade de arranjar comida para alimentar a família vai ser razão de muitos pesadelos.

Outra novidade muito importante são as cartas. No início do jogo cada jogador recebe 14 cartas divididas em 2 grupos, Ocupações e Pequenos Melhoramentos *. Estas cartas permitem obter vantagens importantes em variadíssimas áreas do jogo e podem ser colocadas em jogo, seleccionando a acção adequada. As ocupações representam a aquisição de conhecimento específico numa determinada área, que permite benefícios na execução de uma determinada actividade. Por exemplo, há uma ocupação que permite ganhar uma madeira extra, sempre que se recolhe madeira, ou outra que permite receber um estábulo de borla, sempre que se constrói um cercado para ter animais. As pequenas melhorias representam, tal como o nome indica, uma pequena melhoria que é construída na quinta e que também dá um benefício qualquer. Em termos práticos, as ocupações não custam recursos, mas exigem sempre uma acção dedicada para serem colocadas em jogo, enquanto as pequenas melhorias normalmente custam recursos e, às vezes têm pré-condições, mas podem ser colocadas como parte de outra acção qualquer.

Uma vez jogada, uma ocuipação ou uma pequena melhoria, esta fica em jogo até ao final e o jogador não recebe mais. Existem literalmente centenas destas cartas disponíveis, divididas em vários decks com flavours diferentes, e, em cada jogo, só são usadas 14 o que, em termos práticos, significa uma variabilidade de jogo para jogo praticamente infinita.


Por último, outro aspecto que eu acho muito interessante é o sistema de pontuação. Há imensas categorias que podem pontuar, mas cada uma delas, salvo algumas excepções, pode contribuir no máximo com 4 pontos. Por outro lado, o falhanço total em qualquer uma das categorias, significa, na maior parte dos casos, pontos negativos! Assim, não ter cenouras significa 1 ponto a menos, enquanto ter 4 ou mais cenouras, significa 4 pontos. No final somam-se os resultados de todas as categorias. Isto obriga a um desenvolvimento equilibrado e proporciona algumas das tensões mais importantes do jogo, já que é muito difícil conciliar o crescimento nos vários sectores de uma forma eficiente.

O feeling

Agricola é um jogo extremamente temático. As acções não estão abstraídas, como é normal neste tipo de jogos, e para se conseguir fazer qualquer coisa com relevância é preciso normalmente dar vários pequenos passos. Por exemplo, uma forma interessante de arranjar comida é cozinhar animais. Para cozinhar animais é preciso, antes de mais nada, construir um cercado com capacidade suficiente para os ter lá, que é uma das acções disponíveis. Mas, para se poder construir um cercado é preciso ter madeira! E para ter madeira, é preciso ir cortá-la, que é outra acção! Depois de se ter constuído o cercado, é necessário ter os animais para pôr lá dentro e obtê-los é outra acção. Mas para os poder cozinhar, é preciso ter uma lareira ou um forno e para os contruir sáo precisas mais 2 acções: uma para obter o barro e outra para construir efectivamente a lareira (ou o forno). Fazendo a contabilidade, são necessárias 5 acções, só para ter a possibilidade de cozinhar um animal! E fazer pão ainda é pior!

Esta granularidade das acções tem várias consequências positivas. Para já, obriga a que os jogadores passem o jogo a efectuar planos de curto/médio prazo, que lhes permitam ir obtendo os recursos necessários. Depois, as acções têm um valor altíssimo e qualquer uma que seja desperdiçada pode ter consequências muito graves. Se combinarmos isto com a existência simultânea de vários objectivos, às vezes nada conciliáveis entre si, é fácil perceber porque é que é normal ver homens adultos a chorar como meninas, quando jogam Agricola. Para além do mais, tudo isto é extremamente temático e bem integrado no jogo, o que torna toda a experiência muito intuitiva e ajuda muito a "digerir" a complexidade.

Depois temos as cartas, que providenciam a macro-estratégia. Quando pega nas 14 cartas, no início, um jogador experiente de Agricola toma imediatamente uma série de decisões que vão ter consequências ao longo de todo o jogo e vão definir as linhas gerais da estratégia. Depois é preciso encaixar as acções de que se vai dispondo nesse Grande Plano das Coisas... e isto, meus amigos, eu posso garantir que não é nada fácil! É que colocar cartas em jogo custa acções e as acções são muito escassas! Aquela acção que foi usada para pôr o Zé das Vacas só é útil se depois eu conseguir ter vacas, para rentabilizar o Zé. Senão, mais vale usá-la para outra coisa qualquer, como por exemplo ir buscar comida, para não ter de ir mendigar.

O Agricola também é um jogo bastante complexo. Há muitos recursos para gerir (comida, barro, madeira, pedra, colmo, milho e cenouras) e há muitas áreas que é preciso desenvolver. O sistema de pontuação obriga a que sejam "cumpridos os mínimos" em áreas muito distintas e a presença das cartas adiciona uma camada adicional que pode dar cabo da sanidade de um gajo! Mas o recurso mais difícil de gerir de todos são as acções! Não há ronda de Agricola em que eu não pense, com um ar sonhador e uma lágrima no canto do olho "ah, se eu tivesse só mais uma acçãozita, conseguia finalmente expandir a minha casa e dar à minha mulher o filho que ela sempre quis... e com outra, podia cozer o pão e escusávamos de estar aqui a mastigar milho cru".


A conclusão

Tudo isto se conjuga para fazer do Agricola um jogo excepcional! Há tensão a potes, há estratégia, há táctica, há variabilidade, há risos, há lágrimas, há depressões profundas, há mãos no ombro, solidárias e olhares desolados para o resultado final de 14 rondas de tormentos. Ouve-se muitas vezes, no final do jogo, "deixa lá que da próxima vez corre melhor".


Mas o que nunca falta é a vontade de tentar outra vez!


Para mim é um grande jogo, que merece inteiramente toda a histeria que se tem gerado à sua volta! E é um sério candidato ao mais aguardado prémio do ano, o conceituadíssimo Estupendo de Ouro Estupendo 2007!

11 julho 2008

Estupendos de Oiro Estupendos: A previsão!

Depois da entrega do conceituado e espampanante prémio do SpielPortugal e numa altura que se fala nos prémios Abreojogo que vão cair como um meteoro sobre a cabeça dos designers e jogadores, chegou a vez de começarmos a falar seriamente do Estupendo de Oiro Estupendo. O Estupendo de Oiro Estupendo é um prémio atribuído aqui neste blog e cujo critério depende apenas e exclusivamente da vontade e juízo do seu criador, o destemido e audaz Zorg. Do juízo, já se constou, não podemos esperar muito, mas agora da vontade, disso não se pode acusar o homem de a ter em falta.

Como se lhe fossem poucos os méritos a apontar, Zorg nunca ganhou o aclamado geek of the week, de maneira que nada o pode credenciar mais para deliberar sobre o vencedor. Mais importante do que tudo isto, a atribuição deste galardão tem ainda a carga emocional de fazer Portugal, neste momento, o País Mundial com mais prémios atribuídos por numero de jogadores, facto que não se pode deixar de assinalar e também saudar com urras e vivas estridentes.
Paralelamente a todas estas contingências que fazem as delícias dos internautas de todo o globo, assinala-se também que o prémio em questão nunca vai ser comunicado ao vencedor, ficando o mesmo na total ignorância quanto aos seus dotes, não se podendo exibir graciosamente aos seus pares nem tão pouco colocar um troféu catita no móvel da sala.
Mediante isto, aqui fica a minha previsão em relação aos nomeados. Estes pequenos apontamentos que vão ler a seguir são baseados em pouca experiência, mas são de boa vontade.

Conquest of Paradise:
A GMT está em grande na mesa do Zorg. Sem se dar conta disso, de repente tornou-se “in” jogar aos jogos desta editora que aposta bastante na forte implementação do tema na experiência de jogo. Este é talvez o seu grande trunfo e, se é verdade que nos deliciamos com o magnífico Twilight Struggle e o nos regozijamos com meu jogo de eleição de todos os tempos Commands and Colors, Conquest of Paradise não consegue chegar a esse nível. É um bom jogo de facto, o tema insere-se muito bem nas mecânicas e conseguimos encarar os problemas que vão aparecendo como se fossemos chefes duma tribo com grandes pilas e carradas de crias espalhadas pelas ilhas da Polinésia. As primeiras tentativas podem-se tornar, contudo, bastante frustrantes uma vez que o jogo presta-se a que cada jogador adopte uma estratégia virada para o seu canto e não se interesse minimamente com aquilo que vai acontecendo nos mares. Uma vez que se desperte para as vantagens das guerras entre clãs e de como estas conseguem atrasar a estrutura económica dum jogador que leva vantagem, Conquest of Paradise ganha uma dimensão bem maior do que aquela que aparenta à primeira vista. Depois tem pormenores interessantes, nomeadamente as batalhas cujo resultado não é catastrófico para o derrotado o que possibilita vinganças memoráveis e um interesse redobrado para os turnos seguintes. Tem sido acusado por possuir um componente de sorte muito vincada. Tratando-se um jogo de exploração dos mares, o que acontece é que os jogadores quando fazem as explorações vão de encontro a ilhas mais ricas e outros a ilhas mais pobres tornando desiguais os argumentos dos participantes. É verdade sim senhor, mas quando os navegadores destas tribos se lançavam às águas certamente não sabiam o que iriam encontrar, podia ser uma viagem em grande ou não. Exactamente o que acontece no jogo. Seja como for, uma coisa já conseguimos perceber, não há nada que uma boa guerra não consiga fazer para equilibrar as coisas.
Conquest Of Paradise tem poucas coisas hipóteses de ganhar o estupendo de oiro estupendo, mas tem um argumento muito forte, a aplicação do acrílico por cima do mapa. Todos sabemos da qualidade dos mapas da GMT (folhas normais de papel) de maneira que Zorg se viu obrigado a comprar uma placa de acrílico para proteger a área de jogo. Isto á primeira vista pouca importância tem, mas Zorg demonstra um orgulho muito grande no seu acrílico.

A minha pontuação: 3
Possibilidade de vitória: Pouca

Race for the Galaxy:
Aqui a história já é outra. Se é verdade que conheci muita gente viciada em muita coisa ao longo da minha vida, desde a drogas, álcool, mulheres, casinos, Benfica, Playstation, etc, pela primeira vi alguém a viciar-se num jogo de cartas aparentemente inofensivo. Esse jogo chama-se Race for the Galaxy e a verdade é que já vi com estes olhos que o fogo há-de comer o Zorg a suar por ter passado 24 horas sem fazer uma partidinha. Confessou-me há dias que já fez mais de 100 jogos e ainda vai descobrindo pormenores que lhe passaram despercebidos na primeira centena de partidas. Verdade ou mentira o que se conhece é que o fenómeno não é exclusivo aqui do Zorg. Muita gente padece do mesmo e todos são unânimes em considerar Race for the Galaxy um dos jogos mais geniais e viciantes que alguma vez foi inventado. Na senda de jogos tipo San Juan e Glory to Rome, Race for the Galaxy parece realmente ser um passo em frente nesta categoria. A mim, sou sincero, parecem-me todos iguais e repetitivos, mas se tiver de jogar a um deles prefiro o Race. Contudo sou frequentemente informado por quem percebe destas coisas que só lhe posso dar o devido valor quando fizer 20 jogos. Mas mais do que a beleza das cartas não há nada mais emocionante e enternecedor do que a alegria do Zorg a matar o vício. Além disso ganha sempre!

A minha pontuação: 2
Possibilidade de vitória: O grande favorito.

Brass:
Martin Wallace em grande. Como sempre este designer inglês brindou os seus fãs com um jogo brilhante. De tal forma que teve o mérito de fazer com que aqui a malta repetisse várias vezes seguidas a experiência de o jogar. Note-se que chegam por semana em média dois novos jogos da Alemanha a casa do Zorg, por isso é de enaltecer o feito deste diamante do mestre Martin.
Mas esta boa notícia acabou por se revelar fatal. Brass não aguentou às constantes repetições e foi mostrando as suas fraquezas, nomeadamente na parte final do jogo onde foi sugerido, com alguma razão, que os jogadores ficam sem rumo e começam a construir ligações entre as cidades apenas para fazer pontos e não para construir algo proveitoso ao seu score porque já não têm tempo.
A verdade é que nunca mais se jogou ao Brass e neste momento, passado o encantamento inicial a caixa está abandonada no móvel à espera de comprador. Eu como só fiz 2 jogos continuo seduzido, mas quem o já jogou várias vezes perdeu o interesse.
Mas a bem da verdade, e nestas coisas há que ser justo, jogar um jogo que nos faça pensar nele e nas formas de poder ganhar, as vantagens e desvantagens das estratégias utilizáveis é uma coisa grandiosa. Brass foi isso tudo durante 2 ou 3 meses. Estudou-se até ao ínfimo pormenor as jogadas e as possibilidades, colocaram-se as mesmas em prática e com toda esta obsessão o jogo esgotou-se. É pena, mas para mim, se tivesse algum voto na matéria, era o grande candidato.

A minha pontuação: 4
Possibilidade de vitória: Nenhuma

Container:
Outro! Tal como o Brass já foi alvo de grandes teorias e de grandes conversas. Cada cabeça sua sentença e ainda bem porque cada vez que se escreve ou se fala nele aprende-se sempre qualquer coisa. Um jogo económico por excelência, na sua vertente mais primitiva e simples, Container é um colosso do divertimento. É um jogo que me parece que se vai esgotar também, quando chegar a um ponto em que se já se percebeu como funciona as regras da oferta e da procura, mas contrariamente ao Brass, Container tem a vantagem de ter sido jogado poucas vezes e sempre com jogadores diferentes o que cria um empatia mais forte que o que aconteceu com o jogo de Wallace. Mas o sentimento dos jogadores é igual. Vão para a casa a pensar naquilo! Depois é um jogo bonito e atraente à vista, além de ser ideal para todo o tipo de jogadores. Sim, também é um pouco melhor que o Brass.

A minha pontuação: 4
Possibilidade de Vitória: Grande

In The Year of the Dragon:
Jogo abstracto de Stefan Feld, bem ao estilo Euro que tem cativado todos. Um melhoramento em relação ao anterior Notre Dame, mas a mesma experiência de jogo. Difícil como o caraças, In the Year Of the Dragon coloca o jogador constantemente a suar e em dificuldades com várias decisões difíceis e também em grande interacção com os colegas (uma novidade em relação a Notre Dame). Tem a grande vantagem de demorar uma hora e é sempre a abrir.
Não gosto muito de jogos abstractos em que o tema é posto ali à martelada. Aos poucos desenvolvi um gosto por jogos em que o tema envolva toda a experiência do jogador. Gosto também de ir a pensar no jogo para casa. O que fiz mal, o que deveria ter feito ou como posso melhorar a minha performance.
In the Year of The Dragon não tem nada disso. Mas o que sei é que é muito bom e teve um grande sucesso, havendo inclusivamente muitas cópias a serem compradas após a primeira partida.

A minha pontuação: 3
Possibilidade de Vitória: Alguma

Tribune:
Entramos aqui nas últimas aquisições e que beneficiam do factor novidade. Estão naquela fase em que se pensa nelas com carinho e ternura. Tribune teve também bastante sucesso entre o grupo. Joga-se numa hora e é um jogo bastante limpinho em relação a mecânicas que funcionam como um relógio suíço. Se olharmos para o trabalho do seu designer, Karl-Heinz Schimel o mesmo que Die macher, conseguimos perceber que o jogo foi muitas vezes testados e seria impossível fazer melhor. Tecnicamente é perfeito.
Apesar de bem disfarçado, com um tabuleiro magnífico, Tribune é um jogo abstracto que parece oferecer muito mas que, depois de exprimido, oferece realmente muito pouco. Exemplo disso é o sistema de acções ao estilo Caylus e Pillars. Na verdade existem muitas acções que podem ser escolhidas mas que mais não são do que a mesma, escolher cartas. Seja como for, Tribune tem consistência e demora mais ou menos uma hora para jogar o que joga a favor dele. Ninguém pensa muito naquilo e alguns leilões ajudam a aquecer as coisas. Mas não evitei uma certa frustração. Zorg gostou bastante e todos os outros companheiros também. Houve mesmo um que depois de jurar a pés juntos que não comprava mais jogo nenhum, mal jogou Tribune deu o dito por não dito e resolveu-se pela compra.
Para mim, dentro do seu estilo, fica muito atrás de Taj Mahal de Knizia. Nada de novo.

A minha pontuação: 2
Possibilidade de Vitória: Pouca

Wabash Connonball:
É o jogo xunga do ano. Produzido com componentes tão pobres tão pobres que até dão pena, a única coisa que levaria um lunático como Zorg a comprar tamanha mediocridade seria a qualidade do jogo em si, ou então a possibilidade de usar mais uma vez a sua querida placa de acrílico para proteger a folha de papel do mapa.
Inesperadamente, o jogo é um espanto e consegue sintetizar em apenas uma hora mecânicas já conhecidas de Imperial ou principalmente Indonésia. Ao mesmo tempo introduz um sistema económico mais ou menos complexo de compra de acções onde se alia a novidade do jogador fazer a jogada e gastá-la na companhia que bem entender. Ou seja, isso faz os jogadores colaborarem uns com os outros temporariamente para os lixarem depois. As acções são vendidas em leilão e há muita coisa interessante a acontecer.
Ora isso introduz muitas contas, previsões de custo benefício e acesa troca de ideias após as partidas. Mais do que isso é um jogo que demora uma hora a ser concluído.
É uma revelação por conseguir dar uma experiência de jogo intensa em tão pouco tempo.
Além disso é o jogo mais fácil de piratear de todo o Boardgamegeek e existem fortes possibilidades do resultado da pirataria ter melhores componentes que o original. A única dificuldade é arranjar as regras, que não estão disponíveis nos locais habituais.

A minha pontuação: 4
Possibilidade de Vitória: Grande

Agrícola:
Não me posso presenciar porque nunca tive a oportunidade de o jogar. Seja como for Zorg telefonou-me após o seu “agrisolo” a dizer que estava fascinado. Em primeiro lugar porque foi a primeira vez que jogou um jogo sozinho e depois porque o raio do jogo oferece milhões de possibilidades. E quando digo milhões são mesmo milhões. Nem consigo imaginar esse numero aplicado a um jogo de tabuleiro. Nem na vida tenho milhões de opções...

Possibilidade de vitória: Forte candidato

10 julho 2008

Estupendo de Ouro Estupendo 2007: regresso

Emprego novo, vida nova, mas sempre a mesma motivação inquebrantável!

Depois desta pausa forçada pela parte menos fundamental da minha vida, o trabalho, eis-me de regresso à luta e com a motivação necessária para concluir a titânica empresa que me propus levar a cabo: a atribuição do Estupendo de Ouro Estupendo 2007.

E será um regresso em força! Para que não restem dúvidas, calendarizamos já isto:
- Review do Agricola até domingo, dia 13/7.
- Review do In the year of the dragon até quarta, dia 23/7 .
- Review do Wabash Cannonball algures, aqui no meio.

Depois, o júri (eu), segue para uma semana de reclusão no Algarve, num resort de luxo, para poder tomar a decisão com tranquilidade e longe de todas as pressões.

A cerimónia oficial de entrega do(s) prémio(s), no dia 31/7, pelas 21h, ao vivo neste blog!

Se até o Faidutti já atribuiu o prémio dele, eu não posso ficar atrás, porra!

07 julho 2008

Para jogar na areia (não se esqueçam do protector)!

Depois dos DVD’s, dos livros, dos Cd’s e das enciclopédias é a altura dos jogos de tabuleiro. Não é nada de extraordinário, mas a ideia não é nada má e pode contribuir mais um bocadinho para o despertar da curiosidade do público.
A revista Visão e o Jornal Publico vão em conjunto distribuir jogos de tabuleiro todas as quintas-feiras aos seus habituais leitores. Desenganem-se os mais glutões que a coisa não é de graça. Antes pelo contrário. Cada joguinho terá o preço 8 euros além do preço normal da publicação.
Desenganem-se também aqueles que esperam ver o Carcassonne, o Ticket To Ride ou o Catan a serem oferecidos como brinde. Não, estes jogos são matemáticos e desenvolvem a destreza de raciocínio no que toca a este particular.
Vão ser, portanto, 10 jogos que fazem parte da história dos jogos de tabuleiro e que atravessam os séculos e os 5 continentes.
Aqui vai a lista inteirinha:

10 Julho: Peteia (Grécia)
17 Julho: Xian-Qi (China)
24 Julho: Ur (Suméria)
31 Julho: Senet (Egipto)
7 Agosto: Shaturanga (Índia)
14 Agosto: Shogi (Japão)
21 Agosto: Bao (África)
28 Agosto: Surakarta (indonésia)
4 Setembro: Awithlasknannai (América Pré Colombiana)
11 Setembro: Hex (Europa Moderna)

Numa rápida consulta feita ao insuspeito BGG, deverão os jogadores estarem atentos ao Shogi e também ao Hex, jogos que têm um ranking interessante para este tipo de desafio matemático, nem sempre do agrado de muita gente.
Eu gostava de dar um link relacionado com os jogos, mas não existe nada nos sites do Publico e Visão que faça referência à veracidade do post.
Mas podem confiar.
A sério!

01 julho 2008

Spiel des Jahres 2008

E o vencedor foi "Keltis" do Reiner Knizia.

A lista dos nomeados para o prémio "Spiel des Jahres 2008" era:

Stone Age - Michael Tummelhofer
Keltis - Reiner Knizia
Witch's Brew - Andreas Pelikan
Blox - Wolfgang Kramer
Marrakech - Dominique Ehrhard

... e para o prémio especial "Melhor Jogo Complexo":
Agricola - Uwe Rosenberg

A lista dos prémios atribuídos foi a seguinte:
Keltis - Prémio "Spiel des Jahres 2008"
Agricola - Prémio Especial "Melhor Jogo Complexo 2008"
Wer War's (Reiner Knizia) - Prémio "Melhor Jogo para Crianças 2008"

Reiner Knizia vence finalmente o "Spiel des Jahres" e faz o pleno este ano.

Enquanto os espanhóis não derem cartas no mundo dos jogos de tabuleiro, os alemães continuarão a fazê-lo. (O mesmo já não se passa no mundo do futebol). :-)

O prémio provavelmente está bem atribuído e é merecido. Apesar do Keltis não passar de um Lost Cities com esteróides. Tinha algumas expectativas quanto ao Stone Age e o Witch's Brew, mas como o Knizia há muito que tinha esta distinção pendente, também lhe fica bem.

Uma coisa é certa: quer os premiados quer os nomeados vão vender muito mais do que fariam em circunstâncias normais.

Sinceramente não me parece que vá a correr trocar o meu Lost Cities por este Keltis, até porque não estou convencido que seja propriamente um "upgrade."

Quanto ao Agricola, esse já é uma certeza. Não é? :-)

O que pensam desta atribuição de prémios? Deixa-vos desgostosos, indiferentes ou acham que assenta que nem uma luva?

21 maio 2008

Session Report: Conquest of Paradise

Crónicas da Polinésia

O cheiro a maresia misturava-se com o suor e entrava pelas narinas dos guerreiros que remavam em esforço nas canoas. À frente do comboio de embarcações estava Teixeira Kokilu, o guerreiro cuja família gravou a sangue a honra do seu bom nome. Preparava-se para um ataque à ilha de Hawaiki. Uma terra mística cujo domínio pertencia a Hugo Lulipulu, navegador de grandes atributos que devia a sua fama às ilhas que encontrava e colonizava com grande competência. Em Samoa era tido como um Deus, venerado pelas mulheres, respeitado pelos homens, Lulipulu tinha todas as riquezas que um homem podia ambicionar. Os corpos quentes de mulheres na sua esteira, conchas de todas as cores e peixe sempre fresco à sua mesa. Dizem os murmúrios que tinha um filho em cada ilha que descobriu. A veracidade de tal afirmação é duvidosa, mas deste homem de inteligência suprema se disse sempre muita coisa. Mas uma das histórias vem em todos os registos: sempre que içava as velas encontrava terra rica.
Os seus adversários temiam-no e invejavam-lhe a sagacidade para todos os assuntos marítimos.
A inveja foi, de resto, o motivo que desencadeou a acção de guerra de Teixeira Kolipu. Confidenciou-lhe o oráculo que a vitória pertenceria a quem tivesse maior pénis. Convencido como era, Kokilu construiu a sua marinha de guerra. Três canoas e três guerreiros. Pouca coisa, mas o suficiente para ameaçar. Quiseram os deuses punir a audácia de Teixeira. Um tsunami de proporções nunca vistas afundou os barcos e matou os tripulantes. Os homens de Hugo nunca chegaram a ouvir os rugidos de guerra dos atacantes, apenas vislumbraram os seus corpos inchados quando estes deram à costa de Hawaiki.
Mas Teixeira Koliku não era homem de desistir. Convocou todos os machos dos seus domínios e secretamente preparou uma ofensiva que iria ficar na história. Era de madrugada quando a sua máquina de guerra se fez ao mar. Ainda os colonos de Hugo dormiam, quando despertaram com a dor das lanças espetadas nos corações e gargantas. Era uma matança feita à traição. Diz-se mesmo que Teixeira tivera bebido o sangue das crianças num macabro ritual que lhe restabeleceu a juventude.
Mas o heroísmo de Hugo era conhecido na Polinésia e por algum motivo era respeitado e temido. Numa acção logística sem precedentes, percorreu cada ilha onde tinha influência e um por um foi chamando todos os homens com força para pegar numa lança. Velhos, crianças e doentes não eram poupados à obrigação militar.
Mesmo ouvindo ecoando pelas ondas do oceano o choro das mulheres e mães, Hugo Lulipulu não olhou uma única vez para trás. Mas, existem juramentos, que as lágrimas chegaram a lamber-lhe os olhos por ser responsável por acto tão vil.
Os deuses ficaram do seu lado e a ilha mítica de Hawaiki foi novamente recuperada com muito suor e heroísmo enchendo o mar de sangue e carne humana.
Agora, em todos os dias de lua cheia, um cheiro de putrefacção ergue-se do mar. Os cientistas não conseguem explicar o fenómeno, mas os pescadores, possuidores de toda a sabedoria ancestral, juram que é o cheiro da morte dos homens de Teixeira e Hugo que ali se ficaram.

14 maio 2008

Crítica: Container

- Fod**-**, Car****, estes contentores são para levar até ao terminal 4. E são para carregar ainda hoje. Quem é o encarregado desta mer**?
- Não olhe para mim, chefe! Eu apenas cumpro ordens. O Matias é que disse que os contentores da Alemanha são para o terminal 2. Agora não me fod**.
- A mim é que já me fod**** bem fodi**. Mas o gajo não viu nas guias para onde é que iam os contentores? Onde é que está o filho-da-**** do Matias?
- O Matias estava ali a beber uma cerveja com o Vladimryr.
- Esse cabrão só sabe é beber. Depois fo** esta mer** toda. Cara*** para isto tudo. Arranja-me aí um cigarro! Que Cara***!
(som dum peido)

Este podia ser muito bem ser um diálogo ouvido em qualquer porto de Portugal. Mas também, ao mesmo tempo, poderia ser escutado num qualquer jogo de Container caso as peças dum jogo de tabuleiro conseguissem falar. É verdade que o Zorg insiste em falar com elas nas noites de maior solidão mas, apesar dos seus esforços, até hoje ainda não existem relatos duma possível conversa. Esta contingência da vida, aliás, transformou Zorg numa alma amargurada e rancorosa que se costuma vingar na compra excessiva de jogos ou na prática doentia de Pro Evolution Soccer 6. Felizmente, no meio das suas compras, apareceu uma bela surpresa de nome Container que, curiosamente, não teve a recepção calorosa e espampanante que merecia tanto no seio dos grupos de jogadores de jogos de sociedade, como também na comunidade de trolhas e peões que fazem dos seus músculos o suado ganha-pão.


A arte dos componentes deste recente título da valley Games ficou a cargo do cada vez mais conhecido designer gráfico Mike Doyle. E se é verdade que muita gente não lhe aprecia o estilo, neste caso em particular esteve a um nível bastante alto. Container está artisticamente magnífico. O tema está bem expresso em todos os elementos do jogo, desde os tabuleiros até ao dinheiro, passando pela caixa e livro de regras. Pode-se dizer o que se quiser sobre componentes, mas não há nada como jogar num tabuleiro bonito que retrate duma forma condigna o tema que se quer incorporar na experiência de jogo.
Não posso, contudo, abandonar este assunto sem aqui deixar um comentário aos barcos. O material em que são construídos é bem estranho e existem mesmo murmúrios de alergias terríveis causadas aos mais fracos de epiderme. Contudo, ao pegar neles pela primeira vez senti um arrepio e até era capaz de jurar que são as únicas peças dum jogo de tabuleiro que, se caírem ao chão, se partem em mil bocados. Aquilo é o quê? Barro plastificado?


As regras do jogo são simples. Cada um dos jogadores tem como objectivo ser o mais feliz negociante de contentores de que a memória é capaz de recordar. Para isso terá de, no final da partida, ter mais dinheiro que os demais. A tarefa não é nada fácil e vai dar algumas dores de cabeça, isto porque Container tem um sistema económico muito próprio que funciona consoante as leis da oferta e da procura que se vão alterando ao longo das jogadas. Ter a consciência disso e adaptar-se aos desafios crescentes do mercado idealizado por Thomas Evert e Franz-Benno Delonge é a base do sucesso. No entanto essa adaptação faz-se duma melhor ou pior maneira consoante a sabedoria que o jogador vai tendo em relação ao que se passa nos meandros sujos e mal cheirosos dos ancoradouros.
O sistema é fácil de explicar e aprender. Cada jogador tem o seu porto e vai construir fábricas. Essas fábricas produzem mercadorias ou contentores de diferentes cores. Depois de produzidas, as mercadorias vão ser compradas pelos outros jogadores. Depois de compradas são guardadas nos armazéns dos compradores. Ficam à espera que um barco chegue e que as carregue. Depois disto são vendidas à melhor oferta na Ilha. E é só. Qualquer criança percebe o sistema. É bastante intuitivo e demora 5 minutos a ser explicado. Os problemas, esses, vêm depois.


Fazendo agora uma explicação mais detalhada para aqueles leitores que, sabe-se lá porquê, gostam de ler todas as frases deste blog:
Após a produção das mercadorias o jogador que as produz coloca-as no mercado a um preço. Os jogadores interessados pagam o valor pedido que reverte, como é lógico para o bolso do produtor. O comprador, por seu turno, coloca o produto nos seus armazéns e estipula um preço para as mesmas. Imaginando que o comprador é um tipo com alguma inteligência, vai com toda a certeza revender a um preço mais alto do que comprou. A partir daqui as mercadorias ficam prontas para serem carregadas para os barcos, desde que alguém pague o preço da revenda. Carregados os barcos, estes vão para a Ilha. A ideia é que quantos mais contentores o jogador tiver na Ilha, mais dinheiro ganha no fim. Os barcos chegam ao arquipélago e o seu conteúdo é vendido através dum leilão secreto. Vendida a mercadoria, acaba-se um ciclo. Ora estes ciclos repetem-se várias vezes a longo da partida.
Uma coisa interessante no meio disto tudo é a importância do valor da venda. Um jogador para ter sucesso comercial tem de vender as mercadorias a um preço mais competitivo que os parceiros. Isto porque quanto mais depressa vender o que tem no porto, mais depressa pode iniciar um novo ciclo e mais dinheiro pode ganhar. Dinheiro gera dinheiro meus amigos e quanto mais se tem mais se investe e mais se compra. Comprar é bom, vender é bom. O dinheiro passa de mão em mão e a economia cresce com as vendas. Todos os jogadores são intermediários e produtores ao mesmo tempo.
Perceber o sistema económico não é fácil. Vamos imaginar que eu compro dois contentores que o Zorg produziu por 4 dinheiros. O Zorg ganha assim 4. Eu pego nos dois contentores que comprei e ponho-os à venda para os barcos por 6. O Spirale, após uma longa reflexão, compra duas mercadorias a mim, por exemplo, por 4 e coloca-as à venda para os barcos por 5. Claro que o jogador seguinte, se quiser carregar o seu barco, vai preferir as mercadorias do Spirale porque estão mais baratas. Com esta compra, o Spirale fica com os armazéns vazios e pode comprar mais e eu vou ficar com os mesmos cheios porque não existe comprador. Na verdade o Spirale está a ganhar uma acção em relação a mim. No entanto, se outro jogador quiser comprar-me as duas mercadorias por 6 (porque pode ser essa a única hipótese válida no momento de jogar), ficaria a ganhar um dinheiro em relação ao Spirale. Tudo bem que 1 é uma quantia irrisória, mas se um jogador conseguir ganhar 1 aos demais em muitos ciclos, no final o peso pode ser determinante para o resultado final.
As considerações a tomar neste Container são muitas. E este é um elemento bastante refrescante. O sistema económico em que entramos é bastante subtil e matreiro. Depende também muito duma dinâmica de grupo, mas essencialmente torna-se bastante divertido e desafiante aprendê-lo. Por outro lado, os jogadores não podem comprar e vender todas as mercadorias que lhes apetecer. A tentação é grande, claro, mas precisam de ter infra-estruturas para o efeito. A produção depende das fábricas que compraram e a venda das mercadorias para os barcos depende muito de quantos armazéns construíram.
Vou dar um exemplo. Neste jogo as acções são escassas. Só existem duas acções. Desta forma para poupar acções qualquer jogador que se preze prefere comprar muitas mercadorias duma só vez, do que comprá-las em duas vezes. A razão é simples. É preferível comprar 4 contentores numa única acção do que os mesmos 4 em duas acção diferentes (2+2). Face a isto, o jogador que tiver 4 armazéns, pode colocar no mercado 4 mercadorias para venda. Com isto pode também aumentar o preço das mesmas, porque assim vai permitir ao comprador poupar uma acção. Isso pode ser uma vantagem competitiva em relação aos demais. Como podem perceber, é preciso levar em conta muita coisa para se ser bem sucedido na empreitada.


O valor dos contentores é muito subjectivo, o que torna o jogo ainda mais movediço. Na verdade é bastante difícil determinar o preço dum contentor. Isto porque eles vão ter um valor diferente para cada jogador desde o início do jogo. No princípio é distribuída aos jogadores, uma carta. Esta contém os valores das cores dos contentores que vão ser diferentes para cada negociante. No final do jogo, os valores das cores apresentados nas cartas vão ser multiplicados pelo número de contentores comprados por cada conviva na Ilha. Ou seja, no final da jogatana, o que se assiste é que uma mercadoria vermelha para mim pode valer 10, mas para o Zorg vale apenas 4. Para mim interessa-me ter várias vermelhas, mas para o Zorg não.
Mas a coisa não é tão fácil como parece, porque é precisamente aí que o jogo dá um volte face. Os jogadores vão perder, na Ilha, todos os contentores da cor que mais compraram. Claro que isso gera uma onda de desconforto que se evidencia nos leilões. É muito difícil avaliar o preço das coisas. Os jogadores esforçam-se por salvar as cores que lhes rendem mais e compram as menos valiosas para que estas sejam eliminadas. No exemplo acima, tanto eu como o Zorg queremos comprar mercadorias vermelhas, embora o façamos por diferentes razões. Muito Bom!


Não vale a pena escrever mais sobre este Container. É um grande jogo, muito interessante de aprender e que gera acesas discussões sobre a melhor forma de ganhar dinheiro. A comparação com Modern Art não é de todo estapafúrdia. Mas ao contrário do Modern Art, perceber a dinâmica económica de Container é mais difícil e o jogo não tem os mesmos problemas que o pequeno joguinho do Knizia possui. É preciso muito mais jogo de cintura para ganhar uma partida de Container do que Modern Art, onde por vezes parece que basta pôr no mercado apenas os quadros dos artistas mais badalados.
Como só joguei uma vez, não sei muito bem se depois de percebido o mercado e se ter o seu domínio, se o jogo continua a constituir o mesmo desafio. Julgo que não vai sofrer disso, até porque quem comprar esta pequena maravilha vai ter muitas horas de aprendizagem pela frente, o que compensa em muito a sua aquisição.
Container tem todos os elementos que aprecio num jogo. Leilões, interacção a rodos, Bluff, tema, bom material e a sensação que as peças se movimentam realmente no tabuleiro. Pedir mais é impossível. Além disso certamente é apreciado por toda a gente.
Se bem que o caral** do jogo tenha o infeliz defeito de ser caro como a mer**!

Classificação **** (é a classificação, não se trata de nenhuma asneira)